Capítulo 23

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Acordo com câimbras terríveis e tontura. A testa está coberta de suor frio e meus membros tremem incontrolavelmente.

Por quase um ano, venho envenenando meu corpo todos os dias. Meu sangue está acostumado às doses, bem maiores do que quando comecei. Está ficando viciado nelas. Agora, não consigo ficar sem.

Fico deitada no chão tentando organizar meus pensamentos. Tento lembrar as muitas vezes que Madoc saiu em campanha e digo a mim mesma que ele ficou desconfortável em todas elas. Às vezes, dormia deitado no chão, a cabeça sobre um monte de mato e os braços. Às vezes, estava ferido e lutava mesmo assim.  Ele não morreu. 

Eu também não vou morrer.

Fico repetindo isso, mas não sei se acredito.

Durante dias, ninguém aparece.

Eu desisto e bebo a água do mar.

Às vezes, penso em Sadie enquanto estou deitada lá. Penso em como deve ter sido crescer como uma membra honrada da família real, poderosa e sem amor. Alimentada com leite de gato e negligência. Levar surras arbitrárias do irmão com quem você era mais parecida e que mais parecia gostar de você.

Imagine tantos cortesãos se curvando a você, permitindo que você reclame e bata neles. Mas por mais que os humilhasse e machucasse, você sempre soube que alguém os achava digno de amor, quando ninguém fez o mesmo por você.

Apesar de ter crescido entre os feéricos, eu nem sempre entendo o jeito como eles pensam nem o que sentem. Eles são mais parecidos com mortais do que acham, mas assim que eu me permito esquecer que não são humanos, eles fazem algo que me lembra. Somente por esse motivo, eu seria burra de achar que sei o que Sadie sente com base na história dela. Mas imagino.

Eu imagino o que teria acontecido se eu tivesse admitido que não consegui tirá-la da cabeça. 


(...)


Eles acabam aparecendo. E me dão um pouco de água, um pouco de comida. A essa altura, estou fraca demais para me preocupar em fingir estar encantada. 

Conto os detalhes que lembro da sala de estratégias de Madoc e o que ele acha das intenções de Orlagh. Repasso o assassinato dos meus pais com detalhes viscerais. Descrevo um aniversário, juro minha lealdade, explico como perdi a ponta do dedo e que menti sobre isso. 

Até conto umas mentiras, seguindo as ordens deles.

E depois tenho que fingir esquecer, quando me mandam esquecer. Tenho que fingir estar satisfeita quando me dizem que banqueteei e que estou bêbada de vinho quando só tomei um cálice de água.

Tenho que deixar que me estapeiem.

Não posso chorar.

Às vezes, deitada no piso de pedra, me pergunto se há um limite para o que vou deixar que façam comigo, se há algo que me faria reagir, mesmo que me condenasse.

Se houver, eu sou uma tola.

Mas talvez, se não houver, eu seja um monstro.

— Garota mortal — chama Caleb uma tarde, quando estamos sozinhos nos aposentos cheios de água do palácio. Ele não gosta de usar meu nome, talvez porque não queira ter que se lembrar dele, por me ver como descartável, tal qual qualquer garota humana que passou pela Mansão Hollow.

Estou fraca de desidratação. Eles se esquecem de me dar água fresca e comida e me encantam com alimentos ilusórios quando peço. Estou tendo dificuldades para me concentrar nas coisas.

The Wicked Queen - Sadie Sink and You (pt2)Onde histórias criam vida. Descubra agora