o destino me reservou você. - malila.

sete

O som estridente do despertador tocava, me puxando do sono profundo no qual eu estava. Praguejei mentalmente por esse som ser o motivo do mau humor do começo do meu dia. Minha cabeça pesava, então me lembrei da noite de ontem, e o que quase iria acontecer. Me levantei da cama de uma vez e procurei algum remédio que curasse essa ressaca mortal que eu sentia. A noite de ontem... Meus pensamentos eram uma confusão de imagens e sensações. Carla Maraisa. Ela havia baixado a guarda de uma maneira que eu não esperava. E o que quase aconteceu entre nós...

Sacudi a cabeça e entrei no banheiro. O banho gelado me renovou dos pés à cabeça, cada gota de água fria parecia me trazer de volta ao presente. Mas, enquanto a água escorria, as memórias da noite anterior voltavam em flashes. A forma como Maraisa se mostrou vulnerável, as conversas mais pessoais que tivemos — quase escapando da linha do profissional. Aquela tensão que eu vinha tentando ignorar, achando que era só fruto da proximidade do trabalho, se intensificou de uma forma impossível de desconsiderar.

Por que ela baixou a guarda comigo? Era uma pergunta que eu não conseguia afastar. Sentia uma curiosidade crescente para entender o que havia por trás daquela fachada metódica e focada de Maraisa.

Será que essa viagem ao Brasil vai ser uma oportunidade para descobrir mais sobre ela? Por um momento, senti uma pontada de liberdade, uma espécie de permissão não dita, para tentar ir mais a fundo.

Assim que saí do banho, comecei a me vestir. Um traje em tons de cinza e branco, discreto e profissional, como sempre. A maquiagem foi cuidadosa, cobrindo as olheiras e o cansaço evidente da noite anterior. Enquanto me olhava no espelho, uma parte de mim se perguntava se Maraisa estaria tão exausta quanto eu hoje. Será que ela também está refletindo sobre ontem?

Ainda tinha tanto a resolver antes da viagem, o que só aumentava meu cansaço mental. Mas uma coisa era certa: o profissionalismo tinha que prevalecer. Peguei minha bolsa e as chaves, desci até a garagem e arranquei com o carro em direção à empresa. O trajeto foi feito no automático, como se meu corpo soubesse o caminho sem que eu precisasse pensar muito. Mas minha mente... minha mente estava longe de ser automática hoje. E eu sabia exatamente o motivo disso.

* * * *

Carla Maraisa
7:23am.

Era cedo ainda, e como de costume, eu já estava desperta e ativa antes mesmo do sol se decidir entre aparecer ou se esconder sob as nuvens cinzentas. Após a higiene matinal, sentei-me à bancada da cozinha, onde sempre começo meus dias, com meu notebook aberto, revisando os gráficos e números que iriam ditar o ritmo das próximas semanas na empresa. Um café preto, forte e amargo, sem açúcar, estava ao meu lado. Esse ritual me mantinha focada, principalmente em dias como hoje, após uma noite em que os limites pareciam ter se esvaído. Tomei um comprimido para ressaca logo cedo, e sabia que precisava estar 100% alerta, sem espaço para distrações.

Enquanto os gráficos passavam na tela, minha mente vagava de forma intermitente para a noite anterior. Marília e eu tínhamos nos aproximado de uma maneira que eu não previra. Foi sutil, mas significativo. Eu ultrapassei um limite? Por um momento, baixei minha guarda, deixei que ela visse um lado de mim que raramente exponho, e isso me incomodava. Não estava nos meus planos qualquer envolvimento emocional. Não agora, quando tudo parecia estar se encaixando profissionalmente.

Tenho uma missão clara e objetivos definidos - pensei, tentando racionalizar o que aconteceu.

Não há espaço para distrações. Desde que comecei a trabalhar na Mendonce's & Co., tudo foi meticulosamente planejado. Desde o envio do meu currículo até cada passo na direção do crescimento profissional. Eu me preparei para esse momento, e não podia deixar que uma simples troca de olhares ou conversas mais íntimas afetassem o que construí. Espero que Marília aja normalmente hoje, como sempre.