Capítulo 6 - Drake Cayman, céus!

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Amélia - 1830

Encaro vosso semblante, perdendo-me na profundidade de vossos olhos, tão inigualáveis. Vossos traços firmes e o suave cair dos fios de cabelos sobre vossa face são quase hipnotizantes.

— Senhor Drake — pigarreio, tentando escapar do transe em que me encontrei. — Gostaríeis de um passeio em nosso jardim? Para familiarizar-vos, é claro.

Sorrio, mas logo sinto o calor da vergonha em meu rosto. Que pensamentos são estes que me assolam? Sou casada com vosso primo! Não deveria jamais permitir-me ser vista a sós com um cavalheiro. Meu marido... Um aperto em meu peito me recorda da verdadeira natureza daquele que me une pelo matrimônio. Um monstro.

— Vossa Senhoria está bem? — Ouço os passos suaves de Drake se aproximando, e sinto seu olhar perscrutando minhas feições. — Seria um grande prazer tê-la como companhia em minha caminhada pelo jardim.

Assinto com um leve sorriso. Ordeno silenciosamente aos criados que mantenham discrição. Não convém que murmúrios surjam. Caminhamos em silêncio, um ao lado do outro, respirando a fragrância suave das flores ao redor, com o vento soprando levemente.

— Aqui está nossa estufa — interrompo a caminhada, virando-me para a construção. — Nela mantemos espécies raras, e, por tal preciosidade, um botânico de excelência se faz necessário. Estas flores são frágeis, delicadas... Requerem cuidados constantes e dedicação. Cuidá-las é um gesto de amor. Posso confiar-vos tamanha responsabilidade, senhor Cayman?

— Sem dúvida, Vossa Senhoria — responde ele, visivelmente encantado pelo que vê. — Cuidarei deste jardim com toda a atenção e afeição que me for possível. Será uma honra tratar cada flor como se fosse minha própria filha.

Enquanto ele fala, uma onda de emoções me sufoca. Tristeza. Raiva. Solidão. Por que meu marido é um ser tão vil? Por que não pode ser mais como Drake? Ao invés de receber carinho e ternura, sou agraciada com seu pior lado, a cada dia mais podre. Ah, se eu fosse uma flor, poderia ao menos experimentar o prazer de ser cuidada, de ser amada... Meu coração se aperta com essa dor, e um mal-estar me toma por completo.

— Vossa Senhoria está bem? — A preocupação em seu olhar me alcança, e sua mão repousa suavemente sobre meu peito, o que me causa uma surpresa.

— Estou bem — murmuro, puxando o ar lentamente. — Não vos preocupeis. Foi apenas um leve mal-estar.

— Se houver algo em que possa servi-la, não hesiteis em pedir-me. Estarei sempre à disposição para cuidar de vós e dos negócios de meu primo na ausência dele. Espero tratá-la com a mesma dignidade que ele, certamente, o faz.

Oh, céus! Se ele ao menos soubesse... Meu pobre Drake, desconhece a verdadeira natureza do primo. O que me acomete é um segredo que devo levar ao túmulo. Difamar o duque não traria justiça — apenas mais sofrimento.

— Claro, senhor — respondo, tentando esconder o desgosto que sinto em cada palavra. — O maior desejo de meu marido, creio, é que eu lhe dê um herdeiro. Contudo, ainda não tivemos essa sorte.

— Estou certo de que, em breve, Vossa Senhoria estará carregando um herdeiro em vosso ventre — ele diz, fitando-me de um modo que faz minhas pernas vacilarem.

Um calafrio percorre minha espinha, e sinto como se borboletas se agitassem em meu estômago.

— Sim — sorrio fracamente. — No tempo devido, creio que sim.

Drake se aproxima ainda mais, e o pequeno espaço que restava entre nós se dissolve. Minha respiração torna-se mais lenta, pesada, enquanto meu coração dispara. Nossos olhos permanecem fixos um no outro.

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