🌑 Prólogo 2 🌑

41 7 51
                                    

Tingido por um azul safira, quase ultravioleta, o céu engolia todo o local, sendo iluminado apenas pelo brilho de uma atípica lua e de algumas estrelas.

Destacada de uma imensidão de terra, quase privada de vida, uma vasta e volumosa floresta preenchia o terreno, escondendo toda e qualquer criatura que por lá rondava, sendo delimitada apenas pela colossal barreira metálica, que se estendia por uma grande área circular.

Barreira esta que abrigava as mais variadas pessoas, todas elas de um dos mais altos postos da sociedade, todas privilegiadas de não terem mais nenhum contato com as criaturas vis que ainda assolam à Terra.

Ou, ao menos, é isso o que a maioria dessa população pensa.

Dois pares de olhos grandes encaram a estranha cena à sua frente, um sentimento de apreensão e medo circulando por suas expressões ao ver aquela insanidade se desenrolar.

Após as gigantescas maquinarias da barreira da cidadela cessarem seus movimentos, um vento frio passa por eles, balançando os arbustos, as folhas das árvores e seus longos "cabelos" encaracolados. O aperto de suas mãos se fortalece, um contato inseparável desde o nascimento, os mantendo calmos e estáticos perante as figuras em sua frente.

Em meio a bela paisagem de altos prédios repletos de luzes, as figuras misteriosas se destacavam. A primeira se resumia em desgosto, onde nem seu trajado formal poderia salvá-la de seu estado combalido. Enquanto que a segunda exalava o completo contrário da outra, um físico e uma aparência monumental, talhada com cuidado cada detalhe, sendo engrandecida por seus vorazes cabelos de vermelho fogo.

Passos se distanciam e a gargalhada da segunda silhueta chama a atenção dos pequenos. A realidade finalmente cai sobre eles, uma realização interna trocada apenas entre olhares, quando uma terceira figura, que havia saído do interior da gigante construção, irreconhecível e camuflada na penumbra da noite, se junta às duas.

Outra corrente de ar passa por todos e um estalar seco e agudo, como um galho se partindo, seguido por um som crepitante, semelhante a vidro sendo quebrado em milhares de pedaços, faz os dois fecharem os olhos com força.

Um odor metálico se prolifera pelo ambiente. Eles não queriam ver aquilo.

Por pouco tempo, uma respiração ofegante e distante preenchia o silêncio atormentador ao lado de duas risadas sádicas. Um burburinho incompreensível se inicia e se finaliza em questão de segundos, até que passos se distanciassem novamente.

Com as pernas dormentes, as pequenas figuras fogem dali sem direção, como se tivessem testemunhado um crime. Por vários minutos andaram pela floresta escura, traçando um caminho desconhecido apenas para se afastar dos três desconhecidos.

Contudo, o que não contavam era se deparar com outra figura igualmente, ou mais, peculiar naquela noite.

Eles saem de mais um arbusto e param no lugar no mesmo instante em que avistam uma silhueta dentro da floresta, torcendo para que não tivessem feito tanto barulho na sua rápida caminhada.

A quarta figura daquele pesadelo inacabável era a mais bizarra de todas, não parecia à primeira vista um problema real, mas certamente sentiam o pior dela.

Enquanto o medo dos dois empesteava o ar daquele canto da floresta, a criatura caçava incessantemente nas árvores, nos arbustos e até nos buracos no chão por algo. Um grunhido visceral ressoa da criatura e ela soca impaciente o chão, tão forte que cria uma pequena cratera na terra.

Um deles se assusta com o barulho e ganha a atenção indesejada de um par de olhos pretos. Eles engolem em seco.

A criatura fica ereta, iniciando a sua caminhada até eles a passos inaudíveis, com a cabeça levemente torta.

O aperto das suas mãos se fortalece mais, tudo para manter ambos estáticos. Seus corações batiam como tambores em seus ouvidos e gotículas de suor se formavam em sua pele opaca.

Todo esse medo e ansiedade pareciam apenas alimentar a coisa em sua frente, que possuía agora íris tão dilatadas que quase cobriam todo o olho.

A criatura para a centímetros da causadora do som, sem piscar e sem respirar, apenas tentando ver o que não poderia ser visto a olhos comuns.

O toque de um telefone interrompe a cena.

E, em um piscar de olhos, a coisa se torna alguém, atendendo a ligação.

- Oi! Aconteceu alguma coisa? - Uma suave e calma, incompatível com o que presenciaram, voz ressoa da silhueta.

O silêncio retoma seu lugar e uma expressão humana recobria o rosto do ser, preocupação. - Ele tá bem?... T-tá! Daqui a pouco eu chego aí!

A ligação acaba e a figura suspira. Sem nem olhar uma última vez para eles, como se não tivesse notado a presença deles, ela sai dali.

Ainda plantados em pé no chão, por medo da criatura voltar, o silêncio preenche seus sentidos.

Os dois ficam apoiados um no outro, cansados demais para falar qualquer coisa, a não ser encarar a enorme cidade no horizonte, repleta de cores. Reconheciam agora que sua pequena busca seria muito mais difícil do que aparentava.

Porém, ainda que em meio a caos da sua situação pessoal, eles não deixam de se perguntar.

O que está acontecendo nesse lugar?

Entre NósOnde histórias criam vida. Descubra agora