7 de dezembro de 2012
Paris, França.
Jennie Ruby JaneA neve descia lentamente sobre Paris, envolvendo a cidade em um véu branco que parecia apagar o mundo. Cada floco caía como uma lembrança que se desvanecia, e o som de seus passos, abafados pelo manto gelado, desaparecia no ar gélido. Jennie caminhava pela Rue de Vaugirard, com os pensamentos ainda pairando no Jardim de Luxemburgo, onde as sombras se prolongavam e o caderno que segurava parecia pulsar em suas mãos. A casa dos Ruby Jane surgiu à frente, com as luzes suaves escapando pelas janelas embaçadas, criando um contraste acolhedor com a escuridão lá fora.
Ao abrir a porta, foi recebida pelo calor do lar e pelo som do piano que vinha da sala de estar. Marie, sua mãe, tocava com delicadeza, e as notas ecoavam pela casa com uma melancolia familiar, carregada de uma tristeza que Jennie sempre sentira ali, mas nunca soubera nomear. Havia algo na maneira como as notas se desdobravam que parecia trazer à tona lembranças longínquas, como se cada melodia contivesse fragmentos de um tempo que se recusava a ser esquecido.
Jennie caminhou em direção ao piano, hesitando por um momento antes de se sentar ao lado de Marie no banco estreito. "Você sempre toca Debussy quando as coisas não estão bem," disse ela, com um sorriso triste, observando as mãos da mãe deslizarem suavemente sobre as teclas. "Parece que essa música sabe tudo o que não dizemos."
Marie parou de tocar e olhou para a filha, os olhos refletindo uma ternura inquieta. "A música guarda nossas histórias, Jennie," respondeu ela, com a voz baixa. "Ela captura o que não conseguimos expressar em palavras e, de alguma forma, nos ajuda a lembrar de quem somos." Havia uma profundidade em seu olhar que Jennie reconheceu imediatamente — o tipo de melancolia que se carrega sem saber como aliviar. Ela sentiu uma tristeza compartilhada, uma dor silenciosa que parecia acompanhar as duas, ainda que evitassem falar sobre isso.
Jennie desviou o olhar para o crepitar fraco da lareira, enquanto o som do piano ainda ressoava em sua mente. "Mãe," começou ela, com a voz hesitante, "você se lembra dos verões na casa de campo? Quando Rosé, Jisoo e eu passávamos o dia correndo no campo, procurando aventuras?"
Marie sorriu com um toque de nostalgia. "Como poderia esquecer?" disse ela, enquanto seus dedos se moviam levemente sobre uma tecla solta. "Vocês inventavam histórias sobre tesouros escondidos e reinos mágicos... E eu sempre ficava imaginando o que vocês realmente procuravam." A voz dela carregava uma doçura melancólica, como se aquelas memórias também fossem para ela uma espécie de refúgio.
"Eu nunca parei de procurar," murmurou Jennie, quase para si mesma, sentindo o peso daquelas palavras. O silêncio que se seguiu parecia carregar uma densidade insuportável, como se o espaço entre elas se enchesse de tudo o que ficara por dizer ao longo dos anos. Jennie levantou-se do banco com um movimento repentino, como se precisasse escapar daquele sentimento antes que ele se instalasse mais profundamente.
Ela subiu as escadas para o seu quarto, onde a quietude parecia mais intensa. Ao fechar a porta, sentiu-se envolta por uma solidão que não conseguia explicar, como se o mundo ao seu redor estivesse se distanciando lentamente. Os objetos no quarto, tão familiares, pareciam pertencer a outra vida. Jennie andou até a janela e olhou para o jardim coberto de neve, onde as sombras das árvores se alongavam no chão branco. Aquela visão trouxe de volta uma lembrança: ela, Rosé e Jisoo, há muitos anos, brincando na clareira escondida fora de Paris, um lugar que parecia existir em uma realidade à parte, onde o tempo não passava e as preocupações não podiam alcançá-las. Jennie se lembrou de um dia em particular, quando elas haviam encontrado um livro antigo, enterrado entre as raízes de uma árvore. As páginas estavam em branco, mas Jennie imaginou que fosse um diário de alguém que havia esquecido sua história.
