Os dias seguintes após a conversa na praça foram como um campo minado para Clara e Lucas. A reconciliação que ambos queriam, embora desejada, parecia frágil, como uma ponte recém-construída que ainda precisava de tempo e cuidado para se firmar. Clara sentia-se como se estivesse reaprendendo a caminhar ao lado de Lucas, sem saber exatamente como navegar pelas memórias dolorosas, pelas expectativas e, principalmente, pelos sentimentos que pareciam ainda tão intensos.Ela passava as manhãs ajudando sua mãe, e, à tarde, Lucas vinha à casa para consertar pequenas coisas que Dona Teresa, de maneira sutil, sempre pedia. Clara sabia que sua mãe estava criando essas oportunidades de convivência entre os dois, mas ela não se opunha. Cada encontro parecia um teste – uma chance de ver até onde poderiam ir sem desmoronar.— Você se lembra daquela vez que pintamos o portão de vermelho e depois percebemos que não combinava com nada? — Lucas comentou um dia, enquanto trocava uma das lâmpadas queimadas da cozinha.Clara riu, e pela primeira vez em anos, a risada saiu sem esforço.— Ah, sim. Minha mãe ficou furiosa, mas nós achamos que era a melhor ideia do mundo.— Foi um desastre total, mas nos divertimos, de qualquer forma — Lucas disse, descendo da escada com um sorriso no rosto, algo que Clara não via há muito tempo. Havia uma leveza nos momentos que passavam juntos, mas também havia uma camada de tensão subjacente, como se ambos soubessem que ainda precisavam enfrentar questões mais profundas.À medida que os dias passavam, Clara se sentia dividida entre a necessidade de lidar com o passado e o desejo de apenas seguir em frente. As feridas entre eles ainda estavam lá, apesar da leveza que algumas conversas traziam. Ela sabia que não poderiam continuar fingindo que o que aconteceu não existia. Havia uma verdade amarga que ambos precisavam encarar.---Em uma tarde particularmente nublada, Lucas apareceu na porta de Clara com um semblante mais sério do que o habitual. Depois de tantos dias de pequenas conversas e tentativas de reaproximação, parecia que algo maior estava prestes a ser dito.— Clara, precisamos conversar de verdade — Lucas disse, sem rodeios. — Não podemos continuar agindo como se tudo estivesse bem. Eu sinto que estamos andando em círculos.Clara, que estava sentada à mesa da cozinha com uma xícara de chá em mãos, suspirou profundamente. Sabia que aquele momento chegaria, mas o medo do confronto sempre a fazia adiar.— Eu sei, Lucas — respondeu ela, colocando a xícara de lado e o encarando. — Mas não sei por onde começar. Temos tantas mágoas que ficaram entre nós...— Exatamente por isso precisamos falar sobre elas — Lucas disse, sentando-se na cadeira em frente a ela. Seus olhos estavam firmes, mas havia uma dor ali que Clara reconhecia. — Eu pensei muito nesses últimos dias, e não posso continuar fingindo que está tudo resolvido. O que aconteceu entre nós foi... mais profundo do que qualquer um de nós quis admitir na época.Clara sentiu uma onda de ansiedade subir por seu corpo. O peso do passado parecia esmagá-la, mas ao mesmo tempo, sabia que esse era o único caminho para a verdadeira cura.— Eu... estava tão ferida naquela época, Lucas — começou ela, com a voz trêmula. — Senti como se você tivesse desistido de nós, de nossos sonhos. E eu sei que também cometi erros, mas foi como se você tivesse escolhido ficar para trás quando eu mais precisava que viesse comigo.Lucas balançou a cabeça, os olhos cheios de arrependimento.— Eu nunca quis que você pensasse assim. Eu sabia o quanto seus sonhos eram importantes, Clara, mas eu não conseguia deixar tudo para trás tão facilmente. Minha família, minhas responsabilidades aqui... eu estava preso. Mas não foi porque não te amava. Eu só... me perdi no meio de tudo isso.Clara ficou em silêncio por um momento, absorvendo as palavras dele. O tempo havia suavizado algumas das mágoas, mas a dor ainda estava lá, latente, como uma cicatriz que nunca sumira completamente.