CAPÍTULO 4

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CAPÍTULO 4
" A meia noite é quando tudo começa. "

SAVANNAH.

O vento sussurrava suavemente quando fui me deitar, como uma melodia que me embalava no silêncio da noite. Mas na manhã seguinte, o frio cortante tomou conta, trazendo consigo uma estranha sensação de inquietude. A chaleira, cheia de chocolate quente e temperado com especiarias, tilintava suavemente enquanto o líquido se aquecia. A lareira estava quase apagada, então eu a abasteci com lenha fresca, o calor começando a se espalhar pela sala. Estiquei meus dedos, sentindo-os formigar enquanto os flexionava diante do fogo, tentando recuperar a sensação que o frio havia roubado.

____ De apenas cinco segundos dos seus dedos no fogo a mais e então você vai perder os seus dedos.____ A voz de Gael cortou o ar, empurrando-me para o lado enquanto ele tomava o lugar diante das chamas.

____ Você não tem sua própria casa? Garotas para transar, café para tomar, sua mãe para ver?

Gael apenas revirou os olhos, um brilho travesso refletido pelo fogo.

____ Minha casa não tem lareira, meu pau não tá duro, não gosto de café tem gosto de terra, e minha mãe não quer me ver porque está ocupada ou porque ela não quer. ____Ele se acomodou, claramente não pretendendo sair tão cedo.

Olhei ao redor da minha nova casa, uma pequena fortaleza de conforto e solidão. As paredes de pedra por fora conferiam uma robustez que me agradava, enquanto o interior, rebocado e pintado em tons de branco e roxo pastel, trazia uma leveza que equilibrava. As luzes amareladas criavam um ambiente acolhedor, refletindo nos móveis bem escolhidos e na enorme estante de livros que adornava uma das paredes da sala. Meu quarto era simples, mas aconchegante, e o escritório já estava pronto para receber meus pensamentos e transformá-los em palavras para o livro que deveria começar a escrever esta noite.

____ Como está sua mãe? _____perguntei, afastando os pensamentos que teimam em me arrastar para um passado recente.

____ A minha mãe está bem. Mas o que quero saber é como está você.

Suas palavras trazem um sorriso em meus lábios.

____ Eu estou bem.

Eu realmente estava bem aqui. Me sentia segura.

Gael notou isso também por que me puxou para mais perto.

____Você não me contou como foi tudo na Pensilvânia ____ disse ele, mudando o tom para algo mais sério. ____ Temo que não contou nada sincero até agora.

Pensei nas coisas que não deveriam ser ditas, nas partes da minha história que Gael jamais deveria conhecer. E ainda assim, comecei a falar, como se as palavras tivessem vontade própria.

____ Tom Baroni arruinou nossa vida. É tudo o que precisa saber.

Gael ficou em silêncio, e o espaço entre nós foi preenchido apenas pelo estalar das chamas. Olhei para o fogo, hipnotizada pelo seu movimento. As brasas dançavam diante dos meus olhos, formando imagens que pareciam ganhar vida própria. Uma garota e um garoto emergiram das chamas, a garota com cachos parecidos com os meus, o garoto com uma coroa na cabeça. Eles dançavam, se movendo com uma graça que só o fogo poderia criar.

E então, a dança mudou. A garota foi empurrada contra a parede pelo garoto com a coroa, que se inclinou sobre ela com uma adaga em mãos. Ele colocou o cabo da lâmina em sua garganta e segurava com a parte afiada onde caiam sangue de suas mãos que sumiram como uma brisa fresca pelo fogo, enquanto ela, em resposta, sacou uma adaga própria, apontando-a para um lugar que certamente o faria recuar. Eu sabia o que estava vendo, mas não queria acreditar. Era Sky e eu, transformados em figuras flamejantes, presas em um jogo de poder e dor.

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