2. Quer Conversar Sobre Isso?

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Eu contenho a respiração enquanto saio de repente, deixando os portões da escola baterem atrás de mim.

Me dar conta de que não me atraio por garotas não aconteceu da noite para o dia. E não sou ingênuo o suficiente para achar que é uma escolha. Há preconceituosos suficientes no mundo para pensar isso por mim.

Perceber quem eu sou aconteceu de forma gradual, ao longo do tempo.

Nunca senti aquela faísca, aquela corrente elétrica, por nenhuma garota. E, por mais que eu saiba que não sou gay, não posso deixar de pensar que talvez haja algo de errado comigo.

É como se faltasse uma peça no quebra-cabeça que todos ao meu redor parecem estar montando. Eles falam sobre garotas, sobre namorar, sobre sentir aquela atração viceral... E eu fico ali, fingindo entender, esperando que, de alguma forma, isso tudo faça sentido para mim também.

Mas a verdade é que, até agora, não fez. E é difícil não se sentir deslocado, como se houvesse uma falha em mim que eu não consigo consertar. Ao mesmo tempo, a ideia de ficar com um garoto me deixa enjoado. Não é apenas desconforto — é uma rejeição completa e instintiva. Isso só me confunde mais.

Se eu não sinto nada por garotas, mas também não sinto nada por garotos, onde isso me deixa? É uma pergunta que fica ecoando na minha cabeça, sem resposta. Será que é algo que vai mudar com o tempo? Ou será que eu sou simplesmente... diferente? E se for, como lido com isso?

Essa ausência de atração não é uma escolha. Não é algo que eu possa simplesmente "superar" ou forçar a acontecer. Mas, enquanto isso, fico preso nesse limbo, questionando o que significa ser eu, quando parece que todas as normas ao meu redor não se aplicam a mim.

Embora: que se dane tudo.

O que os outros pensam ou esperam não pode definir minha identidade.

Que se dane o Sr. Rodrigues e sua equação para o sucesso. Ele realmente acha que encontrar uma garota vai resolver todos os meus problemas? Que isso, de alguma forma, vai estabelecer meu valor?

E que se dane o ENEM por me fazer sentir que preciso me provar. Para meus professores. Para o Sr. Rodrigues. Para um comitê de admissão — banco — cuja única preocupação é o dinheiro que embolsarão pelo triplo do valor que me foi emprestado. Eu não preciso endividar a mim ou à mamãe pelo resto das nossas vidas porque alguém em algum lugar disse que a educação é a chave para uma boa vida.

Não consigo acreditar que, por um breve momento, eu realmente considerei dizer ao Sr. Rodrigues que eu gosto de fotografia.

Começou em Curitiba quando mamãe me deu minha primeira câmera fotográfica. Eu costumava adorar tirar fotos aleatórias de coisas como o ninho de vespa ao lado do parquinho ou o rosto do meu pai toda vez que ele gritava com a TV. Claro, isso foi antes de ele a tirar de mim por o distrair do jogo de futebol.

Mas eu nunca superei o fato de que, quando você tira uma foto, você pode ser qualquer pessoa.

Um realista.

Um cínico.

Um visionário com uma história para contar.

Ninguém julga a pessoa atrás da câmera; eles analisam a imagem pelo que ela é. Arte. E há algo libertador nisso.

Mas eu sei o que o Sr. Rodrigues diria. Que eu teria que entrar no clube de fotografia para ser levado a sério. Que fotos granuladas no meu celular não aumentariam minhas chances de entrar em uma boa faculdade — ou melhorariam meu "comportamento". Pelo menos não preciso lidar com ele pelas próximas duas semanas agora que é férias do meio do ano.

SK8ER BOI  |  Augusto AkioOnde histórias criam vida. Descubra agora