Caminhos - 1 temporada.

Solidão

Jade já estava acordada a alguns minutos, apenas observando as costas nuas da garota deitada à sua frente. Sua nuca, seus pelos loiros e cada pinta que havia ali. Carla dormia profundamente. Olhou as horas, já eram quase 11. Silêncio absoluto na casa, e pelas frestas da persiana a meia luz do dia entrava.
Seu fluxo de pensamentos sobre se levantar ou não foi interrompido pelo olhar sonolento de Carla, que acabara de despertar e se virava, ficando de frente para ela.
- Bom dia. - Disse dando lhe um sorriso de presente.
- Bom dia, dormiu bem?
- Muitíssimo. - Disse fechando os olhos após um leve suspiro - e você?
- também.
- Que horas são?
- Quase onze.
Se olhavam agora em silêncio, e Jade sentiu seu rosto corar de vergonha pelo que tinha acontecido, por estar agora de frente a ela depois da noite anterior, se sentindo nua de um jeito totalmente vulnerável mais uma vez.
- Eu amei a nossa noite. - Carla disse se aconchegando para mais perto dela, e envolvendo sua cintura com uma das mãos. As testas agora estavam coladas, assim como as pontas do nariz, bem próximas, e Carla então a beijou. Jade retribuiu, aninhando seu corpo ao dela, e sentindo de imediato um certo calor surgir. O beijo começava a se intensificar quando sons de gargalhadas e uma porta se abrindo foram ouvidos. Ambas se olharam e riram.

- Acho que não estamos mais sozinhas - Disse Carla.

~.~

Ao abrirem a porta do quarto, se depararam com a sala lotada. Ana e Gabi no sofá, ambas deitadas uma em cada ponta, Mau sentado abaixo delas, no chão com uma almofada no colo, Luc ao seu lado, terminando de comer um misto. A tv ligada, e sobre a mesa uma coca cola já pela metade e alguns descartáveis e embalagens. O olhar de todos foi imediatamente para elas, ali na porta. Carla sorriu dando um bom dia, enquanto passava com sua saia branca super curta. Jade estava corada. Todos retribuíram abismados o bom dia de Carla. Jade caminhou com ela até a porta. Os amigos se olhavam, alguns sem entender, outros se segurando pra não rir. Se despediram com um beijo no rosto. Ao fechar a porta atrás de si, a plateia aguardava ansiosa uma explicação de Jade.

- Que isso? Alguém me conta o que acabou de acontecer aqui? - Disse Mau entre risos - É isso que eu tô pensando?

- Isso o que? Alguém me explica? - Disse Gabi

Jade sentou-se na cadeira da mesa, servindo um copo de coca para si.

- O que foi gente? a menina ficou trancada do lado de fora de casa e dormiu aqui, só isso. - Disse erguendo a sobrancelha, antes de levar o copo até a boca.

- Só isso dona Jade? - Disse Ana, soltando uma risada. - Não tá com cara de "só isso".
Disse fazendo aspas no ar.

- Sim, só isso.

- Amiga, tu tá pegando mulher? - Perguntou Gabi, incrédula, se ajeitando no sofá. Jade engasgou com a coca.

- Obvio que ela tá, olha a cara dessa safada de felicidade. A noite foi boa né? - Disse Mau, rindo.

- Gente, vocês estão me deixando com vergonha.

- Ai amiga, a Carla é maravilhosa, meu sonho. - Disse Lari.

- Tu também pega mulher Lari? - Questionou Gabi.

- Não, mas se ela me quisesse eu queria, com todo respeito amiga. - Jade riu.

- Relaxa Lari, eu e a Carla, a gente não tem nada, como eu disse, ela só dormiu aqui. - Jade soltou com um tom e sorriso malicioso nos lábios.

- E a outra lá? - Quis saber Luc

- Tem outra?

- Tem Gabriela - ele respondeu - agora ela tem várias. - Riu.

- Gente, eu tô desatualizada de tudo. Por onde estou andando que não sabia nem que minha amiga tava ficando com menina?

- No tinder né, saindo com esses boyzinhos. Cada dia um, fica sem tempo pros amigos. - Luc alfinetou.

- Inclusive domingo vou sair com um cara e quero vocês lá.
Luc revirou os olhos.
- Mas e ai amiga, foi bom? como foi? como é? conta pra gente. - Lari quis saber.

Jade suspirou.

- Ai gente, foi... foi ótimo, foi maravilhoso, foi incríveeeeeeeeeeel, eu nunca tinha experimentado algo tão bom assim.

Luc se levantou batendo palmas.

- Eu sabia, S A B I A! sempre soube que você era sapatão amiga. Sempre soube.

- Ai, você e Carla fazem um lindo casal amiga, duas gatas da porra! - Disse Ana.

A conversa seguiu, entre risadas e depois um almoço, onde Jade acabou abrindo pra eles que de fato ela e Carla ficaram e também sobre Laura, o beijo das duas, tudo o que rolou na festa. Depois de muito fofocarem, passaram a tarde todos no apartamento das meninas, estavam mortos e não tinham forças para sair, afinal ainda era sábado.

Jade passou o dia todo esperando uma mensagem de Laura. Por mais que estivesse puta, imaginou que ela apareceria, mas não. Nada chegou, e nenhum Stories no Instagram.
"Deve estar com a ex" - pensou.

~.~

Laura por sua vez, acabava de acordar, depois de já ter despertado e dormido novamente várias vezes. Estava sem forças. Olhou no relógio em seu pulso, e já eram quase 19 da noite. Não havia comido nada. Finalmente se levantou, tomou um banho e colocou uma lasanha no micro-ondas, mas só o cheiro já a deixou enjoada. Sempre ficava um caco após abusar das drogas que usava, uma vez que havia pouco tempo que estava tomando seus remédios, e eles ainda faziam um pouco de efeito em seu corpo.
A mistura dos dois a destruía lentamente, e ela sabia. Não conseguiu dar duas garfadas no prato a sua frente. Colocou uma série aleatória e ficou no quarto escuro, sem ver a luz do dia, e chorou.
Chorou muito.

As palavras de Carol explodiam ainda em sua mente, junto com tudo que já havia passado nos últimos meses. Se sentia fraca, se sentia um lixo, a pior pessoa. Se sentia inútil por tentar e não conseguir mudar. Sempre se sentia assim após fazer o que fazia, após buscar nas drogas a fuga para todos os sentimentos de tristeza e ansiedade que insistiam m atormenta-la. Não conseguiu falar com Jade, sentia-se péssima por tudo na noite anterior. Não sabia por onde começar.

"Se eu tivesse escutado a Lia" - pensava e destruía-se ainda mais com essa ideia. Mas já era tarde demais. Carol tinha razão. Laura não era uma boa pessoa quando estava nesse estado, e estar nesse estado era um processo difícil de controlar. Odiava se sentir assim, mas era fraca. Naquela noite, tomou uma decisão. Iria desistir de Jade, dessa obsessão maluca que havia crescido nela desde que a viu pela primeira vez, na festa do casarão. Não queria machucar Jade como machucou Carol e sobretudo, não queria se machucar mais ainda.