Capítulo 7

37 5 1
                                    

POV. Enid

As últimas vinte e quatro horas tinham sido um verdadeiro enigma. Desde a cena na pista de skate, Wednesday estava agindo de forma ainda mais distante do que o habitual. Ela evitava cruzar olhares comigo, e cada tentativa de aproximação era frustrada por uma barreira invisível que a morena erguera entre nós. Na aula de química, onde normalmente compartilhávamos a mesa, a situação não era diferente. Se antes ela já era fria, hoje estava mais ríspida do que nunca.

— Preciso do béquer. — disse ela, sem nem me olhar.

— Tá, já te passo. — respondi, tentando manter o tom leve, mas não recebendo nada além de um aceno de cabeça como resposta.

Eu não sabia o que fazer. Quanto mais ela me afastava, mais eu sentia vontade de ficar próxima. Era como se o mistério em torno dela me atraísse ainda mais. E a lembrança daquele quase beijo... O jeito como ela saiu tão abruptamente, como se tivesse sido pega em flagrante. Precisava entender o que estava se passando em sua cabeça. Mas hoje ela estava especialmente impossível.

— Wednesday, eu só queria saber... — comecei, tentando puxar conversa.

— Enid, estamos aqui pra fazer o experimento, não pra conversar. — Ela cortou, firme, sem me dar brecha para continuar.

Suspirei e voltei a prestar atenção no que fazíamos. As palavras dela me atingiam como se fossem estacas, mas, por dentro, eu só ficava mais determinada. Durante a aula, ela pediu licença e saiu para ir ao banheiro, sem olhar para ninguém. Algo dentro de mim estalou. Talvez essa fosse a minha chance. Talvez, longe dos olhares de todos, ela pudesse baixar um pouco a guarda e eu finalmente conseguisse entender o que estava acontecendo.

Esperei alguns segundos antes de me levantar, fingindo arrumar meu material, e segui pelo corredor, tentando não chamar atenção. Quando vi Wednesday voltando em direção à sala, meu coração começou a acelerar. Me escondi atrás do armário do corredor e esperei ela passar por mim, antes que pudesse protestar, agarrei-a pela cintura com uma mão e cobri sua boca com a outra.

— Shhh! — sussurrei em seu ouvido enquanto a empurrava gentilmente para dentro da salinha do zelador. Ela tentou resistir, mas não forcei nada. — Só quero conversar!

Assim que estávamos dentro, fechei a porta e a soltei, dando um passo para trás. Wednesday, com os olhos faiscando de raiva, me encarava como se estivesse prestes a me matar.

— Você é maluca, sabia? — disse ela, em um tom baixo, mas cortante. — O que diabos você acha que está fazendo?

— Eu só... Eu só quero entender. — respirei fundo, tentando manter a calma. — O que foi aquilo na pista de skate ontem? Você fugiu de mim, e agora está me evitando a todo custo. O que está acontecendo?

Wednesday cruzou os braços e desviou o olhar, claramente irritada por estar naquela situação.

— Não é da sua conta. — respondeu seca.

— Como assim, não é da minha conta? — retruquei, sentindo a frustração subir. — Eu estava lá. Nós quase... Eu achei que... — Meus pensamentos estavam uma bagunça, mas eu precisava encontrar as palavras certas. — Você não pode simplesmente agir como se nada tivesse acontecido.

Ela respirou fundo, passando a mão pelos cabelos negros. Pela primeira vez, parecia ligeiramente desconfortável, como se estivesse prestes a dizer algo que preferia manter guardado.

— Eu não... — começou ela, mas parou. — Não quero falar sobre isso, Enid.

— E por que não? — dei um passo à frente, tentando não ser muito insistente, mas sem esconder a urgência em minha voz. — Eu sei que tem algo aí. Você fica me afastando, mas ao mesmo tempo, parece que não quer se distanciar de verdade.

Wednesday fechou os olhos por um momento, como se estivesse tentando manter o controle. Quando voltou a abri-los, sua expressão era de cansaço, e não apenas físico.

