Cacau

1.2K 127 201
                                    

Nunca seria possível medir o amor, ou descrevê-lo de maneira certeira.

Da mesma maneira que só somos capazes de distinguir cores e luzes pelos olhos, apenas nossa alma sente o amor.

Mas tal qual um bálsamo para um corpo ferido, bandagens para nossas cicatrizes, o amor é sentido com cura.

Não se explica o amor, é impossível, um sentimento indizível. Mas seus efeitos… se nota.

Agora, Kelvin dormia no peito de Ramiro, um sono que há muito tempo não tinha.

Nunca tinha sentido tanta falta de um feriado, um tempo longo onde podia só estar com Ramiro e esquecer tudo ao redor.

Tomou um banho e sequer se vestiu, apenas deitou em sua cama e agarrou seu homem, o beijou devagar e rapidamente pegou no sono.

Como se tudo que havia de errado no mundo, de um segundo a outro tivesse voltado a ser certo.

Como o fim de uma guerra onde apenas os corações eram soldados. Até as noites de redenção são noites de batalha.

O sono para Kelvin sempre foi relativo, ele estava acostumado a desperdiçá-lo.

Festas até tarde da noite, noites sem dormir assistindo a uma série, talvez apenas acordado, não muito consciente, mas acordado mesmo assim.

Durante muito tempo, Kelvin teve medo de dormir, pois era muito vulnerável, muito frágil, não era possível se defender enquanto dormia.

Sua realidade foi péssima por muito tempo, mas a terra dos sonhos também não era tão maravilhosa assim.
Pesadelos, constantemente. Por um tempo, ele decidiu que o melhor era manter-se acordado.

Muitos energéticos, muito café, remédios daquela vez. Pessoas acordadas são pessoas seguras.
Até que não era mais.

Então, Kelvin foi libertado, parcialmente.

Seu predador sempre foi ele mesmo, de qualquer forma...

Agora o sono vinha com frequência, não era repousante ou calmo, mas vinha. Os pesadelos foram substituídos por sonhos malucos, e depois por nada. Ele ainda os tem às vezes, os sonhos tênues de coisas que já foram verdadeiras.

Mas o destino não controla nossas mentes e seus feitos, apenas nossas vidas e tudo ao nosso redor, não dentro de nós.

Talvez Kelvin não sentisse o que sentiu naquela noite se tudo o que aconteceu ao longo do dia fosse diferente, mas talvez Berê não fosse capaz de abraçá-lo tão forte quanto ele precisava quando ele ficasse assim novamente.

Foi a última vez, no entanto. Um adeus, o fim de anos de sofrimento, o fim da dor.

Ninguém sabe como o tempo passa nos sonhos, mas nos pesadelos ele certamente é longo.

Para Ramiro, que estava acordado, apenas a observar e sentir a paz entrar em seu ser enquanto Kelvin dormia em seus braços, não foi nem um minuto, talvez trinta segundos, no máximo.

Para Kelvin, preso em uma realidade impossível de fugir, um pequeno pedaço da eternidade.

Nossas mentes às vezes são armadilhas, labirintos. É tão fácil se perder. É tão fácil confundir verdade com mentira. Passado com presente.

Apenas alguns sons de batidas, uma dor fantasma em seu rosto, escuridão em todos os lugares que ele olhava. Vidros quebrados soando cada vez mais longe, um vento frio quase gelado subindo por sua espinha.

De repente, Kelvin poderia estar lá novamente, se ele se esforçasse para ver, ele veria tudo outra vez. Se ele tentasse andar sobre o gelo, como fez na maior parte de sua vida, ele cairía.

FATEOnde histórias criam vida. Descubra agora