Capítulo 1: A Jornada para o Desconhecido

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Na imensidão verde das fazendas de cacau do sul da Bahia, o Coronel Benício observava o horizonte com uma mistura de saudade e determinação. À sua frente, estendiam-se os campos de cacau que sustentavam sua fortuna, mas seu espírito estava inquieto. A notícia de oportunidades no distante e misterioso Amazonas o atraía como um chamado irresistível.

Naquela manhã, ele se preparava para a jornada que mudaria sua vida para sempre.

— Coronel, o senhor tem certeza dessa viagem? — perguntou Vicente, seu fiel capataz, ajustando as rédeas de um dos cavalos no estábulo. — A fazenda precisa de sua presença, ainda mais com as colheitas chegando.

Benício deu um longo suspiro, mas manteve o olhar firme nas montanhas ao longe.

— Vicente, já vi o bastante dessas terras. O cacau cresce, e a colheita vem. Mas há algo mais lá fora, algo que eu preciso ver com meus próprios olhos. O Amazonas... Aquela terra tem potencial, dizem que é rica em possibilidades, e eu não sou homem de deixar oportunidades passarem.

Vicente o olhou preocupado, mas sabia que o coronel era determinado. Ele não voltaria atrás.

— E a dona Clara? O senhor já pensou no que ela vai dizer quando souber dessa viagem?

Benício desviou o olhar, tocando o chapéu que segurava em mãos.

— Clara entende. Já fiz sacrifícios por esta fazenda. Agora é a minha vez de descobrir o que mais o mundo tem a oferecer. Cuide de tudo enquanto eu estiver fora. Não demoro.

Com uma última olhada em sua terra, Benício montou no cavalo e partiu, cavalgando em direção ao porto, onde o navio que o levaria ao coração da Amazônia o esperava.

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A viagem pelo rio Amazonas foi longa e silenciosa. À medida que o barco avançava, as paisagens ao redor se tornavam cada vez mais selvagens, exuberantes e misteriosas. Árvores imponentes, ribeirinhos silenciosos e o som constante da floresta envolviam o coronel em uma nova realidade. Era um mundo vivo e pulsante, bem diferente das plantações organizadas da Bahia.

Chegando a uma pequena aldeia de mercadores, Benício decidiu explorar mais profundamente a floresta, atraído por histórias de novas terras e riquezas. Seu olhar percorria a vastidão verde ao redor, fascinado pela grandiosidade da natureza.

— Que lugar... — murmurou ele para si mesmo, quase encantado com a imensidão à sua volta. — Nunca vi nada assim.

Enquanto caminhava mais fundo na mata, algo estranho aconteceu. De repente, entre as árvores, ele avistou o que parecia ser um vulto feminino. Rápido e silencioso. Sua curiosidade foi instantânea, e ele seguiu a sombra com cautela, o coração acelerado pela excitação e pelo mistério.

Ao se aproximar, viu a figura com mais clareza. Era uma mulher, alta, forte e bela. Estava armada com um arco e flechas, vestida com trajes simples de caça, mas adornada por penas coloridas e símbolos tribais. Ela o encarava com uma mistura de curiosidade e desconfiança. Seus olhos brilhavam com a intensidade de alguém acostumado a lutar e sobreviver.

Sem aviso, a mulher levantou seu arco. Antes que Benício pudesse reagir, uma flecha rasgou o ar, cravando-se em seu ombro.

— Ah! — ele gritou, caindo de joelhos, sentindo o sangue aquecer a pele.

Assustada com sua própria ação, a índia se aproximou com cautela, mas ainda mantendo a postura defensiva. Ela olhou nos olhos do estrangeiro, que gemia de dor, e percebeu que ele não parecia ser uma ameaça.

— Quem é você? — perguntou ela, em um português hesitante e carregado de sotaque.

Benício, respirando com dificuldade, olhou para a jovem guerreira.

— Eu... Eu sou Benício... Vim... Vim em paz... — conseguiu dizer entre suspiros.

A jovem hesitou por um momento, mas logo assobiou para chamar outros membros de sua tribo. Minutos depois, dois homens robustos, igualmente armados, surgiram da floresta e carregaram o coronel para a aldeia.

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Na aldeia, Benício foi levado até a oca do pajé. O ambiente era simples, mas cheio de ornamentos sagrados e símbolos de poder. O líder da tribo, um homem idoso de olhos sábios, se aproximou e examinou o ferimento.

— Por que está aqui? — perguntou o pajé com uma voz grave, enquanto uma das mulheres da tribo, a própria índia que o feriu, preparava ervas medicinais para tratar seu ombro.

— Estou à procura de terras... Novas oportunidades de negócios... Não quero guerra — respondeu Benício, a dor tornando sua fala mais lenta, mas seu tom sincero.

O pajé assentiu lentamente, como se pesasse as palavras do homem estrangeiro. Então, ele virou-se para a guerreira.

— Arani, você é a responsável por este ferimento. Agora será responsável por sua cura.

A jovem, chamada Arani, abaixou a cabeça em sinal de respeito, embora seus olhos ainda estivessem fixos em Benício com curiosidade.

Conforme os dias passavam, Arani cuidava de Benício com dedicação, enquanto ele, pouco a pouco, se recuperava. Durante suas conversas, a barreira inicial de desconfiança foi se dissipando. Ela lhe falava das histórias de sua tribo, das tradições de seus ancestrais e da imensidão da floresta. Ele, por sua vez, contava sobre as plantações de cacau, o comércio e as fazendas do sul.

Certa noite, enquanto Arani trocava os curativos de Benício, ele a observou em silêncio. Seus olhos negros refletiam o brilho das estrelas que cintilavam além da oca, e, pela primeira vez em sua vida, o coronel sentiu algo diferente, algo profundo.

— Eu nunca conheci alguém como você, Arani — murmurou ele, sem conseguir esconder o fascínio.

Ela ergueu os olhos, surpresa, mas sem desviar o olhar. Seu coração batia forte.

— Você também não é como os outros homens que já vi.

O silêncio que se seguiu não era desconfortável. Era cheio de promessas. Assim, em meio à vastidão selvagem da Amazônia, o amor entre Benício e Arani começava a tomar forma, como uma flor rara que desabrocha entre as árvores antigas.

*Continua...*

Yara Elisa: Entre Dois MundosOnde histórias criam vida. Descubra agora