Capítulo 3

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Daniel e Gabriel treinaram durante o restante da semana no quartel do Regimento Santana, em Alagoas. Treinaram seus corpos e mentes nas mais variadas atividades. O Regimento Santana foi criado para combater guerrilheiros, então muito de seus exercícios baseavam-se em ações de contrainsurgência. O Minimanual do Guerrilheiro Urbano era lido diariamente pelos soldados e suas orientações eram seguidas e estudas, com o intuito de criar estratégias para combatê-las.

Gabriel chegou a questionar qual era a finalidade de estudar algo do tipo, já que o regimento há muito não entrava em combate.

— Digo, não é como se fossemos enfrentar as Farc amanhã, sabe?

— É a guerra do futuro, meu caro. — disse Daniel.

— O quê? As guerrilhas?

— Exatamente!

A dupla encontrava-se na academia da instalação. Alguns treinavam com intensidade nos sacos de pancada, outros gritavam enquanto levantavam pesos, e havia aqueles que se concentravam no fortalecimento das pernas ao som de músicas em seus fones. Entre todos, a dupla parecia a mais comum. Gabriel observou Daniel, que estava deitado levantando uma barra de peso com uma certa facilidade. Ficou surpreso quando ele terminou e se levantou. O rapaz usava sempre camisas de manga longa, mas mesmo assim era impossível esconder seus músculos bem definidos. Por um instante, Gabriel se perguntou se o amigo estava desidratado, até que Daniel pegou sua garrafa de água e a esvaziou. Deixa para lá, pensou.

Sabe — disse Daniel — desde o final da Segunda Guerra Mundial ocorreram mais de oitenta conflitos de natureza assimétrica; tipo, movimentos de resistência, terrorismo e principalmente guerrilhas. E tudo indica que essa será a forma dominante de conflito pelos próximos anos. As forças regulares já não são mais capazes de combater esses movimentos irregulares, visto que eles não seguem nenhuma lei num campo de batalha, não como os militares mais ortodoxos gostariam que fossem. Então, tornou-se mais importante do que nunca que nossas forças armadas desenvolvam homens capazes de lidar com esse tipo de problema. O meu avô previu isso, ele criou esse regimento com essa função.

Gabriel ficou surpreso com o que Daniel disse, não pelo conteúdo, mas pela capacidade de seu amigo de memorizar tudo o que era transmitido na sala.

— Cara, você é realmente um computadorzinho, hein!

— Não é minha responsabilidade se você não consegue permanecer acordado durante as aulas.

— Ei!

Daniel soltou uma risada, e Gabriel pensou o quanto era raro o seu colega rir daquela forma. O rapaz olhou para o relógio, que marca quinze para as nove. Era domingo, dia de folga para os soldados, e Daniel levantou-se e falou:

— É hora de irmos.

Ao que Gabriel respondeu erguendo as mãos.

— Aleluia! Finalmente acabou por essa semana!

— Vamos logo, palhaço.

A dupla tomou banho na instalação mesmo, antes de se despedirem, Gabriel chegou a oferecer uma carona, já que sempre vinha com seu bom e velho companheiro Maverick V8, algo que Daniel solenemente recusou.

— Gostaria de aproveitar mais a liberdade de não ter um pé machucado — disse.

— Ah, está bom, então, até amanhã, amigo!

— Até!

Daniel caminhou até a residência de sua família, que não ficava muito longe do quartel. Vovô, agradeço ao senhor por não ter se juntado ao Comando Militar do Nordeste, pensou. No caminho, passou por um mercado e comprou um amendoim torrado, que foi mastigando durante todo o trajeto. Comprou também um sorvete pensando na sua irmã, ela ama esse tipo de coisa.

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