Capítulo 16

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A BRUXA

 — Eu odeio estar irritada. E eu estou extremamente irritada! — Jogou a faca afiada e ensanguentada na mesa à sua frente, fazendo com que respingos de sangue fresco sujassem a superfície empoeirada — Que estresse! — Bufou e se sentou no chão de madeira em um baque. Cruzou suas pernas, fechou suas mãos em punho e as colocou em cima de seus joelhos. Respirou pausadamente, tentando se acalmar e recuperar seu fôlego.

 O vento uivava através das frestas das madeiras do chalé e os mesmos entravam por eles e faziam com que os fios soltos dos cabelos acobreados dela se mexessem, escondendo sutilmente seu rosto que estava coberto por carvão, mais uma vez, da forma que ela gostava.

 — Que desgraça, eu não lembro de cabeça todos os ingredientes e passo a passo dessa merda — Praguejou. — E eu tentei por dias e dias e dias... E mais dias. E eu simplesmente não me recordo totalmente dessa droga. E estou de saco cheio dessa praga — Deitou-se, com os braços abertos. — Então, que assim seja! — Bateu com força o punho fechado ao chão — Se não funcionar, eu bolo outro plano e vejo no que dá — Bateu novamente a mão no chão em sinal de fúria — Maldição.

 Sentou-se novamente, passou as mãos pelas madeixas soltas e prendeu seus cabelos da melhor forma que conseguiu. Vários fios ainda ficaram soltos e um penteado despretensioso surgiu. Colocou-se em pé e passou as mãos em seu vestido ao redor de seu corpo, a fim de desamassa-los. 

 — Era só a peste fazer o que devia fazer, mas não... Não! Tinha que se estercar e fazer merda! Maldição, praga, merda! — Continuou praguejando enquanto ia em direção a mesa mais uma vez — Mas beleza, tudo certo. Eu vou dar um jeito. Como eu sempre dou. Espero que funcione.

 Respirou profundamente e pôs-se a trabalhar.


DENNA

 Estava sentada no gramado, encostada no imenso carvalho do quintal do bar de Rhea. O chão estava irregular devido às noites que Nabarium passava ali dormindo, mas ela não se importou. A sombra que a árvore projetada a protegia do sol escaldante que se dava naquele dia ensolarado. Não conseguia parar de sorrir. À sua frente, duas crianças corriam e brincavam alegremente com Nabarium. Ele dava piruetas e voava baixinho, as distraindo e tirando gargalhadas ininterruptas delas. Era uma cena que deixava qualquer um contente, principalmente Denna.

 Faziam alguns dias em que a garota fizera o acordo com Rhea e desde então ela tem observado e conversado com Nabarium sobre essa nova proposta. O dragão concordou alegremente em fazer parte disso e preenchia seu tempo diariamente com várias visitas. Algumas eram novas e sempre o deixava surpreso. Outras, se tornaram rotineiras e o deixava satisfeito. Nas manhãs, Denna e ele saiam perambular pela cidade e caçar refeições adequadas para o animal. E, enquanto ela trabalhava, ele permanecia ali no quintal, com as novas amizades, alegre e totalmente distraído. O coração de Denna ficara eventualmente aquecido ao perceber que ele não mais se sentia solitário e perdido. E ela conseguia, finalmente, compartilhar desse sentimento com ele. As noites para ele ficaram ainda mais tranquilas depois de gastar quase toda suas energias com o pessoal que por ali passava.

 O mais contente em todo esse acordo era, sem sombras de dúvidas, Rhea. As pessoas pararam de fofocar e o importunar e, quando haviam conversas referente ao dragão, eram apenas coisas boas. Seus lucros foram incríveis e ele começou a compartilhá-los com Denna. No começo, ela quis hesitar mas, depois, concordou.

 A única infelicidade e impaciência momentânea de Denna era referente à chave a qual ela pedira para ele. Desde que eles conversaram e ele concondara em emprestar o objeto à ela, Rhea dissera que estava procurando sem parar, mas, sem êxito. "Forasteira, faz tanto tempo que não entro nessa desgraça que não faço a mínima ideia de onde deixei a chave. Mas eu fiz um acordo contigo, então, entregarei ela a ti. Eu prometo. Eu só preciso encontrar ela. Me de mais alguns dias que logo, logo, eu vou encontrar ela e te entregar. Tenha paciência", alegou o senhor. "Eu tô tentando", dizia Denna à ele. "Mas foi você quem disse que me entregaria no dia seguinte do nosso acordo." Ele revirava os olhos todas as vezes e sempre dizia a mesma coisa para ela: "Tenha paciência, forasteira, paciência."

Perdida, Nunca EncontradaOnde histórias criam vida. Descubra agora