Manhã de 23 de outubro

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Carol

Quando acordo, ela está ali.

E não digo ali de pé na minha porta checando pela fresta se eu estava acordada para perguntar onde fica o banheiro, e nem ali encostada na penteadeira dando chutinhos discretos pra me perguntar a que horas eu costumo sair da cama. Ela está literalmente ali.

Os olhos arregalados encarando as minhas pálpebras subindo devagarinho, castanho absurdo por todos os lados por meio segundo.

Eu dou um grito.

— Aí, porra! — e caio do outro lado, de costas no chão, embolada nos lençóis.

As molas fazem barulho enquanto ela engatinha sobre o colchão para pôr a cabeça para fora e olhar para mim.

— Tudo bem, Carol?

Eu continuo estática.

Minha vontade verdadeira é chutar sua cabeça daqui mesmo, perguntar que caralhos ela está fazendo na minha cama, que caralhos está fazendo na minha casa afinal. Mas nesse meio tempo que tenho encarando seu rosto sereno (como se isso realmente fosse natural) eu repenso sobre algumas coisas.

— Você… — eu tento ser minimamente sensata nas minhas próximas palavras, mas não faço ideia do que alguém diria em uma situação como essa — Eu vou…

Eu me levanto. Eu estou com as mesmas roupas de ontem e o cabelo caindo na cara, já o seu cabelo agora está seco, ele é mais curto e mais escuro do que parecia ontem. Tem duas pintinhas no alto da sua sobrancelha que eu não tinha notado antes.

Ela ainda está de joelhos sobre a minha cama, no meu colchão caríssimos e travesseiros de penas de ganso artificial que encontrei na liquidação quando compramos essa casa. Ela está de joelhos em quase cinco mil reais e sorrindo como quem não faz ideia.

— Você pode… pode descer um minuto? — digo com cuidado.

Ela obedece.

Logo seus pés descalços alcançam o carpete e ela está de pé a uma cama de distância de mim. As super mangas da camisa que lhe emprestei ontem a noite estão cobrindo dos ombros as pontas das suas unhas. Já a calça de moletom ficou justa demais, como uma legging.

— Pode me dar licença? — peço. Meu reflexo assustou o reflexo dos meus olhos no espelho e eu percebi meu estado deplorável — Preciso me trocar.

Ela me encara como se não entendesse. Diz:

— Você está ótima!

E eu dou uma risada involuntária. Inacreditável.

— Claro. Então me deixe ficar melhor?

— Ah — um sorriso — Tá.

É difícil de acreditar, quase tão difícil quanto no fato de que eu dormi por tanto tempo e tão tranquilamente com uma completa estranha ocupando o quarto ao lado. Uma estranha que olhou para os cobertores e cheirou-os automaticamente, comentando:

— Tem o seu cheiro.

Deu boa noite e se virou para dormir.

Uma completa estranha que se ajoelhou ao lado da minha cama enquanto eu dormia, feito uma criança esperando pelo natal.
Uma completa estranha, em todos os sentidos da palavra.

Enquanto observo meu reflexo no espelho, é difícil não pensar sobre o que Talia acharia disso de verdade. Apesar do que perguntei a Adriana, ela não era do tipo que curte resolver os problemas dos outros, para ser sincera, ela não era do tipo que curte resolver problema nenhum.

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⏰ Última atualização: Aug 15 ⏰

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