Quinze dias antes.

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Havia ido até a loja de conveniência mais próxima pra comprar um pouco de comida e alguns doces. Quando estava ansiosa ou nervosa costumava comer bastante guloseimas, Geto dizia que eu parecia com Gojo nisso, pelo visto Satoru também era um amante de açúcar. Abro a porta do apartamento com minha chave e logo já vejo o gato de minha irmã vindo me receber. Ele mia antes de dar uma giradinha, provavelmente estava com fome, afinal já era noite. Não sabia se Geto já tinha alimentado Killua, mas como estava passando a maior parte do tempo ali, eu havia pegado essa tarefa pra mim. Naqueles últimos dias eu estava praticamente vivendo no apartamento junto ao rapaz. Geralmente eu saia pra comprar algo e também ia para as aulas da escola mas sempre voltava correndo pro lugar. Já Suguru estava praticamente ausente de suas aulas. Desde que havia sido honesta com o moreno sobre o que sentia não conseguia mais me desgrudar dele, as vezes me arrependia por não ter falado algo antes. Em partes, estar tão perto poderia de fato ser algo bom, já que ainda pretendia o ajudar no que quer que ele estivesse passando.

O gato da mais um miado alto interrompendo meus pensamentos, como se quisesse logo a sua ração.  Deixo as sacolas na mesa pra poder encher sua vasilha de comida.

– Satisfeito? -falo pro gato.

Ao me levantar, vejo a figura de Suguru de costas na pequena varanda do lugar, me fazendo dar um pequeno sorriso. Ajeito o vestido preto que usava antes de ir até ele, aquele era um dos meus preferidos. Ele possuía mangas arredondadas e alguns babados de renda na barra de sua saia curta. Gostava da vibe "vintage" que ele passava e combinava com meus mary jane preferidos. Vou andando até onde ele estava e passo os braços em volta de seu tronco, o abraçando por trás. Minha cabeça apoiava no meio de suas costas, podendo sentir seus cabelos negros em contato com a pele de meu rosto. Seu cabelo era uma das coisas que mais achava atraente no rapaz, gostaria que ele nunca os cortasse.

– Senti saudades. -digo em uma voz abafada devido a nossa proximidade antes de soltá-lo para poder me apoiar ao seu lado no parapeito da varanda.

– Você saiu por literalmente vinte minutos. -ele fala com uma risada curta.

– Eu sei, mas mesmo assim. -digo com um biquinho enquanto apoiava o queixo em meus braços para só então olhar para ele.– Você não sentiu?

     Ele dá uma risada curta olhando para mim e se aproxima para dar um beijo em minha cabeça antes de voltar a sua posição inicial.

– É claro que senti. -responde.

A luz dos prédios mesclada com a luz prateada da lua trazia um ar misterioso pra Suguru, que segurava um maço de cigarro aceso em uma de suas mãos. Odiava o fato que de Shoko havia o influenciado a isso e também não me lembrava dele tendo esse costume antes, o que me levava a pensar que tivesse surgido como uma forma de escape. Olhar pra seu rosto também tinha me feito perceber que apesar de sua resposta em um tom leve e brincalhão, sua expressão era de alguém que carregava um fardo pesado. Isso ainda deixava meu coração extremamente apertado. Gostaria que ele compartilhasse um pouco mais comigo sobre o que se passava dentro de sua cabeça, quem sabe assim eu conseguisse o ajudar de uma melhor forma. Porém toda vez era a mesma coisa, ele dizia que talvez eu não iria lidar bem com o que ele diria ou que não poderia colocar aquele peso sobre mim. E cada vez que Suguru dizia algo do tipo me deixava mais intrigada e preocupada. Suspiro desviando o olhar dele para prestar atenção na cidade a nossa frente.

– Você está mais quieto que o normal hoje. -falo ainda encostada no parapeito da varanda, podia sentir a brisa fria bater em meus cabelos.- Não vou te perguntar o que foi dessa vez.

      Se bem que, tocar naquele assunto, era como se eu estivesse perguntando. Suguru solta um suspiro antes de dar uma ultima tragada no seu maço de cigarro para enfim apagá-lo. Percebo que o moreno olhava de canto pra mim, o que me faz olhar para ele também.

