3. Almoço de Família

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"Se o mundo acabasse

Qual seria o seu último café da manhã?

Seus amigos da ponta dos dedos

Seus amores do fundo do peito

Contaria os seus maiores segredos?

Cantaria ou ficaria mudo?"

— Um Minuto, Melim

P.o.v. João

A ansiedade me acordou as cinco da manhã e não me deixou mais dormir.

Era sempre assim, quando a insônia não chegava a tempo de afugentar, ela mandava sua irmã, sempre no instante em que o primeiro raio de sol brilhava no céu.

Rolei na cama tentando por tudo voltar a pegar no sono, sem qualquer sucesso, pelo que pareceu uma eternidade.

Quando mirei as horas, ainda eram seis e meia.

Levantei, levei os olhos ao meu maço de cigarros, mas me contive, não adiantaria, eu sabia exatamente o que poderia afastar a ansiedade naquela manha.

Peguei meu celular e, a contragosto, procurei pela academia mais próxima.

Eu não era o tipo de pessoa que amava ir pra academia, mas aprendi que a única coisa capaz de aplacar minha ansiedade, pelo menos um pouco, era exercício físico, talvez a dor dos meus músculos distraísse meu cérebro o suficiente pra que eu não precisasse recorrer a mais fumaça toxica durante o dia.

Tentei comer alguma coisa, cafés da manhã de hotel são o meu fraco, mas não tive apetite pra nada, comi duas frutas e metade de um pão de queijo e torci pra que fosse o suficiente pra que eu não desmaiasse na academia.

Paguei apenas a diária, eu nunca assinava planos de academia porque nunca ficava mais de um mês no mesmo lugar.

Consequências de não ter uma casa.

Quando voltei pra casa, me sentia mais dolorido que o de costume, reflexo das últimas duas semanas que eu não fiz qualquer atividade física e ainda fumei mais do que em toda a minha vida.

Tomei um banho gelado, outra coisa que sou completamente cético e acho que quem diz que faz bem é algum tipo de coach que vai tentar de vender um curso de cimo ficar milionário em sete dias, mas não consegui colocar a água do chuveiro no quente ontem a noite, esses chuveiros cheios de botões são complicados.

Depois do banho, olhei de novo para o relógio, me sentindo relativamente mais calmo, ainda eram dez da manhã.

Jão: — E esse tempo que não passa? — Reclamei.

Que horas eu deveria chegar lá? Bem, na hora do almoço, obviamente, mas será que ela ainda almoça cedo igual quando morávamos no interior?

Lembrava-me bem que na nossa casa era comum comermos meio-dia em ponto, ou antes, disso, mas provavelmente aqui ela não deve almoçar tão cedo.

Ainda assim, pensando que talvez fosse bom chegar mais cedo, talvez até pudesse ajudar com o almoço, sei lá. Eu me arrumei e saí.

Passei em um mercado próximo pesando em não chegar com as mãos vazias. Fiquei em dúvida, eu deveria levar um vinho? Vai que me achariam um alcoólatra, mas e se levasse refrigerante e eles fossem daquele tipo de pessoa que demoniza açúcar como se fosse feito pelo próprio diabo?

Dádiva - PejãoOnde histórias criam vida. Descubra agora