O chamado

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Coisas mal resolvidas são como fantasmas que sempre voltam para nos assombrar.

Hideki Anagusko


Adrien não fazia ideia de como havia chegado em casa. A raiva cega o fizera exigir toda a potência do motor de sua moto. Trafegou como um louco pelas ruas de Paris e por certo havia infringido uma série de leis de trânsito. Dentro de si borbulhava uma mescla de mágoa, angústia e ódio. Sim, ele odiava o que havia acontecido, odiava estar naquela encruzilhada, sendo obrigado a fazer escolhas que não queria e que não achava necessário fazer, simplesmente porque acreditava existir apenas um caminho a tomar. Tremia por dentro e por fora.
Quando finalmente bateu a porta do seu quarto, sentiu todo o peso daquele dia sobre seus ombros. Recusava-se a sucumbir ao desespero, mas seu coração parecia dilacerado. Uma dor cortante, como se realmente alguém houvesse lhe desferido um golpe fatal. Dirigiu-se ao banheiro privado a passos largos e se despiu. Enquanto a água quente caía sobre seu corpo, sua mente voltou a repassar toda aquela noite fatídica e desastrosa. Em sua mente ouviu novamente cada palavra dita. As lembranças pareciam fazer com que a ferida em seu interior se abrisse ainda mais. Sua respiração tornou-se difícil, havia um bolo na garganta e um ardor em seus olhos. Balançou a cabeça como que para dispersar aqueles pensamentos, mas a última imagem que lhe veio à tona cruelmente naquele instante foi a do rosto de Marinette quando finalmente a deixou. Pálida, os lindos olhos azuis haviam adquirido uma coloração cinzenta, opaca, o rosto belo e de traços delicados tornara-se uma máscara de dor e mágoa. Ele tinha feito aquilo.
As lágrimas escaparam dos olhos de Adrien sem que ele pudesse conter, ao mesmo tempo que um grito de angústia rompeu de sua garganta e o punho se levantou para socar a parede rachando dois azulejos. Sofria por Marinette, por sua mãe, pelo o que seu pai havia se tornado e por si mesmo, por estar perdendo a melhor coisa que havia lhe acontecido na vida nos últimos anos, sem que pudesse impedir.

A água continuava a escorrer lavando o rastro de suas lágrimas, e o sangue nos nós de seus dedos, mas ele mal notou, assim como a dor na mão que era ínfima se comparada com a dor que lhe rompia a alma.
Ficou ali não sabia dizer por quanto tempo, concentrado na tarefa de voltar a respirar e sufocar aquela dor constante. Quando por fim saiu do banheiro, havia conseguido o mínimo de controle. Nesse instante Gabriel abriu a porta do quarto sem bater.

- Não é o melhor momento agora – disparou Adrien sem se dar ao trabalho de olhar para o pai. Se o tivesse feito teria notado a cara de espanto que Gabriel fazia.

- O que houve Adrien?

- Eu já disse que agora não é um bom momento. Por favor saia

Gabriel ignorou a dispensa do filho e adentrou o quarto.

- Eu acabei de sentir uma miríade de sentimentos tão negativamente fortes que se não fosse eu ter-lhe prometido não liberar um akuma, teria liberado esse que, com certeza, teria sido o vilão mais poderoso que já criei.

Adrien o fitou com espanto. Os olhos arregalados e a face pálida como um cadáver diante da possibilidade de se tornar um super akuma por causa da intensidade de sua dor. Assim que Gabriel viu a face do filho compreendeu. Engoliu seco e murmurou

- Eu ouvi a maneira tempestuosa que você chegou em casa e agora te encontro nesse estado. Está mais do que claro para mim que todo esse sentimento vem de você. O que houve Adrien?

Diante da intensidade do olhar do pai, Adrien recuou, deu-lhe às costas e mais uma vez tentou reprimir seus sentimentos

- Não é da sua conta – Respondeu, a raiva querendo saltar a superfície novamente enquanto terminava de se vestir

Amor a provaOnde histórias criam vida. Descubra agora