No dia seguinte, me levantei com uma sensação diferente. O habitual frio na barriga estava presente, mas era acompanhado por uma centelha de curiosidade, quase como se uma nova porta estivesse prestes a se abrir. Eu sabia que a conversa com Daphny mudaria alguma coisa, mas não fazia ideia do que estava por vir.
Cheguei ao estúdio dela no fim da tarde. O lugar era discreto, mas elegante, refletindo a personalidade da própria Daphny. Quando entrei, fui recebida por uma luz suave e uma música tranquila ao fundo, o oposto da agitação dos ensaios e passarelas que eu estava acostumada. Ela estava sentada em um sofá, folheando algumas fotos. Assim que me viu, sorriu e gesticulou para que eu me sentasse ao lado dela.
— Eu sabia que você viria — ela disse calmamente. — Estava esperando por esse momento.
Sentei-me e fiquei em silêncio, esperando que ela começasse. Daphny colocou as fotos de lado e me olhou com seriedade.
— Então, o que você descobriu, Isy? — perguntou.
Respirei fundo. As palavras já estavam formadas na minha mente, mas ainda era difícil colocá-las para fora.
— Eu percebi que... eu não estava vivendo para mim. Sempre achei que ser modelo seria o meu propósito, mas estava apenas seguindo o que os outros esperavam de mim. — As palavras saíram num fluxo contínuo, como se tivessem sido guardadas por tempo demais. — E, agora, estou perdida. Não sei se isso é o que eu realmente quero.
Daphny assentiu, sem parecer surpresa. Seus olhos mostravam compreensão, como se ela já soubesse o que eu diria.
— Isso é natural, Isy. Muitos passam pela mesma coisa. A diferença está no que você vai fazer agora que reconheceu isso.
Eu a encarei, tentando entender aonde ela queria chegar.
— E o que você acha que eu deveria fazer?
— Não posso te dar essa resposta — ela respondeu, sorrindo de leve. — Mas posso te mostrar algo que talvez ajude.
Daphny se levantou e foi até uma prateleira, puxando um grande caderno de capa preta. Ela o colocou na minha frente e o abriu. Nele, havia várias anotações e esboços de ideias. Algumas eram sobre moda, outras sobre arte e até sobre causas sociais.
— Este é o meu caderno de inspirações. Aqui, eu coloco tudo o que me move, tudo o que me lembra quem eu sou e o que quero expressar. O que você está vendo nas passarelas, nas revistas, é apenas uma parte de mim. Eu uso isso para contar histórias, para comunicar algo maior. Moda, para mim, é uma linguagem. — Ela fez uma pausa, me dando tempo para absorver suas palavras. — Eu acredito que você também pode encontrar sua própria voz, Isy, se olhar para dentro. O que você quer expressar para o mundo?
Essa pergunta me atingiu de maneira diferente. Pela primeira vez, comecei a ver a moda sob outra perspectiva. Não era apenas sobre aparência ou status; era uma forma de comunicação, uma maneira de mostrar quem você realmente é, sem precisar dizer uma palavra.
Daphny me entregou o caderno.
— Quero que fique com ele por um tempo. Use-o como um guia para explorar o que realmente te move. Pode ser qualquer coisa, não precisa ser moda. O que importa é encontrar sua própria voz.
Eu peguei o caderno, sentindo o peso simbólico que ele carregava. Sabia que esse era um convite para uma jornada de autodescoberta, algo muito além do que eu havia imaginado quando decidi ser modelo.
— Obrigada, Daphny — disse, emocionada. — Eu vou fazer isso.
Ela sorriu novamente, mas dessa vez com uma expressão de aprovação.
— Lembre-se, Isy: a liberdade está em você ser autêntica. Quando você encontrar o que te move, todo o resto fará sentido.
Saí do estúdio com o caderno em mãos e uma nova perspectiva na mente. Naquela noite, sentei-me na mesa do meu quarto e comecei a folhear as páginas do caderno. Cada desenho, cada anotação, me fazia perceber que o caminho que eu havia traçado até agora era apenas uma pequena parte do que eu realmente poderia ser.
E, assim, comecei a rabiscar. As primeiras linhas foram tímidas, mas, à medida que escrevia, algo dentro de mim se libertava. Não escrevia sobre desfiles ou roupas de grife, mas sobre quem eu queria me tornar. Não era mais sobre agradar aos outros ou seguir expectativas alheias. Pela primeira vez, eu estava ouvindo a minha própria voz.
Daphny havia me dado mais do que um caderno. Ela havia me dado a chave para me redescobrir. E eu estava pronta para abrir todas as portas que viessem pela frente.
VOCÊ ESTÁ LENDO
Não ao amor
RomanceUma menina rica cheia de sonhos de ser uma das mais famosas modelos de Milão começa uma faculdade e acaba se apaixonando por uma menina sem mesmo saber que se atraia.Os pais não são nada presentes e ela tem que lidar com as coisas sozinha,mas ela te...