Capítulo 14

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Na manhã seguinte, o sol invadia o meu quarto pelas cortinas entreabertas. Ainda sentia a raiva e a tristeza do dia anterior pesando sobre meus ombros, mas precisava seguir em frente.

Desci as escadas indo em direção a cozinha,encontrei somente Sônia arrumando algumas bandeijas.

— Sônia,cadê o papai e a mamãe?

— Eles decidiram tomar café na varanda,senhorita Melissa.

— Obrigada.— Eu falei indo em direção a varanda.Chegando lá,encontrei meu pai como sempre com os olhos no jornal e minha mãe mexendo no celular.

— Bom dia,querida.Dormiu bem?

— Sim,como um anjo.— Eu menti.

Sentei à mesa, o silêncio era confortável até meu pai levantar os olhos do jornal e me olhar fixamente.

— Melissa, sua mãe e eu pensamos que seria uma boa ideia você sair com o filho do Paul Carson, o Jonathan. Ele é um bom garoto, de uma família respeitável.

Eu revirei os olhos. Já havíamos discutido isso antes e eu não estava interessada.

— Pai, eu realmente não quero isso. Estou focada nos estudos agora, e sinceramente, não estou no clima para encontros.

Ele bufou, claramente irritado com a minha resposta.

— Melissa, eu já conversei com o Paul. Eles estão esperando. Você vai a esse encontro e pronto.

Minha mãe, sempre a mediadora, tentou suavizar a situação.

— Querida, só dê uma chance. Pode ser bom para você conhecer novas pessoas.

— Novas pessoas? — eu rebati, cruzando os braços. — Eu não preciso que arranjem encontros para mim. Não sou uma criança.

Meu pai bateu o jornal na mesa, fazendo um ruído alto que me fez pular.

— Basta, Melissa! Você vai encontrar Jonathan. Já está tudo arranjado. Não me faça passar vergonha.O encontro de vocês é hoje a noite no Palace,às 19 horas.

— Fala sério,e você me diz isso agora?!

— Olha os modos,mocinha!

Suspirei profundamente, sentindo a pressão em meus ombros aumentar. Era sempre assim, eles decidiam e eu tinha que seguir o plano. Sem muitas opções, assenti relutantemente.

— Tudo bem, eu vou. Mas não esperem que eu goste disso.

Levantei-me da mesa, o apetite totalmente perdido, e fui para meu quarto. Fechei a porta e me sentei na cama, olhando para o nada. A ideia de passar um tempo com alguém que eu não conhecia e não queria conhecer era frustrante, ainda mais com tudo que estava acontecendo.

Peguei meu celular para mandar mensagem para a Laila.

"Você não vai acreditar no que meus pais estão me obrigando a fazer..."

"O que foi agora?"

" Eles arranjaram um encontro pra mim com o filho de um amigo do meu pai. Jonathan Carson ."

"Ah não! Eu já ouvi falar dele,as vezes ele vai ao clube de tênis que os meus pais frequentam. Ele é meio... arrogante. Boa sorte,mana."

"Obrigada, vou precisar"

Desliguei o celular e deitei na cama, olhando para o teto. Mais uma coisa para adicionar à lista de problemas. E pensar que, por um momento, achei que poderia ter um pouco de paz.

                           ♤♤♤

Estudei um pouco, li alguns capítulos de um livro, mas nada realmente prendia minha atenção. Quando deu a hora de me arrumar, escolhi um vestido casual, nada muito chamativo. Queria parecer apresentável sem parecer que estava me esforçando demais,afinal eu estava praticamente sendo obrigada a ir.

Chegando na porta de casa,o motorista já me aguardava.Meu pai preparou tudo mesmo.Não sei pra que o desespero,se ele acha mesmo que eu vou namorar ou me casar com esse cara,está muito enganado.

Ao chegar no Palace,eu disse o meu nome e a moça me acompanhou até uma mesa perto da janela.Eu sempre ia com os meus pais no Palace,era um lugar bem sofisticado.O restaurante era elegante, com uma vista linda para o parque. A decoração era refinada, com detalhes em madeira escura e iluminação suave.Sentei-me na mesa aguardando o tal Jonathan.

