Os Jones

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"Quantos dias existi sem me deleitar na imensidade do teu ser, presumindo estar vivendo."


Naquela manhã, Roman despertou ao som da chuva batendo incessante contra a janela. Seu humor azedou instantaneamente. Havia algo na visão do céu cinzento e nas gotas escorrendo pelo vidro que sempre o deixava irritadiço. Era como se o peso das nuvens se refletisse dentro dele, alterando seu comportamento de forma palpável.

Seus dias oscilavam conforme o clima. Quando o sol brilhava, era possível arrancar-lhe um sorriso, por mais raro que fosse. Mas em dias de chuva, sua paciência evaporava, e ele se tornava insuportavelmente irritado. Todos na pensão já haviam se acostumado a esse padrão, reconhecendo as nuances de seu humor como o reflexo direto do tempo lá fora.

Ainda sonolento, ele desceu as escadas com passos pesados, tentando ignorar a melancolia que se instalava em seu peito. O cheiro úmido de terra molhada que entrava pelas frestas das portas só reforçava sua aversão àquele tipo de manhã.

- O que foi, uma pulga te mordeu? - ri Astrid.

- Sem piadinhas logo cedo madame. - resmunga ele sem paciência.

- Essa cara é por conta daquela carta?

- Carta? - ele franze as sobrancelhas, em seguida arregala os olhos, e ao lembrar coloca as mãos no bolso do casaco.
- Aqui está! - exclama.
Ele sobe correndo as escadas e no seu quarto rompe o lacre do selo, está curioso sobre o seu conteúdo.

"Olá Forasteiro, gostaria que me acompanhasse num jantar, amanhã às 20h, em minha residência, não se atrase. Aguardo pela sua presença.
Sr. Jones"

Ele pensa, em qual seria motivo, para que  Sr. Jones tenha lhe feito tal convite, quais eram suas reais intenções?
Não desejava esse encontro mas, precisava ir e descobrir do que se tratava, e o que pretendia fazer sobre isso, mesmo que já desconfiasse. Por acreditar que suas investidas estão sendo percebidas por mais pessoas do que ele gostaria, decide passar o dia na hospedaria até a hora do jantar com Sr. Jones.

- Ué, o que deu em você para passar o dia trancafiado aqui? - Astrid estranha ao ver Roman sentado de frente para janela segurando um livro e bebendo café.
- Está fugindo de alguém? Ou alguma coisa? Já sei, arrumou confusão ontem a noite no pub, não é? - ela especula vários motivos.
Mas Roman a ignora. Mantém o foco em seu livro.

- Você de mau humor não a quem aguente, quando penso que estou começando a gostar de você... Deixa pra lá!

As horas passam e ele permanece ali. Na mesma posição, totalmente submerso em seus devaneios.Astrid mal vê ele piscar. Está tão compenetrado que nem percebe o tempo passar.
Ela então tenta chamar sua atenção.

- Escuta forasteiro, você hoje nos dará a honra de sua presença no almoço?
Ele mostra um certo interesse.

- Pode ser. - responde sem tirar seus os olhos do livro.
Astrid arregala os olhos, está chocada.
Apesar do convite feito, ela tinha certeza de que ele recusaria, e momentaneamente se sente feliz soltando um sorrisinho.

(***)

A mesa está posta e o almoço servido.
Roman chega à mesa e olha ao redor, ele é o único hóspede entre as mulheres que trabalham na hospedaria. Se sente um pouco desconfortável.

- E os outros hóspedes? - ele pergunta .

- Não servimos refeições para os hóspedes, eles têm dinheiro, comem por aí nos restaurantes da cidade.

- E o que eu estou fazendo aqui?

- Almoçando conosco!

- Mas eu sou um hóspede! - Roman retruca Astrid que começa perder a paciência com ele.

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