A febre

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Não foi uma boa noite de sono para Alastor. A queimação da fenda parecia ter piorado com o decorrer da madrugada, e de manhã, o ardor se estendeu da ferida por todo o corpo do pecador, incoerente com o frio que o ruivo sentia em sua espinha. Ele sabia o que era.

Febre.

O veado mergulhou em diversos cobertores para tentar conter a sensibilidade congelante que penetrava sua pele. As horas se estenderam devagar, deixando-o tremendo na cama, incapaz de iniciar sua rotina da manhã ou mesmo procurar por Lúcifer. A sensação que sentia era uma mistura de inquietação, exaustão e ansiedade, as roupas grudando no corpo suado, deixando-o extremamente desconfortável.

Na outra ponta do hotel, o Diabo podia sentir a alma de Alastor vacilar. Acordado já a algum tempo, o rei colocou um bom terno passado e levou alguns objetos até a cozinha para esperar pelo veado, em seguida preparou um café e iniciou uma leitura. Apesar de saber que algo estava muito errado com o cervo, seu orgulho o impediu de ir imediatamente verificar. Não, o ruivo era um homem adulto, inteiramente capaz de se cuidar sozinho, e se ele quisesse pedir ajuda, poderia muito bem ir até ele e deixar seu ego de lado por um breve momento, ou assim pensava o loiro. Entretanto, quando uma hora e meia se passou desde o combinado, o Lorde do Inferno ficou impaciente, ele pegou seus pertences e caminhou até o quarto do rival, onde entrou sem nem mesmo bater.

- Você está atrasado - anunciou o Morningstar, levando os olhos até a cama, onde a mancha vermelha e encolhida que era Alastor naquele estado tremia sem parar, abaixo de várias camadas de cobertores.

Assim que o Demônio do Rádio escutou Lúcifer entrando, não conseguiu nem mesmo disfarçar o quão fraco estava. Numa tentativa inútil, ele afundou totalmente em suas cobertas, cobrindo até mesmo o rosto para evitar o confronto com o rei. O anjo caído rosnou para a visão, em partes preocupado e principalmente irritado pelo ruivo não tê-lo contactado antes.

- Você está tão debilitado que não conseguiu nem pedir a minha ajuda?

- Não preciso da sua ajuda... - murmurou Alastor em tom baixo e fraco, falhando em qualquer tentativa de intimidação que poderia proporcionar ao homem mais baixo.

- Mas para me rebater você não poupou energia, posso ver - resmungou o rei, se aproximando da cama e puxando o tecido do rosto do pecador para medir sua temperatura. - E está queimando. Diga adeus para os seus cobertores.

- Nem pense niss-

Antes de terminar sua frase, Lúcifer já havia jogado os tecidos para longe, ainda tomando cuidado para não tocar Alastor ou olhá-lo demais. Tão irritante...

- Suponho que uma febre como esta não possa ser curada magicamente, oh senhor-todo-poderoso do inferno? - O veado comentou em tom sarcástico, colocando uma careta de desconforto enquanto fazia esforço para se encolher ainda mais.

- Se continuar assim vai virar do avesso, idiota - o anjo finalmente se sentou na cama. - E não, nada de magia angelical até eu tirar essa fenda de você.

- Você é bem inútil, Morningstar. Droga... Agora eu sei o que significa arder no fogo do inferno...

O trocadilho proporcionou algumas risadas do rei. Ele suspirou, acalmando seus nervos, e deixou a irritação de lado, mais focado em analisar o pecador ao seu lado.

- Vamos ver, você precisa de um banho gelado e roupas novas e limpas. Depois disso, começamos a segunda parte do seu tratamento.

- Se você acha que vai conseguir me enfiar num banho frio, precisa urgentemente reconsiderar a capacidade de sua mente, porque você está sendo muito é burro - disse Alastor, convencido de que o monarca não ousaria sequer o tocar.

A fendaOnde histórias criam vida. Descubra agora