O casal de corvos

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No momento em que trancou a porta de seu quarto, foi retirando as peças de roupas e as jogando pelo chão conforme andava em direção a sua cama, estavam todas sujas de sangue, mas não era o sangue que lhe incomodava, se sentia sufocado e irritado com tudo que havia ouvido, aquele homem estava atrapalhando demais seus negócios, mas o único jeito de resolver teria que ser o encontrando pessoalmente, mas ele vinha fugindo a um bom tempo dos encontros.

Se sentou na cama e olhou para cima, as imagens do que aconteceu na fábrica eram repassadas de forma lenta em sua mente.

' Chegavam na fábrica pelo período da tarde e assim como desejava pegou todos de surpresa, o gerente assim que soube saiu correndo de sua sala e foi ao encontro de Adrian.

Estava completamente ofegante, era um homem baixo e corpulento, seus cabelos a cada dia pareciam lhe abandonar mais e mais, uma pele maltratada por conta da poluição, um terno tão barato que não passava nenhuma imponência ou classe. Sua voz mostrava o medo que sentia, pois sabia que seria repreendido e isso não poderia lhe acabar bem.

O homem após recuperar seu fôlego não parava de falar, como se tentasse amenizar todas as coisas ruins que estavam acontecendo, era nítido o quanto ele estava tentando puxar o saco. Isso fez com que Adrian o ignorasse por completo e deixasse apenas um sorriso falso nos lábios, enquanto caminhavam para o escritório geral.

Assim que chegaram ele pigarrou, numa forma mais educada de dizer que o homem deveria se calar.

- Quero todos os relatórios.

O gerente engoliu seco, podia notar suas mãos já suando pelo medo, colocou todos os relatórios sobre a mesa se afastando e ficando em silêncio.

As folhas sendo passadas eram o único som que tomava conta do ambiente, mas o olhar de Adrian mostrava um enorme descontentamento, os resultados estavam mais baixos do que o esperado.

Em uma das folhas ao ser passada lhe chamou atenção, parecia haver um erro e quando o leu com atenção notou que parecia ter sido alterado o conteúdo daquela folha. Se levantou e caminhou lentamente até o homem, era impossível dizer o que ele estava pensando só de olhar para o seu rosto, mas o gerente sabia o que lhe esperava, antes mesmo que Adrian chegasse perto dele, se jogou de joelhos e começou a implorar por perdão.

Adrian segurou o homem pelo colarinho e o levantou, o olhar de ódio e desprezo tomava conta de seu rosto, esperava por uma boa explicação.

- Senhor por favor, não foi minha culpa, fomos roubados, a carruagem já estava chegando próxima a cidade e .....

Antes que ele pudesse terminar de falar a frase levou um soco em sua bochecha, fazendo com que perdesse o equilíbrio e caísse ao chão já cuspindo sangue.

-Levante-se agora.

A raiva por não ter sido informado e por ter sido roubado o fez perder a compostura, já estava irritado com mais coisas e resolveu usar o homem à sua frente como fonte para desestressar, foram socos e mais socos até que aquele homem perdesse a consciência.

Ele saiu da sala sem se importar se aquele homem ainda estava vivo, abriu a porta e saiu em direção a carruagem, o cocheiro no momento que o viu, apenas abaixou a cabeça e abriu a porta para ele entrar, evitando até mesmo fazer contato visual. '

Não conseguia pensar em ninguém que ousaria lhe roubar ainda mais por ser uma matéria prima em que só sua fábrica conseguia refinar para o uso, se levantava irritado da cama e ia para o banheiro, entrando na água fria mesmo onde ficou por algumas horas. Ninguém iria o ver pelo restante do dia, só aparecendo para o horário da festa.

A noite tão aguardado chegou, Siena sentia um leve incômodo, pois nunca lidou com outras pessoas além de seus serviçais e professores, não sabia se iria se sair bem lidando com pessoas desconhecidas.

Em seu quarto Angel a ajudava a se arrumar, o vestido era levemente complicado, havia muitas partes a serem postas para montar o look completo. Era de um tom negro, sua primeira saia era curta, indo até metade de sua coxa, já na parte de trás formava uma longa cauda, o tecido da cauda tinha algumas penas dando a impressão de ser a cauda de um pássaro. A segunda saia era uma gaiola de ferro e ia por cima da primeira, a gaiola ia até o joelho, uma terceira saia era posta por cima da gaiola, sendo um tecido fino com fios de ouro que iam na mesma altura da gaiola.

