RACHEL KELLER
Acordo em um estrondo e caio da cama. O quarto de madeira escura e úmida balança inconsistente enquanto a tempestade ruge feroz aí lado de fora. O candelabro, minha única fonte de iluminação, apaga algumas de suas velas pelo vento poderoso que adentra da janela entreaberta. As ondas batem no casco do pequeno navio a vela e parecem lentamente rachá-lo. Com frio e dificuldade, caminho até a porta me equilibrando o melhor que posso. Após subir os terríveis degraus, todo meu corpo se encharca com a salgada e fedorenta água do mar, após mais uma onda terrível açoitar meu barquinho. O céu é coberto de nuvens negras, que se iluminam com eventuais raios vermelhos que correm por seu interior. As gotas pesadas da chuva machucam como pedras e o vento quase corta minha pele. Até respirar é um ato exaustivo. Com a maior das minhas forças, me movo até o mastro e tento recolher as velas, para evitar que o barco vire. Em um clarão, a ponta do mastro é alvejada por um enorme raio, que me deixa surda por alguns segundos e me faz fraquejar com o susto, me fazendo perder o equilíbrio. Sou jogada como uma boneca para a parede do barco com todo meu corpo, perdendo a consciência por alguns segundos. Olho para cima e vejo as chamas ardentes queimando a madeira do mastro. De alguma forma, é como se a chuva aumentasse o fogo, o deixasse mais forte. As labaredas descem e se espelham pelo deque, se retorcendo e gritando como uma multidão em desespero. Silhuetas de pessoas e lugares tomam forma na brasa. A tempestade se transforma em um tornado distante e puxa lentamente o barco para si. A ardência das chamas e os gritos de agonia me fazem entrar em desespero, então pulo na água para tentar me salvar.
O oceano salgado é denso de mais para nadar, mesmo com todos os meus esforços eu apenas afundo, mais e mais, me afogando em meio a escuridão. Um silêncio terrível toma conta. Um silêncio absoluto. Escuto meu próprio coração batendo, escuto o sangue correndo em minhas veias, o atrito dos meus ossos quando me movo. Depois de um tempo, nem isso escuro mais. Já não respiro há mais tempo do que deveria ser possível, mas a dor nos pulmões também cessou.
Imagens começam a aparecer ao meu redor. Atrás de mim, vejo um espelho. A minha esquerda, um anel branco e retorcido. A minha direita, uma arma de fogo engatilhada. Em minha frente, vejo um túmulo sem nome. E em meus pés, a escuridão que continua a me consumir - Escolha! - diz a escuridão, enquanto minha alma se retorce em sofrimento.--- === O === ---
03 de junho de 2006
Acordo de manhã com o despertador tocando músicas da rádio e o cansaço me consome. Sempre um pesadelo estranho todo santo dia. Normalmente, eles sempre são iguais ou muito parecidos, mas esse foi... estranho. Samara disse que está fazendo seu melhor, mas isso ainda me incomoda horrores. Me surpreende como não importa o que aconteça, nunca me acostumo ou possuo qualquer controle sobre eles.
Respirando fundo, me levanto da cama encharcada de suor. Troco os lençóis e faço meus alongamentos matinais, isso sempre me ajuda a despertar. Me olho no espelho do banheiro e essas malditas olheiras continuam ali, já perdi a conta de quanto tempo faz que surgiram, mas parecem ter vindo para ficar. Ainda cansada, tento me animar com a música e tomo um bom banho. Depois de me secar, adentro o quarto para poder vestir minhas roupas. Abro a janela e sinto o doce cheiro da primavera se esvaindo enquanto o brilho do sol vai cada vez ficando mais intenso. Mesmo com o clima naturalmente mais frio e úmido do Oregon, o calor que temos em Astoria surpreende os desavisados. Verão, uma estação que aprecio, apesar de ser incomoda às vezes, devido aos mosquitos atrapalham e do suor que irrita. A cidade já se prepara com antecedência para o dia da independência, mesmo que ele só vá ocorrer mês que vem. Muitos moradores já iniciam seus passeios a praia e ao rio Colúmbia que também passa pela cidade. Carros de sorvete já passam pelas ruas e, agora que as férias escolares chegaram, a tendência é só aumentar. Como a cidade não costuma receber turistas ou muitos visitantes, a rotina aqui segue basicamente a mesma todo ano, grande festival de fogos no 4 de julho e festas de adolescentes pela cidade e nas praias. Não tem boates ou muitos bares, mas os poucos que tem, enchem frequentemente. A cidade é a mais velha do Estado e os moradores insistem em manter a arquitetura da época, logo mesmo com o tempo passando rápido, esse lugar sempre parece anacrônico.
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Storm Within
Mystery / ThrillerUma história que se passa no universo da série de filmes: O Chamado (The Ring), que acontece após os eventos do primeiro filme. Nessa história, Rachel Keller, uma jornalista investigativa, toma uma decisão difícil que muda completamente sua vida, ap...