𝐂𝐚𝐩𝐢́𝐭𝐮𝐥𝐨 𝐕

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Kaiser entrou na unidade médica e foi direto para o quarto de Serena. Ao abrir a porta, encontrou a mulher no mesmo estado que havia observado há meses. Serena estava em péssimo estado devido a uma doença pulmonar grave, sua pele pálida e o cansaço visível.

— Onde você esteve, moleque?! Mandei te procurarem em todo o santuário, e ninguém te encontrou! — Serena gritou com raiva, mas logo começou a tossir violentamente. Ela cobriu a boca com um pano, e quando o afastou, Kaiser viu, mais uma vez, manchas de sangue.

— Eu estava em Rodorio com Manigold... Desculpe por não estar aqui quando você precisou. — A voz de Kaiser saiu baixa, refletindo o contraste com a fúria de Serena.

— Grudado com aquele garoto de novo?! Não me surpreenderia se soubesse que vocês estão se deitando juntos, seu nojento! — Ela continuou, sua voz cheia de veneno, jogando um copo em direção a ele. Kaiser desviou com facilidade, mas aquelas palavras o atingiram de uma forma profunda, despertando nele um sentimento de tristeza que ele tentava suprimir.

— Você me chamou só para dizer essas asneiras?! Vou embora. — Ele rebateu com raiva, girando nos calcanhares e saindo do quarto, batendo a porta com força.

— Vai mesmo, sua bicha! — Serena gritou do outro lado da porta. Kaiser, ao ouvir, franziu o cenho. Ele estava prestes a deixar o local, mas foi interceptado por uma enfermeira.

— Kaiser! Que bom que você está aqui! — Ela lhe entregou uma maleta e um casaco e empurrou-o na direção de um paciente. — Cuide disso para mim, vou tirar meu intervalo. — Ela deu alguns tapinhas nas costas dele antes de se afastar.

Kaiser respirou fundo, tentando afastar seus problemas pessoais. Ele olhou para o paciente: um jovem de cabelo azul, longo e desarrumado, que sorriu ao vê-lo.

— Dia difícil, né? Manigold fez alguma coisa? — Era Kardia, outro discípulo de um cavaleiro de ouro. Kaiser ajoelhou-se ao lado dele, abrindo a maleta e começando a cuidar de um corte no braço do rapaz.

— O que te trouxe aqui, Kardia? — Kaiser perguntou enquanto passava um líquido desinfetante na ferida.

— Apenas alguns acidentes de treino, sabe como é... Ou talvez não, já que você é médico e não luta. — Kardia riu, provocando. Kaiser revirou os olhos e começou a enfaixar o braço do colega.

— Por que achou que Manigold teria algo a ver com minha irritação?

— Vi vocês juntos hoje. Ele pode ser irritante às vezes. Me surpreende que ainda sejam amigos. — Kardia fez uma careta de dor enquanto Kaiser terminava de cuidar do ferimento.

— Ele é irritante, sim, mas somos amigos. — Kaiser respondeu, cortando a faixa com os dentes e finalizando o curativo. — Pronto. O corte vai cicatrizar logo.

Kardia assentiu e se levantou, pronto para ir embora. — Vocês têm uma amizade bonita, só tentem ser mais discretos. — Ele sorriu antes de sair, deixando Kaiser boquiaberto.

Duas insinuações sobre sua amizade com Manigold no mesmo dia... Ele sacudiu a cabeça, tentando afastar os pensamentos, mas não teve tempo para refletir mais sobre o assunto, pois outro paciente chegou em estado grave.

Depois de um longo dia de trabalho, os feridos diminuíram. Kaiser guardou seus materiais e, exausto, caminhou em direção ao seu quarto. Ao passar pela porta de Serena, ouviu a mulher tossindo e conversando com uma das enfermeiras.

— Aquele moleque inútil esteve aqui esta manhã e me desrespeitou. Agora desapareceu de novo!

— Ele estava trabalhando, senhora... Quer que eu o chame?

— Não, não quero ver a cara daquele viadinho tão cedo.

Aquelas palavras perfuraram Kaiser como uma lâmina. Seus olhos arderam, mas ele se recusou a chorar. Ele virou-se e saiu da unidade médica, caminhando rapidamente para esfriar a cabeça. Assim que passou pela porta, deu de cara com Manigold, que segurou seu ombro.

— Kaiser! Está tudo bem? O que aconteceu? — O azulado o bombardeou com perguntas, mas Kaiser afastou a mão dele de seu ombro.

— Está tudo bem. Só trabalhei com os pacientes o dia todo. — Kaiser respondeu, sem detalhes, e continuou andando. Manigold arqueou uma sobrancelha e correu para o lado dele.

— Está na cara que aconteceu algo. Você é péssimo em esconder as coisas de mim.

— É só a Serena... Ela sempre me coloca para baixo. — Kaiser ocultou parte da verdade, omitindo as insinuações sobre sua amizade.

— Você deveria largar essa velha. Ela só te faz mal. Não sei como ainda fala com ela. — Manigold sugeriu com seriedade, enquanto Kaiser parou e se sentou em um degrau.

— Apesar de tudo, ela me criou e me trouxe até aqui... Não gosto muito dela, mas não há muito o que fazer... Não queria voltar lá hoje... — Kaiser suspirou.

Manigold pareceu refletir por um instante antes de sair correndo. Sem entender nada, Kaiser ficou ali sentado até que, minutos depois, Manigold voltou carregando alguns lençóis.

— Vamos! — Ele puxou Kaiser pela mão e o conduziu para o campo onde eles sempre iam para treinar e passar o tempo.

Ao chegarem, Manigold estendeu os lençóis no chão, preparando um lugar improvisado para dormir ao ar livre.

— O que está fazendo? — Kaiser perguntou, mesmo sem entender muito, abaixando-se para ajudar.

— Vamos acampar aqui, ao ar livre. Não quer voltar para o quarto hoje, certo? Então esta é sua melhor opção.

— E se algum bicho me morder? — Kaiser perguntou, mas Manigold apenas riu.

Ambos deitaram-se sobre o lençol, observando o céu estrelado em silêncio até que Kaiser decidiu falar.

— Já pensou em... terminar nossa amizade? Tipo, achou algo estranho entre a gente?

— Estranho? Como assim? — Manigold perguntou confuso.

— Não é nada, esquece. Coisa da minha cabeça. — Kaiser tentou desconversar.

— Nunca pensaria em deixar de ser seu amigo. Você é especial para mim. Tira essas bobagens da cabeça. — Manigold brincou, dando leves tapas na cabeça de Kaiser, fazendo-o rir.

Em silêncio, Manigold observou o amigo. Seus olhos percorreram o corpo de Kaiser, menos musculoso que o seu, mas ainda definido. Quando seus olhos chegaram aos lábios do moreno, uma sensação de calor percorreu seu corpo, e ele desviou o olhar rapidamente.

Com um sorriso, Manigold ajeitou uma mecha de cabelo de Kaiser atrás da orelha e, em pouco tempo, ambos adormeceram sob o céu estrelado.

𝐂𝐚𝐦𝐢𝐧𝐡𝐨𝐬 𝐄𝐧𝐭𝐫𝐞𝐥𝐚𝐜̧𝐚𝐝𝐨𝐬Onde histórias criam vida. Descubra agora