Seu sapato era uma bota de salto fino cheia de fivelas banhadas em ouro. Um corpete negro era posto em sua cintura, modelando perfeitamente seus seios e a deixando com um decote que chamaria atenção de todos, o acabamento do corpete era feito em pedraria vermelha, junto ao corpete vinha uma longa gola alta formada com penas e pequenas hastes de metal para que ficasse em pé, aquela gola lhe dava uma aparência de rainha.

Seu cabelo estava preso em um coque bem alto, sendo segurado por uma pequena coroa, algumas penas eram colocadas na coroa e alguns fios soltos. Siena se olhava no espelho e se sentia mal com aquele visual, parecia ser o próprio agouro de morte daqueles que estavam indo a festa.

Sua maquiagem era simples, sombras em um tom negro e vermelho, batom vermelho como o sangue. Por um momento ela encarou a máscara em cima do banco próximo ao espelho, caminhou até ela e a pegou, assim a pôs em seu rosto. O tom de seus olhos eram mais destacados pelo tom preto em volta, a máscara havia uma parte toda em penas próxima aos olhos e um longo bico negro, parecia até mesmo o bico. Ficou se encarando no espelho por um momento, parecia um corvo, seu medo falava mais alto, não queria decepcionar ninguém naquele baile. Sua mente estava perdida em pensamentos, mas ao ouvir a voz de Angel parou para prestar atenção.

- Está muito bela, senhorita. Irá fazer sucesso no baile, espero que aproveite bastante e se divirta, não tenha medo de nada, tenho certeza que todos irão lhe adorar.

Siena sorria sem graça para a criada, que era mais amiga do que uma simples serviçal que a acompanhava.

- Obrigada, suas palavras são de grande conforto.

Um som de batida a porta fazia com que Angel caminhasse em direção e a abrisse apenas um pedaço, era o cocheiro, Siena não conseguia ouvir exatamente o que ele dizia, mas provavelmente estava avisando que a carruagem estava pronta e ela deveria descer, teve certeza que era aquilo ao ouvir sua criada respondendo o homem.

- Ela já está pronta, já iremos descer.

Fechou a porta e voltou para perto da garota, ficando de frente para ela e assim segurava em ambas as mãos da garota, Angel tinha certeza que aquela garota a sua frente estava morrendo de medo de tudo dar errado, além que Adrian costumava deixar todos à sua volta com medo e de que agissem de uma forma que ele não gostasse.

-Não se preocupe. Apenas faça tudo que aprendeu e nada irá dar errado. Agora temos que ir, pois se o cocheiro já veio o próximo a aparecer será o senhor Adrian e não será nada bom se ele vier, vamos vamos.

Segurou a garota pelo pulso e a puxou para fora do quarto, sem deixar que dissesse alguma coisa. Ao chegar à escadaria principal da casa, os criados que passavam por ali paravam para admirar a beleza da jovem.

Os olhos de Sienna percorreram por todo o ambiente e parava na figura de Adrian, ele estava belo e de um modo estranho aquela beleza a atraía seus olhos, suas roupas combinavam perfeitamente, um casal de corvos negros. Ele usava uma máscara igual, a gola de seu fraque era alta e com penas, todos os botões eram de rubi e usava uma calça negra mais justa que era encoberta por um coturno que ia até o joelho.

Chegando próxima a ele, podia notar o sorriso de satisfação no rosto do homem, ele se aproximou dela e sussurrou em seu ouvido, sua voz era calma e gentil, mas ao mesmo tempo passava um ar assustador que a deixava com receio e medo.

- Espero que nada saia errado.

Siena engoliu seco aquelas palavras, ficando ainda mais nervosa, desde que chegou mal teve convivência com 5 pessoas ao mesmo tempo, não sabia se iria conseguir interagir com mais. Nunca havia visto nenhuma daquelas pessoas sem ser por fotos que Angel havia mostrado do jornal, pelo menos sabia quem seriam seus pais.

Adrian a ajudou a subir na carruagem primeiro e subindo logo em seguida, ficando sentando de frente para ela, ele não podia negar que aquela mulher a sua frente tinha uma beleza única e estava maravilhosa naquelas vestes. Mas nenhuma palavra saiu de sua boca para a elogiar.

Noite das mil facesOnde histórias criam vida. Descubra agora