Capítulo 6 - Calmaria

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 O dia seguinte foi a imagem da tranquilidade. Gillibert não escondia as suas tentativas de animar Isemberd e o mago aceitou aquela demonstração de cuidado sem seus costumeiros pedidos de silêncio. Sentia-se horrível e descobriu danos no sótão da casa que precisavam ser consertados. Acabou trabalhando neles sem magia, fazendo remendos no assoalho e no teto à moda antiga, usando materiais reciclados dos caixotes que havia desmontado quando chegara.

A coruja saiu para comer e esticar um pouco as asas enquanto o mago cuidava de um chá e de um pão que ele assaria no fogão a lenha. Alguém bateu à porta e ele parou seus utensílios levitantes com um gesto antes de atender um Joran preocupado.

— Como o senhor está? — O rapaz perguntou, sem nenhuma saudação.

— Senhor? — Isemberd indagou.

O rapaz hesitou.

— É, bom, Maeven disse que viu o senhor sair correndo ontem da taverna. Fiquei um pouco preocupado, vai que o senhor fica doente morando aqui sozinho...

Isemberd suspirou. A última coisa que esperava era alguém vindo até sua casa no meio do bosque para ver como ele estava.

— Não estou muito bem, mas já fiz alguns remédios. Obrigado por se preocupar. — Ele balançou a cabeça. — E pare de me chamar de senhor, quantos anos eu pareço que tenho?

— Mais do que eu, certamente. — Joran devolveu — Mas... se você insiste.

O sábio trouxe mais uma cadeira para a varanda e os dois sentaram-se.

— Então, senh... erm, digo, Isemberd, eu terminei o poema.

— Ótimo. E?

— É que...

O sábio percebeu a voz de Gillibert chamando-o de algum lugar atrás da casa. Isemberd se colocou de pé de um salto, falando muito mais alto do que antes:

— Minha nossa, Joran! Eu esqueci de preparar as coisas para a visita de Sir Alard!

Joran franziu a testa.

— Credo, senhor, precisa gritar por isso?

— Não! Perdão! Preciso achar o Gillibert, onde será que ele se meteu?

A coruja pousou ali por perto, fora de vista no telhado da casa, observando, intrigada.

— Ah, posso ajudar a trazer suas encomendas. — o rapaz ofereceu.

Enrubescendo um pouco, Isemberd suspirou. Estendeu o braço e a coruja negra veio pousar nele, parando antes para circular a visita, animada.

— Agradeço. Posso te ajudar com a carta antes, pra você não perder a viagem.

O rapaz entregou uma folha de pergaminho dobrada para o mago. Isemberd deu uma lida por alto e franziu a testa, ficando em silêncio por um longo momento.

— Bem melhor. — Ele disse, de súbito. — Andou praticando?

— Sim. — ele sorriu — Suas explicações no outro dia foram bem fáceis de entender. Só precisei fazer alguns rascunhos depois que minha irmã me ajudou com algumas bobagens de garotinha.

Isemberd assentiu e devolveu a carta.

— Passe a limpo. Não se entrega cartas a lápis a uma donzela. Tem papel pra carta e pena em casa?

Os dois começaram o caminho para Otterwesh conversando sobre tinta, boas penas, como os rumores sobre monstros andavam ficando piores e sobre o aumento de visitantes de vilarejos vizinhos por causa do bardo do Conde. Gillibert já estava confortável o bastante com Joran para ocasionalmente voar ao redor dele de vez em quando, coisa que ele fez algumas vezes enquanto andavam. A dupla chegou ao vilarejo antes da hora do almoço. Isemberd pagou pelas encomendas e, pouco antes de saírem, o sábio parou diante da porta. Seus olhos doíam, a boca de seu estômago queimava, sua nuca se arrepiou e ele sentiu algo do lado de fora.

Tomo Sombrio - Terceira EstrelaOnde histórias criam vida. Descubra agora