– Dali, você realmente quer saber sobre isso?

    Franzo a testa exalando um pouco de ar de meu nariz, não queria ser invasiva mas com certeza queria saber sobre.

– Claro. Se quiser compartilhar, estou pronta pra ouvir.

– Ok. -ele respira fundo mais uma vez, se preparando para o que iria falar.- Você deve ter percebido o quanto a morte de Riko me afetou, tenho refletido bastante sobre isso desde então. Como também sabe, não tem sido fácil essa vida de feiticeiro. -ele faz uma pausa, podia ver um mix de emoções em seu rosto enquanto tentava expressar o que estava em sua mente.- Enfim, alguns dias atrás acabei me encontrando por acaso com Tsukumo, a feiticeira de nível especial... Bom, ela disse algumas coisas que ficaram na minha mente desde então.

Franzo a sobrancelha o encarando com um olhar confuso. Ele já havia tocado naquele assunto antes, parte de mim tinha um certo receio do que de onde realmente Geto queria chegar com toda aquela história. Porém, talvez por conhece-lo desde muito nova, eu confiava bastante em seu senso de justiça. Acreditava em suas palavras sem questionar muito, sempre havia sido assim. Lembrar do modo como protegia a todos ao seu redor, inclusive a mim quando éramos crianças apenas tornava minha confiança em Suguru mais cega. Porque isso mudaria agora? Enfim, era algo que realmente precisava analisar.

– Ela havia dito sobre a possibilidade de criar um mundo onde as maldições nem mesmo chegassem a nascer. -continua ele, mas acabo soltando uma pequena risada desacreditada mas logo volto a expressão séria de antes. Não queria que ele pensasse que eu estava rindo dele.

– É isso é possível? -pergunto erguendo uma sobrancelha.

– Hipoteticamente, sim. -ele respira fundo olhando para o céu.

– Entendi... -falo concordando com a cabeça.

        Eu sabia muito bem como a vida que levávamos podia ser exausta e como a maioria de nós, talvez no fundo, sonhasse com um mundo melhor. E um lugar onde maldições nem mesmo viessem a nascer obviamente seria um mundo melhor, mas como chegar a isso? Parecia uma utopia, um sonho distante. Talvez em um mundo sem maldições eu pudesse ter uma vida normal, fazer faculdade de moda e quem sabe viver sem preocupações desse nível ao lado de Geto. Mas mesmo que tudo aquilo parecesse muito bom, o caminho trilhado pra que esse mundo viesse a ser real era desconhecido. Não conseguia pensar em uma forma de tornar aquilo realidade. Talvez se a sociedade fosse composta só por feiticeiros, bom, era uma possibilidade mas para isso os humanos teriam que desaparecer... Era uma ideia genocida. "Com certeza ele não está pensando nisso."

Dali. -ele fala virando seu corpo em minha direção, sua expressão expressava uma seriedade mas também preocupação.- Eu não sei como vou fazer isso, mas quero fazer. Preciso fazer.

Ele faz uma pausa por um momento, levando uma de suas mãos até a lateral de minha franja para passa-la para trás da orelha. Sinto seus dedos frios descendo suavemente pela pele de meu rosto até chegar em meu queixo, onde ele inclina levemente meu rosto para cima.

– Prometa que vai estar ao meu lado quando isso acontecer. -ele diz olhando no fundo de meus olhos, podia sentir seu olhar penetrando minha alma.

Era uma promessa arriscada, não sabia qual caminho ele tomaria pra tornar seu objetivo real. Mas a presença de Suguru, seu toque, ser amada por ele ou ao menos sentir seu carinho... Havia sentido tanta falta nos anos que havia me distanciado dele, não podia perdê-lo de novo. Não podia deixar com que ele escapasse de mim mais uma vez. Suspiro ainda com o olhar fixo ao seu para poder levar minha mão até a dele, deixando um pequeno sorriso se formar em meus lábios.

– Não se preocupe, prometo que não vou te deixar. -respondo com uma voz baixa.- Nunca.

Drowing | Suguru GetoOnde histórias criam vida. Descubra agora