7 - Isso é o que eu lembro.

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Os dias com Rafa, as noites com dores, os rostos borrados e muitas outras lembranças não saem da minha cabeça, elas se misturam e me deixam confusa. Sinto um emaranhado de nós em minha mente. Será que essas coisas fazem algum sentido, será que elas têm alguma ligação? Será que as respostas são tão obvias que eu não consigo perceber?
Começo a separar minhas lembranças e anotar num caderno. Preciso de lembrar do máximo de coisas possíveis.

*Isso é o que eu lembro*

Uma semana antes de tudo acontecer eu me lembro de ter recebido uma ligação do Rafa, essa ligação ficou em apenas um assunto, o acampamento no final de semana. A semana se baseou em prepararmos as coisas para o acampamento, não me lembro de nenhum acontecimento marcante ao passar aqueles dias. Então chegou a tão esperada sexta feira, já havia mentido pros meus pais sobre minha ida à casa de uma suposta "amiga". A partir do momento que sai de casa não consigo me lembrar de mais nada, minha cabeça insiste em bloquear tudo o que aconteceu depois.
Minha mãe insiste em esconder a verdade, como ela quer que eu acredite em um acidente tão patético como aquele? Ultimamente ela me olha como se uma granada fosse explodir a qualquer momento, a diferença é que se esta granada explodir, ela estará protegida contra as lesões, já eu não.

O clima aqui em casa não é o mesmo, não converso mais com meus pais e isso não foi escolha minha, acho que eles têm medo de falar alguma coisa que não deveriam, eles tem medo de usar alguma palavra que desbloqueie minhas lembranças. Minha mãe insistiu que eu fosse ao médico. O médico me pediu para não tomar mais os remédios contra as dores de cabeça. Eu particularmente aprovei a ideia, mas minha mãe achou um absurdo. Não gosto dessa mania que minha mãe tem de querer controlar tudo o que eu faço não gosto dessa mania que ela tem de dizer o que é certo ou não para mim.
Estou preocupada, não vejo Rafa há algumas semanas, ele não me procurou mais, estou confinada de todas as formas possíveis, e isso esta me matando aos poucos.
Eu penso que se eu pudesse mudar algo na minha história, mudaria esse último ano, faria escolhas diferentes, pois não importa o que de fato aconteceu, sei que eu tive culpa.

Acho engraçado esse negócio de destino, e se eu tivesse feito alguma coisa de uma forma diferente ou então escolhesse acordar uma hora mais tarde em um dia qualquer, será que meu futuro seria o mesmo? Será que eu ficaria nesse impasse de querer lembrar, mas ao mesmo tempo, ter medo do que possa ter acontecido.
Faz dois dias que não tomo mais meu remédio para dores, hoje em particular esta sendo um dos piores dias, as dores estão me matando. Acordei cedo, mas decidi ficar deitada na cama pensando, qual ponto não esta batendo? Ainda não tenho essa resposta, mas isso é por pouco tempo. Quando levanto me deparo com uma casa vazia, meus pais já foram trabalhar. Tenho a sensação de que o dia de hoje não irá terminar bem.
As tardes sozinhas em casa são longas, geralmente eu pego um livro para ler, na esperança do tempo passar mais rápido. Mas hoje as palavras que leio nos livros não me satisfazem mais, estou cansada de ler sobre princesas que se dão bem no final. Decido dar uma olhada nas revistas de moda e nos jornais de notícias, que estão guardados na estante da sala. Antes de começar a folhar as revistas me vem uma imagem na cabeça, uma imagem muito real, que me deixa em pânico. Não quero acreditar no que acabei de lembrar. Isso não pode ser real. Começo a tremer, derrubando a pilha de jornais e revistas que eu havia separado, quando me abaixo para juntar meus olhos batem numa folha de jornal com a data de "14/02/2014" e o que eu vejo nessa folha de jornal confirmam minhas lembranças...

Pego o telefone da sala e disco o numero da casa do Rafa.
-Alô - Ouço a voz de Kat.
-Cadê o Rafa - As palavras saem engasgadas da minha boca.
- Ele saiu com meu pai Lia, não sei se voltará cedo, quer deixar algum recado? - Ela responde assustada.
- Kat, não minta para mim, eu já sei de tudo... - Não consigo completar a frase que quero dizer, começo a sentir lagrimas queimarem o meu rosto.

Depois de alguns segundos ouço Kat confirmando o que eu já sabia.
- Eu sinto muito Lia - Percebo choro na voz de Kat - Eu sinto muito.
Deixo escapar um "Eu também" e percebo que o telefone está desligado há alguns minutos. E a verdade é que eu sinto mesmo.


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