Família

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Março, 2022

Malia Simphiwe Baker

Abro os olhos de forma abrupta, sentindo minha respiração ofegante e irregular. O suor escorre pela minha testa e costas, deixando claro que aquilo não foi apenas um sonho – foi um pesadelo. Sento na cama, tentando afastar as imagens perturbadoras que minha mente criou. Olho para o relógio na cômoda ao lado: 05h27. Já não sei o que é uma boa noite de sono há três anos.

Passo a mão pelo rosto e solto um longo suspiro. Tiro a coberta de cima de mim e caminho lentamente até o banheiro. Tranco a porta, retiro toda a roupa e encaro a garota do espelho, uma garota que já não reconheço. Meu coração acelera, a falta de ar me consome, as mãos começam a tremer e meus pés formigam. A pressão no peito é intensa e minha cabeça gira levemente. Com medo de desmaiar, faço algo para me distrair.

Abro a gaveta do banheiro e pego uma lâmina de barbear. Estico o braço esquerdo, pressiono a lâmina contra a pele e deslizo, vendo o sangue formar uma linha fina no meu pulso. Minha respiração começa a se acalmar um pouco, então faço outro corte, desta vez mais profundo. Não me orgulho disso, mas meus pais não acreditam em psicólogos e estão convencidos de que estou bem. Para mim, isso ou enfrentar uma adulta que não entende nada sobre o assunto.

Faço mais dois cortes antes de parar, sendo interrompida pelo alarme das 05h40. Uso um absorvente para estancar o sangue, embrulho tudo em papel higiênico e jogo no lixo. Prendo o cabelo em um coque rápido e entro no chuveiro. A água morna escorre pelo meu corpo e faz os cortes arderem, mas isso já é uma sensação familiar. Cuido para não passar a bucha sobre as feridas, evitando perguntas ou olhares preocupados dos meus amigos.

Após o banho, me seco e visto uma calça de moletom cinza, uma blusa preta de manga comprida e meu casaco de moletom cinza do time de rugby. Pego minha mochila, que já está arrumada, dou uma arrumada na cama e vou para a cozinha. Minha mãe está lá, mais séria que o normal.

— Bom dia, mãe. — Sento e pego um pedaço de pão, passando margarina e tomando um gole do meu café com leite. — Aconteceu alguma coisa?

— Bom dia, filha. — Ela suspira, parando de mastigar. — Depois da escola, quero que você venha direto para casa. Suas avós chegam hoje.

— Minhas avós? — pergunto, surpresa. — Elas disseram que nunca viriam para cá, por causa do "legado Baker".

— Eu sei, mas parece que mudaram de ideia. Elas querem passar um tempo com você. Deixo você subir para o quarto depois de meia hora. O que acha? -Solto um suspiro, resignada.

— Tudo bem. Só me avisa na hora do jantar, então. Preciso ir, vou me atrasar. — Pego minha mochila e saio de casa.

Coloco os fones de ouvido e começo a caminhar em direção à escola. O atrito da blusa contra os cortes no meu pulso me incomoda, mas tento ignorar. Chego rápido à escola e vejo Joshua me esperando na porta da sala. Tento passar direto, fingindo que não o vi, mas esbarro em Kylie, minha amiga... e crush.

— Desculpa! — digo, corando de leve. Kylie sorri gentilmente.

— Tudo bem, eu também estava distraída. Você se machucou? — pergunta, preocupada, olhando para meu braço.

— Não... — Olho para o meu pulso e vejo uma gota de sangue escorrendo. — Eu... me arranhei dormindo, não é nada sério.

— Malia, isso não parece só um arranhão... — Ruby, que se aproxima, tenta segurar meu pulso, mas eu rapidamente me esquivo, recuando. Nesse momento, vejo Joshua, parado logo atrás, me olhando com uma expressão triste, quase desapontada.

Amor e Mafia: Laços ProibidosOnde histórias criam vida. Descubra agora