— Eu entendo agora, Lucas — disse ela finalmente. — Mas naquela época, parecia que eu estava fazendo tudo sozinha. E isso me magoou profundamente. Fui embora porque achei que era o melhor para mim, mas, ao mesmo tempo, sempre me perguntei se poderia ter sido diferente.Lucas se inclinou para a frente, seu olhar fixo no dela.— Eu também me perguntei isso todos os dias. E a verdade é que ambos fomos teimosos demais para encontrar um meio-termo. Mas... — Ele fez uma pausa, sua voz suave, mas firme. — Ainda acredito que podemos recomeçar, Clara. Não do ponto onde paramos, mas de um lugar novo, mais maduro.A ideia de recomeçar era assustadora para Clara. Havia o medo de se machucar novamente, de abrir-se e descobrir que ainda não estavam prontos. Mas, ao olhar nos olhos de Lucas, viu uma sinceridade que não conseguia ignorar. Eles não eram mais os jovens de oito anos atrás, cheios de expectativas e sonhos idealizados. Agora, eram duas pessoas mais conscientes de suas falhas, mas também mais preparadas para enfrentar a realidade.— Recomeçar... — Clara repetiu, quase como se testasse a palavra em seus lábios. — Eu quero tentar, Lucas. Mas com uma condição.— Qualquer uma — disse ele, rapidamente, seus olhos iluminados com a possibilidade de uma nova chance.— Precisamos ser honestos sobre tudo. Sem esconder o que sentimos, sem deixar as coisas não ditas. Da última vez, fomos engolidos pelo silêncio, e não quero que isso aconteça de novo.Lucas assentiu, concordando.— Prometo, Clara. Honestidade, acima de tudo.Eles ficaram em silêncio por alguns momentos, processando o que haviam acabado de concordar. Havia uma sensação de alívio, como se uma barreira invisível finalmente tivesse sido quebrada. Mas, ao mesmo tempo, sabiam que o caminho à frente não seria fácil. Recomeçar exigiria mais do que palavras; exigiria esforço e vulnerabilidade de ambos os lados.—No dia seguinte, Clara e Lucas decidiram caminhar juntos até o campo aberto nos arredores da cidade, um lugar onde costumavam ir quando queriam escapar do mundo. O campo, com suas colinas suaves e grama balançando ao vento, era o mesmo de antes, mas os dois que caminhavam por ele eram diferentes.— Lembro de quando costumávamos vir aqui para planejar o futuro — disse Lucas, olhando para o horizonte.Clara sorriu, olhando para o céu que parecia se estender infinitamente.— Sim, fazíamos tantos planos. Eu achava que tinha tudo resolvido. Mas agora, percebo que parte do que faz o futuro valer a pena é não saber exatamente o que vai acontecer.Lucas a olhou com ternura.— E agora? O que você acha que vem a seguir para nós?Clara respirou fundo, sentindo o vento suave em seu rosto. Não tinha todas as respostas, mas pela primeira vez em muito tempo, estava em paz com isso.— Acho que estamos dando o primeiro passo de muitos. E o resto... vamos descobrir juntos.Lucas sorriu e pegou a mão de Clara, como se aquele gesto fosse a confirmação do novo começo que tanto buscavam. As cicatrizes do passado ainda estavam ali, mas agora, estavam prontos para seguir em frente – com cuidado, com amor e, principalmente, com honestidade.E assim, Clara e Lucas começaram a reconstruir algo novo.
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Vidas Entrelaçadas: Entre desavenças e reconciliações
RomansaPrepare-se para uma montanha-russa de emoções! Neste romance, acompanhamos a vida de pessoas comuns que se veem envolvidas em situações extremas. Desavenças, traições e paixões avassaladoras moldam seus destinos e os levam a questionar tudo o que ac...