Capítulo bônus

358 42 0
                                    

Beatriz Torreto
São Francisco.
(Meses atrás)

A campainha toca no fundo da música alta que eu escuto, meu primeiro pensamento é ignorar e fingir que não ouvi, quando não escuto nada depois de alguns minutos decido não ir até lá.

Continuo a mexer o molho e mover os pés de um lado para o outro enquanto danço. Meus olhos se reviram quando a campainha toca novamante.

- Jacob! - Gritei, ouvi seu grito de volta - Vá atender a porta!

Ele passou do meu lado enquanto reclamava, ao passar pela caixa de som abaixou o volume, algo que ele estava me pedindo a algumas horas.

- Mandona - murmurou.

- Chato - respondi.

Ele destrancou a porta e eu continuei concentrada na minha comida.

- Quem é você? - A voz do meu irmão soou confusa, não consegui ouvir a voz do visitante. - Triz! - Ele gritou e eu revirei os olhos.

Desliguei o fogo e soltei a colher, tirei o elástico que prendia o meu cabelo e fui até ele.

- O que foi... - minha voz foi morrendo aos poucos, enquanto os cachos loiros e olhos azuis entravam em minha visão.

- Conhece ele? - A voz de Jacob parecia um eco dentro da minha cabeça.

Engoli a saliva, na esperança de ter alívio em minha garganta que de repente ficou seca. Pisquei, várias e várias vezes, temendo ser apenas uma visão, mas não era e ele estava mesmo ali.

- Brian - sussurrei. O nome soando familiar em meus lábios, de repente, notei que os olhos azuis estavam inchados e vermelhos, deixando claro que ele tinha chorado.

- Triz...

Foi tudo o que ele disse antes de suas pernas fraquejarem e seu corpo se apoiar no meu. O seu peso me fez dar alguns passos para trás, mas eu consegui me controlar enquanto ele me abraçava.

Olhei para o meu irmão e balancei a cabeça, pedindo para que ele me deixasse sozinha com ele, Jacob concordou e saiu.

Sem mais suportar o peso, deixei que meu corpo fosse para o chão junto com o dele. Brian se agarrava a mim como se fosse uma necessidade, enquanto seu corpo balançava pelos soluços e uma pequena humidade começava em meus ombros.

- O que aconteceu? - Perguntei, já me sentindo desperada. Envolvi seu corpo com os meus braços e acariciei os fios loiros com os dedos, tentando o acalmar.

- Ela está morta...

Ele soluçou, um frio se alastrou pelo meu corpo, como se minha mente estivesse me preparando para as próximas palavras dele.

- Ela está morta por minha causa...

Mas nada poderia me preparar para ouvir o que ele diria a seguir. Nada impediria que o chão sumisse dos meus pés.

- Quem está morta, Brian? - Perguntei, mesmo com medo da resposta.

Ele levantou a cabeça, os olhos azuis, agora mais parecidos com o oceano como nunca, estavam envolvidos pelo vermelho e a vergonha.

- A Lety. A Lety está morta.

Meu cérebro demorou para entender suas palavras, ou melhor, para aceitar que eram reais. A respiração sumiu de meus pulmões e eu senti as lágrimas de acumularem atrás dos meus olhos.

- O que...? - A voz quase não saiu de meus lábios.

- Sinto muito.

Meus olhos se perderam em algum lugar, podia sentir cada pedacinho do meu cérebro raciocinando o que acontecia.

- Do que você está falando? - Perguntei novamente, na esperança de ouvir uma resposta diferente.

- Ela queria que o Dom voltasse e me procurou, consegui que ela fizesse um trabalho disfarçado e em troca a ficha do Dom seria limpa, mas algo deu errado e um dos caras...sinto muito, me desculpe...

Pisquei. Atônita e confisa, porque ele estava se desculpando?

- Não foi sua culpa, Brian. - Segurei seu rosto com as minhas mãos e o fiz olhar meu olhos. - Você não tem culpa, entendeu?

De repente, eu me esqueci do passado, esqueci tudo o que aconteceu e me senti desesperada para que ele não carregasse essa culpa para si. Uma dor tão grande pode destruir alguém.

Ele engoliu em seco, os lindos olhos brilhando pelas lágrimas. Brian não disse nada, apenas concordou com a cabeça.

- Vem, venha comigo - segurei sua mão.

Deixei ele deitado no sofá e fiquei ao lado até que ele dormisse, enquanto ele segurava a minha mão meus pensamentos voaram para Dominic.

Meu irmão em algum lugar do mundo não sabe que a Lety, sua primeira namorada e primeiro amor está morta.

Me levantei, seguindo até o banheiro, mas parei quando Jacob apareceu na minha frente. 

- Triz...

Por um momento eu me esqueci dele, esqueci que ele estava ali e provavelmente ouviu tudo.

- Eu preciso ficar sozinha - sussurrei. Ele entendeu, deu um passo para o lado e me deixou passar.

Quando fechei a porta do banheiro, tranquei a porta e encostei a testa na madeira gelada.

Peguei meu telefone e disquei o número.

- Alô? Triz o que aconteceu?

A preocupação de Dom era clara, ele me fez prometer que só ligaria para esse número se alguma emergência acontecer.

- É a Lety... - Falei baixinho, com medo das minhas próprias palavras - ela morreu, Dom.

Falar em voz alta fez com que se tornasse real, como se tivesse um soco meus olhos se encheram de água. A ligação ficou muda por longos e longos segundos até que foi encerrada.

E uma onda de fúria misturada com a dor me atingiram, não pensei quando lancei meu telefone contra o chão, vendo o aparelho quebrar diante dos meus olhos.

- Merda! - Xinguei, alto e cheio de dor. Minhas pernas perderam as forças e aos poucos eu fui escorregando até o chão, abracei minhas pernas e chorei em silêncio.

De luto pela minha amiga. A garota que cresceu ao meu lado, a culpa por não ter entrado em contato mais vezes desde Los Angeles.

De luto pela minha antiga vida. Que aos poucos, a cada dia, mais e mais, se torna apenas uma lembrança de algo muito distante.


Running For Love ~Brian O'connerOnde histórias criam vida. Descubra agora