Capítulo 01

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O acampamento illyriano era como um inferno na terra para fêmeas. Não lhes era permitido o mínimo além do que o Grão-Senhor forçava os machos a lhes dar de muito mau grado. Rhysand costumava ter o pulso firme, e o General Cassian mais ainda, no entanto eles não ficavam nos acampamentos o tempo todo, então muitos dos acontecimentos cruéis eram bem escondidos debaixo dos panos. O próprio Devlon, o capitão que treinava as tropas, não se importava muito com o que acontecia com as fêmeas. Houve diversas situações onde ele vira mulheres serem abusadas por um de seus homens e simplesmente virou a cara.

Celestia vagava muito por aqueles acampamentos, já havia lidado com diversos machos querendo levá-la para a cama mesmo sem ela ter lhes dado pelo menos a oportunidade de ver seu rosto, mas ela sempre os ignorou e seguiu seu caminho, e isso lhe rendeu um número extraordinariamente alto de ameaças. Machos como eles não gostam de rejeição, muito menos de uma fêmea como Celestia que tinha bons 1,85 de altura, desbancando muitos machos que mal chegavam aos 1,70. Então quando Celestia chegou no acampamento com calças, uma capa de urso com um capuz cobrindo sua cabeça, luvas grossas e asas enormes encolhidas em suas costas, os machos se sentiram imediatamente desafiados. Muitos deles esticaram suas asas, esbanjando suas envergaduras enquanto encaravam Celestia, que fez questão de revirar os olhos e ignorar. Ela havia optado, então, por entrar dentro de um bar nojento, e se sentar numa mesa mais nojenta ainda. Celestia levantou a mão, sinalizando para o dono do bar que lhe trouxesse um copo de vinho, e foi o que ele fez. Deixou o copo de vinho na frente de Celestia de forma desengonçada, respingando o líquido por todo lugar antes de sair.

— Olá. — Celestia balançou o copo de vinho antes de olhar para cima e ver uma bela mulher loira a encarando com um sorriso. — Posso te servir mais alguma coisa?

— Mais vinho. — Respondeu sem rodeios. Celestia havia virado aquele copo de vinho goela abaixo como um bêbado, o deixando vazio segundos depois.

A mulher loira sorriu ainda mais largamente e se debruçou sobre a mesa para encher o copo de Celestia com mais álcool. Celestia não queria olhar, não queria mesmo, mas os seios daquela senhorita estavam praticamente pulando para fora do corset apertado e ela estava, quase que literalmente, os enfiando bem em sua cara.

— Caso precise de mais alguma coisa, basta me chamar. Sou Cordélia, ficarei mais do que feliz em prestar serviços ao senhor. — Cordélia lhe ofereceu um bater de cílios e se retirou, indo para outra mesa.

— Eu não sou… — Celestia cortou a frase no meio quando percebeu que a mulher havia sumido de sua vista — um homem.

Celestia parecia, de fato, um rapaz para aqueles que viam de fora. Ela se vestia bastante como um, gostava da liberdade de se mover e as roupas masculinas lhe ofereciam isso. Era difícil lutar ou caçar com um vestido e ela preferia evitá-los. A única coisa que a deixava um pouco mais feminina eram os longos cabelos brancos que iam até a cintura, mas estes a incomodavam em diversas ocasiões e ela cogitou cortá-lo incontáveis vezes. Ela varreu os olhos vermelho-sangue pelo salão, procurando alguma fonte de informações, seu olhar constantemente evitando algumas garçonetes que estavam no canto do bar e davam risinhos enquanto a encarava.

Ela suspirou. Celestia não conhecia ninguém, não tinha contatos, não tinha sequer um amigo. Então, se ela não tinha oportunidades, ela precisava criá-las. Se levantou da mesa, deixando o copo de vinho pela metade para trás, avistou Cordélia em um balcão conversando com outra moça e decidiu que tentaria tirar alguma coisa daquela mulher. Ela havia flertado consigo, Celestia pensava, se ela forçasse um pouquinho a barra, conseguiria algo útil. Celestia se aproximou, o capuz ainda na cabeça, a única coisa visível debaixo daquele pano eram os olhos escarlates hipnotizantes que pareciam brilhar na escuridão.

FÚRIA ESCARLATE - acotarOnde histórias criam vida. Descubra agora