Enquanto pensava naquilo, ouviu uma batida suave na porta, e George entrou, com um olhar sereno. "Jennie," chamou ele, com a voz sempre tão reconfortante. "Eu estava preocupado. Sua mãe me disse que você parecia distante."
Jennie sorriu levemente, mas havia uma tristeza em seus olhos que George não deixou de notar. "Eu estava lembrando dos verões na casa de campo," disse ela, sem rodeios. "Parece que tudo era mais simples naquela época."
George assentiu, caminhando até ela. "O tempo nos faz acreditar que a simplicidade ficou para trás, mas, às vezes, não é o tempo que muda as coisas, e sim a forma como olhamos para elas," respondeu ele, em um tom contemplativo. "Você sempre teve uma alma curiosa, Jennie. Sempre quis entender mais do que a superfície mostrava."
Jennie suspirou e olhou para o pai. "Você acha que isso é um problema? Essa sensação de que estou sempre buscando algo?"
George balançou a cabeça, colocando uma mão sobre o ombro dela. "A busca é parte de quem somos," disse ele. "E se você sente que há algo mais lá fora, talvez seja porque realmente há. Não significa que precise encontrar uma resposta, mas sim se permitir sentir a jornada."
As palavras do pai ressoaram profundamente em Jennie. Era como se ele a entendesse melhor do que ela mesma. Ela se voltou para a escrivaninha e pegou o caderno. "Estou tentando capturar o que sinto aqui," explicou, mostrando o caderno parcialmente preenchido com fragmentos de pensamentos e lembranças. "Mas parece que quanto mais escrevo, menos entendo."
George sorriu e passou a mão pelos cabelos dela, de forma carinhosa. "Talvez seja porque o que você está buscando não é algo que se compreende com a mente, mas com o coração," disse ele. "Continue escrevendo. Às vezes, as palavras nos levam a lugares onde o raciocínio não alcança."
Jennie voltou ao silêncio, pensando nas palavras do pai. Ela se sentou na cama, o caderno ainda em mãos, e começou a folhear as páginas, revivendo cada palavra que havia escrito. Algumas frases pareciam carregadas de uma verdade que ela ainda não conseguia entender completamente, mas havia uma sensação de que, se continuasse explorando, encontraria algo. Não necessariamente uma resposta, mas talvez um sentimento de paz que há muito lhe escapava.
De repente, o som do piano voltou a preencher a casa, e Jennie desceu até a sala, onde Marie havia retomado a melodia. Jennie se aproximou do piano e, sem dizer nada, se sentou ao lado da mãe. Começou a tocar uma melodia familiar, uma peça que aprendera quando era criança. As notas ecoavam pela casa com uma suavidade que parecia confortar tanto Marie quanto Jennie. Era como se a música fosse um fio invisível que as ligava, unindo suas dores e esperanças em um único movimento contínuo.
Enquanto tocavam, Jennie se sentiu conectada a uma parte de si que havia esquecido, algo que era parte de sua essência desde os verões passados na casa de campo. Quando a melodia terminou, ela olhou para a mãe com um olhar de compreensão silenciosa. "A música nunca realmente desaparece, não é?" sussurrou Jennie, sentindo uma leveza incomum em sua voz.
"Não," respondeu Marie, segurando a mão da filha. "Ela sempre estará aqui, para nos lembrar de quem somos."
Naquele instante, ela encontrou um fragmento de serenidade, uma luz tênue surgindo das sombras, como um eco distante. O que buscava não era um enigma a ser resolvido, mas um caminho a ser trilhado, onde cada passo reverberava com a melodia de sua alma aberta. Ela percebeu que, em vez de procurar respostas, deveria se permitir mergulhar nas águas turvas de sua própria existência, onde a beleza e a verdade se escondiam nas nuances do inesperado.
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Música tocada no piano pela Marie:
Clair de Lune, L. 32, Claude Debussy
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On the Last Day, Jenlisa
RomanceUma jovem, perdida na solidão, busca significado em sua existência. A verdadeira essência da vida. Amor e dor entrelaçam-se na fragilidade do adeus.