— Não é você, Enid. — Ela falou devagar, as palavras soando quase forçadas. — É que... Eu não sou boa em... — Ela hesitou, claramente desconfortável com a vulnerabilidade. — Eu não sou boa em me aproximar de ninguém. Isso nunca acaba bem.

— O que você quer dizer com isso? — perguntei, suavizando o tom, começando a entender que ali havia mais do que eu imaginava.

— Eu só... já passei por coisas que me fizeram ficar assim. — Sua voz era quase um sussurro. — E eu prefiro manter distância. Sempre que me aproximei de alguém, isso terminou mal. Então, sim, eu fujo. É mais fácil assim.

Algo se acendeu dentro de mim. Wednesday estava, pela primeira vez, deixando cair a máscara. Eu queria dizer algo que a confortasse, que quebrasse essa barreira de uma vez.

— Eu entendo que você tenha seus motivos. — Eu disse, me aproximando mais um pouco. — Mas eu só queria tentar ser sua amiga, pelo menos. Não precisa ser complicado, sabe? Só... uma trégua.

Ela me olhou como se eu tivesse falado algo completamente absurdo.

— Amiga? — Wednesday perguntou com uma ironia quase amarga. — Por que você insistiria em algo assim? Não faz sentido.

Sorri suavemente, tentando quebrar o gelo.

— Porque é de você que estamos falando Wednesday. — disse sem rodeios.

A frase a pegou de surpresa. Seus olhos escureceram, e pude perceber uma mudança sutil em sua postura. Ela parecia ansiosa, como se minhas palavras tivessem mexido com algo que ela tentava esconder.

— Você não me conhece de verdade, Enid. — Ela disse, a voz fria voltando. — Eu não sou o que você pensa.

Eu poderia ter recuado naquele momento, mas ao invés disso, estendi a mão e toquei levemente o braço dela, chamando sua atenção.

— Talvez eu não conheça você completamente, ainda. — falei, olhando em seus olhos. — Mas quero conhecer. E, sinceramente, eu acho que vale a pena.

Ela hesitou, e naquele instante, senti que talvez estivesse prestes a abaixar ainda mais a guarda. Seus olhos encontraram os meus, carregados de algo que eu não conseguia decifrar completamente, mas parecia importante. Eu me inclinei um pouco mais, esperando que ela cedesse.

Mas então, com o mesmo jeito brusco de sempre, Wednesday recuou, os olhos agora firmes e fechados.

— Não. — disse ela, a voz fria, mas menos afiada do que antes.

— Wednesday, por favor… — insisti, tentando tocar seu braço. — Só uma trégua, só… uma chance.

Ela me olhou por alguns segundos, como se estivesse travando uma batalha interna. Então, soltou um suspiro quase imperceptível e disse, relutante:

— Tudo bem, Enid. Uma trégua.

Um pico de alegria explodiu dentro de mim, e antes que eu percebesse o que estava fazendo, envolvi a morena em um abraço apertado, erguendo-a do chão e girando com entusiasmo.

— O quê? Enid, me solta! — ela exclamou, visivelmente assustada, mas, para minha surpresa, não conseguiu segurar o riso. Um som leve e inesperado escapou de seus lábios, algo tão raro que quase me fez parar de girar.

— Eu sabia que tinha um lado mais leve aí dentro! — brinquei, ainda rodopiando.

— Chega! — Ela tentou falar entre risadas que, por fim, se transformaram em um semblante sério. — Me solta, agora!

Parei imediatamente, ainda segurando Wednesday, mas com um sorriso que era impossível de disfarçar.

Quando a soltei, ela rapidamente recuperou a compostura, ajeitando as roupas e voltando a sua carranca habitual.

— Não faça isso de novo. — disse ela, tentando manter a expressão dura, mas eu pude ver um leve brilho de humor em seus olhos.

— Claro, claro. — respondi, ainda sorrindo.

Eu sabia que aquela era uma pequena vitória. Ela pode até tentar esconder, mas agora eu tinha certeza: havia muito mais em Wednesday Addams do que ela deixava transparecer.

-----------

Obrigada por lerem

Até o próximo!

_Débzzz

Skater Girl - WenclairOnde histórias criam vida. Descubra agora