Após alguns minutos, notei um homem alto e bem vestido se aproximando. Ele tinha cabelos castanhos claros, levemente ondulados, e olhos azuis que pareciam frios.Usava um terno caro que parecia ter sido feito sob medida.

— Melissa? — ele perguntou com um sorriso ensaiado, estendendo a mão.

Levantei-me e apertei sua mão, disfarçando meu desinteresse com um sorriso educado.— Sim, Jonathan, certo? Prazer em conhecê-lo.

Nos acomodamos. Ele pediu um vinho para começarmos e a conversa inicial foi superficial, como esperado. Ele falou sobre a faculdade de economia que queria cursar e sobre o estágio que estava fazendo no escritório de advocacia do pai.

Observava seus gestos calculados e o tom meticuloso de sua voz. A formalidade de tudo isso me cansava. Me senti aliviada quando a comida chegou,dando uma pausa na nossa conversa.

— Então, Melissa, quais são os seus planos para o futuro?

Respirei fundo,tentando manter a compostura. — Eu pretendo cursar Direito em Yale — respondeu, com orgulho na voz.

— Yale? Direito? — ele balançou a cabeça, ainda rindo. — Eu imaginaria você fazendo algo mais... feminino. Direito não é exatamente um curso para mulheres, sabe?

— E o que exatamente seria um curso para mulheres, Jonathan? —  perguntei com a voz cortante. — Direito é para quem tem competência e paixão pela justiça. E eu tenho tudo isso. Se você não consegue ver além dos seus preconceitos, talvez devesse reconsiderar o que pensa sobre mulheres.

— Eu só quis dizer que...

— Não, você quis dizer exatamente o que disse.

Jonathan, aparentemente recuperado do choque inicial, inclinou-se sobre a mesa, a expressão no rosto se tornando mais fria e cruel.— Sabe, Melissa — ele começou, a voz gotejando veneno. — Mulheres como você, com toda essa atitude, não vão longe. Você pode ser bonita e ter a língua afiada, mas no fundo,sabemos que você tem todo esse privilégio por ter a sorte de ter pais ricos.O que pra pessoas como você,isso é algo bem fora da realidade.

— Pessoas como eu?— Eu entendi o que o babaca estava querendo dizer,mas queria que ele dissesse em voz alta.

— Você entendeu o que eu disse.— O babaca disse,enquanto tomava uma taça de vinho.

Eu não sou obrigada a aguentar isso,um jantar com um ser machista e racista.

Sem pensar duas vezes,joguei meu vinho no rosto dele. Ele recuou, surpreso e furioso, o suco escorrendo por sua cara.

— Talvez seja você quem precise aprender sobre a vida real, Jonathan — ela disse, a voz tremendo de raiva. — E lembre-se, arrogância é assumir que pode falar assim com qualquer pessoa e sair impune.

Me levantei bruscamente, peguei minha bolsa e sai do restaurante sem olhar para trás. Lá fora, o ar fresco da noite me ajudou a me acalmar um pouco. Ergui a mão e logo um táxi parou. Enquanto o motorista me levava para casa,fiquei olhando para a janela e tentando processar a fúria.

Sempre soube que o racismo existia, mas cresci em um ambiente onde tinha o privilégio de me sentir protegida. Meus pais eram influentes, nossa casa era enorme, e eu frequentava as melhores escolas. Essas coisas muitas vezes me faziam esquecer que, para algumas pessoas, minha cor de pele ainda era um problema.

"Mesmo com todo esse privilégio, eles ainda me veem assim," pensei, sentindo uma lágrima escorrer pelo rosto. Percebi que, por mais rica que fosse, nunca estaria completamente livre do preconceito.Naquela noite, fiz uma promessa a mim mesma. Usaria cada cada olhar desdenhoso, como combustível para alcançar meus objetivos. Não deixaria ninguém definir meu valor.

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