Cores da vida

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No dia seguinte, decido ir à faculdade. Parte de mim ainda quer viver essa experiência. A banda não deu nenhum retorno até agora, e eu mesma não sei ao certo o que sinto sobre a música. Cantar sempre foi uma paixão, desde pequena, mas modelar... a sensação de estar na passarela, os olhares voltados para mim, os aplausos – será que estou realmente pronta para deixar tudo isso para trás?

Enquanto caminho pelo campus, com a cabeça cheia de dúvidas, esbarro em uma garota. Ela é impossível de ignorar: cabelos longos, cada mecha tingida de uma cor do arco-íris, piercing nos lábios e na sobrancelha, e olhos de um azul cristalino. Sua pele morena contrasta lindamente com o brilho das cores em seu cabelo.

— Desculpa, não te vi — digo, com um sorriso tímido, esperando alguma reação.

Ela apenas me lança um olhar indiferente, como se eu não fosse nada além de uma sombra em seu caminho. E segue em frente, sem dizer uma palavra.

Fico parada por um momento, surpresa com a frieza dela. Não estou acostumada a ser ignorada. Normalmente, todos ao meu redor reagem de alguma forma – seja por admiração ou inveja. Mas aquela garota? Ela parecia estar em seu próprio mundo, alheia a tudo.

"Tudo bem", penso, tentando afastar a sensação estranha que ficou. "Isso não vai estragar meu dia."

Continuo meu caminho em direção à sala de Design de Looks, ansiosa para descobrir sobre o curso. Moda ainda tem um lugar especial para mim, mesmo com todas as dúvidas. Quem sabe esse curso não me ajude a decidir o que eu realmente quero?

Quando o professor entra, começo a prestar atenção, mas minha mente continua voltando à garota de cabelo colorido. Quem será ela? Como alguém pode não se importar com nada, nem mesmo com os outros ao seu redor?

A aula segue, mas estou distraída. Minha mente flutua entre o desejo de me encaixar na faculdade e essa nova curiosidade que surgiu. Talvez seja ela o tipo de pessoa que eu preciso conhecer agora. Alguém que, diferente de mim, parece não se importar com expectativas ou padrões.

Mas por que estou tão interessada? Sinto como se essa garota representasse algo que falta em mim. Uma liberdade que eu nunca tive.

Enquanto o professor fala sobre as últimas tendências, eu me pego imaginando qual é a história dela.

A aula continua, mas parece que estou em um mundo à parte. Por mais que eu tente focar, aquela garota dos cabelos coloridos não sai da minha cabeça. Cada palavra do professor se dissolve no ar enquanto eu me perco em pensamentos. Ela parecia tão indiferente, tão livre de tudo aquilo que sempre me prendeu — beleza, aparência, aprovação.

Talvez eu a inveje. Não pela sua aparência chamativa, mas pela maneira como parece não se importar. Eu nunca pude me dar esse luxo. Desde criança, cada movimento meu era supervisionado, cada roupa escolhida com cuidado, e cada detalhe da minha imagem esculpido para ser impecável. Meus pais sempre diziam que, para manter nosso status, era preciso perfeição. Eu nunca conheci outra maneira de viver.

Quando a aula finalmente termina, me vejo perdida. A faculdade deveria ser uma fuga, uma chance de descobrir quem sou, mas parece que estou apenas repetindo o mesmo ciclo — seguindo um caminho sem realmente escolher. Pego minhas coisas e saio da sala, tentando não pensar tanto.

De repente, a vejo de novo, encostada em uma parede, mexendo no celular. Meu coração acelera, e antes que eu perceba, meus pés me levam até ela.

— Ei, eu... sobre mais cedo, desculpa de novo — digo, tentando soar casual.

Ela levanta os olhos, me analisando por um segundo. Não parece surpresa, apenas curiosa.

— Tá tudo bem — ela responde, com um tom indiferente, mas não rude.

O silêncio que se segue é desconfortável, e por um momento, sinto que fiz algo errado ao me aproximar. Mas algo em mim quer continuar. Preciso entender quem é essa pessoa que mexeu tanto comigo em tão pouco tempo.

— Eu sou a Isy— digo, estendendo a mão.

Ela olha para a minha mão, depois para mim, e, por fim, aperta minha mão de leve.

— Luna — ela diz, com um sorriso de canto, como se estivesse me testando.

— O que você estuda? — pergunto, tentando manter a conversa.

— Música. E você?

Meu coração dá um salto. Música? Talvez haja algo a mais que nos conecte.

— Design de moda. Mas eu canto também, desde pequena.

Ela arqueia uma sobrancelha, interessada pela primeira vez.

— Canta? E por que não estuda música, então?

Essa pergunta me pega de surpresa. Nem eu mesma sei a resposta exata. A música sempre esteve lá, como uma sombra, algo que eu amava, mas nunca levei a sério. Talvez porque, para meus pais, ela nunca foi uma carreira de verdade. Ou talvez porque eu mesma nunca me dei a chance de explorá-la.

— Não sei — respondo honestamente, com um pequeno sorriso. — Acho que sempre segui o que esperavam de mim.

Ela ri suavemente, mas não de maneira cruel. Parece que entende mais do que demonstra.

— Você devia tentar. Seguir o que você quer, não o que esperam de você.

Aquelas palavras parecem que era tudo que eu precisava ouvir para botar um fim nessa dúvida, é isso que tem faltado na minha vida. Eu nunca soube o que queria, porque sempre fui moldada pelas expectativas dos outros.

Luna se afasta da parede, colocando o celular no bolso.

— Se um dia você quiser falar mais sobre música, me procura — diz ela, feliz.

Eu a observo se afastar, o arco-íris em seu cabelo balançando ao vento. Eu quero essa leveza e despreocupação que ela aparenta ter, talvez isso é o destino me indicando para seguir o meu coração, que está duvidando sobre ficar nessa faculdade. Afinal eu tô no primeiro semestre ainda, creio que da tempo de eu alterar o curso.

São tantas dúvidas que até penso que minha cabeça vai explodir então resolvo escrever um pouco para desestressar. Afinal isso me ajuda a processar.

Não ao amorOnde histórias criam vida. Descubra agora