Capítulo 6: Segredos e conflitos!

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⁴⁰³⁶ palavras.

     Três longos dias de caminhada e constantes fugas. Ao contrário do que pensei, os mortos também estão na floresta, em quantidade mínima, mas estão. Acredito que não há lugar em que não estejam. Andamos durante o dia e acampamos à noite, sempre nos revezando para vigiar o lugar enquanto os demais descansam. A primeira noite foi Erik quem ficou acordado; na segunda, Regina; na terceira Erik e Regina. Agora quem está somos eu e Erik. Passei a vê-lo como um amigo confiável. Embora nossa relação se resuma sempre aos meus monólogos e seus sorrisos quando falo algo bobo demais para acontecer.

     Hoje, pela manhã, Erik ensinava alguns golpes à Beatrice e isso me rendeu a ideia de que ele poderia ensiná-la o que sabe sobre luta. Não é seguro viver do modo como vivemos sem ao menos saber se defender, eu disse a ela.

     — Está perto de amanhecer. — afirmo ficando de pé, com os olhos de Erik perguntando-me silenciosamente para onde vou. — Farei uma ronda pelas proximidades do acampamento para ver se algum animal caiu em suas armadilhas e procurar algumas frutas. Você ficará bem sozinho?

     Ele confirma e eu pego o facão e sigo floresta a dentro. É uma mata densa e em poucos passos, os arbustos e árvores já haviam escondido o acampamento. Logo tudo ao meu redor não passava de um labirinto de sombras, onde a luz do sol que raiava no horizonte mal conseguia penetrar a folhagem entrelaçada das copas das árvores. As raízes das árvores serpenteavam por toda a extensão da terra, ocultas pela vegetação espessa que se agarrava ás minhas pernas impossibilitando-me de qualquer ligeiro avanço. Se tentasse caminhar mais rápido, poderia acabar por garantir uma queda fácil.

     O único som que atingia meus ouvidos era o barulho do farfalhar das folhas sob meus pés. O cheiro de terra úmida e folhas em decomposição impregnava o ar, denso e pesado como um cobertor sufocante. O vento sibilava entre as árvores, carregando os murmúrios de animais invisíveis que observavam silenciosamente cada movimento que eu fazia. A densa vegetação tornava impossível a vista de mais do que alguns metros a frente e a trilha parecia se perder em meio à confusão de arbustos.

     A poucos passos de onde estou, avisto a armadilha de Erik, grande demais para sua presa, e me aproximo com cautela. Tenho certeza de que Erik esperava pegar algo como um javali, um porco-espinho ou uma raposa, mas tudo que havia lá dentro era um coelho marrom mesclado à cor da terra e olhos vermelhos, arregalados em pânico. Abaixei-me devagar, abrindo a jaula feita a base de galhos e cipós e alcancei o pequeno e vulnerável bicho. Ele se agitou em minhas mãos, respirando rápido, seu peito subindo e descendo em um ritmo frenético, chutando meus braços, o que me rendeu alguns arranhões graças às suas unhas. Segurei-o nos braços encarando seus olhos. Era um animal frágil, preso por um mecanismo simples.

     Solto a pequena criatura no chão e ele mais que depressa agarra sua liberdade, afastando-se para longe de mim no meio dos arbustos. Ele era nossa comida, eu sei. Mas também não tinha culpa de ter seu lar invadido por estranhos que abusariam da hospitalidade a ponto de matá-lo. Porquê diabos eu decidi vir eu olhar as armadilhas? Eu ainda não me atrevi nem mesmo a matar um morto-vivo, quem dirá um coelho, ou um javali!

     Suspiro resignado olhando para cima. Odeio tudo isso! Olho mais adiante e vejo uma jabuticabeira carregada de jabuticabas aparentemente maduras. Considero um presente divino por poupar o coelho e vou até lá, pegando o máximo que posso até que a mochila em minhas costas estivesse cheia. Devolvo ela às minhas costas e pego o caminho de volta para o acampamento. Com passos cautelosos, do mesmo modo que vim, vou pegando a trilha, porém algo que faz parar e me abaixar.

     Vozes.

     Vozes de homens. Pelo menos dois deles. Olho em volta temendo que me vejam, então uma árvore toma minha atenção. Começo a subir nela e estava tão nervoso que não consegui sequer olhar para baixo e só continuei subindo, mais e mais. Bem como as demais, essa era uma árvore bem alta e em minutos eu estava no topo dela, agarrando firmemente o tronco áspero. Percebo o quanto estava ofegante e senti meus pulmões ardendo devido o esforço, tento controlar o ritmo de minha respiração. Logo a ansiedade dá lugar ao desespero por estar tão longe do chão. Olhar para baixo era aterrador, o chão havia sumido de vista, encoberto pelas folhagens das copas das árvores a baixo. Um vento mais forte sopra e meus dedos apertam-se com mais força em torno dos galhos. Uma queda daqui seria morte na certa. Fecho os olhos com força até o vento diminuir sua intensidade.

A Alvorada dos EsquecidosOnde histórias criam vida. Descubra agora