Capítulo 6: A Névoa Intransparente

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7 de dezembro de 2012
Paris, França.
Jennie Ruby Jane

O inverno avançava sobre Paris com a solenidade de um funeral antigo, cobrindo a cidade com um véu de neve e silêncio, como se o tempo estivesse em luto por algo que jamais seria recuperado. As ruas se estendiam em um emaranhado de sombras e luzes vacilantes, e o frio cortante transformava cada respiração em um sussurro visível que se dissipava no ar. Jennie caminhava sem pressa pelas calçadas geladas, sentindo o peso do céu nublado se acumular em seus ombros, como se a própria atmosfera estivesse comprimindo-a contra a terra. Havia uma opressão melancólica em cada detalhe ao seu redor, uma sensação de que algo se perdera muito antes de seu nascimento, e agora, no silêncio invernal, o eco daquela perda voltava para assombrá-la.

Desde o encontro na casa de Jisoo, uma inquietação silenciosa havia se alojado em sua alma, como uma semente enterrada profundamente, que brotava de forma imperceptível. As palavras de suas amigas ressoavam em sua mente como notas dispersas de uma melodia incompleta — a ideia de que as almas podiam se encontrar repetidamente, sempre à beira do reconhecimento, sempre buscando completar uma história que nunca fora totalmente escrita. Jennie sentia como se estivesse à deriva em meio a um oceano nebuloso, tentando discernir os contornos de uma verdade oculta que se escondia por trás do véu de suas memórias fragmentadas. O rosto da jovem no Jardim de Luxemburgo surgia em seus pensamentos como um espectro, trazendo consigo uma tristeza inexplicável e uma sensação de familiaridade que ela não podia ignorar.

Jennie deixou seus passos a conduzirem pelas ruas do Marais, onde vitrines decoradas com enfeites natalinos tentavam em vão conferir calor à paisagem desolada. As luzes cintilantes pareciam distantes e irreais, e o riso das pessoas que passavam soava abafado, como se viesse de outra dimensão. Ela se viu atraída para um antiquário que se erguia na esquina de uma rua estreita, uma loja apertada e repleta de objetos que pareciam ter sido esquecidos pelo tempo. Ao entrar, foi acolhida pelo cheiro de papel velho e madeira envelhecida, e pela visão de estantes abarrotadas de livros antigos, relógios parados e pinturas desbotadas. O lugar parecia um santuário dedicado ao passado, onde cada item contava uma história de eras que se perderam na poeira dos dias.

Enquanto caminhava entre as prateleiras repletas de volumes de capa de couro e manuscritos em pergaminho, Jennie sentiu uma estranha conexão com aquele ambiente, como se estivesse percorrendo os corredores de sua própria mente. Seus dedos roçaram a lombada de um livro que parecia deslocado entre os outros, e ao retirá-lo da estante, percebeu que se tratava de um caderno antigo, com capa de couro desbotada e cantos desgastados. Era semelhante ao caderno que a jovem do jardim carregava, e ao abri-lo, Jennie encontrou páginas quase vazias, onde apenas algumas frases soltas estavam rabiscadas, como se fossem ecos de pensamentos que nunca se completaram.

As palavras, embora desconexas, pareciam falar diretamente a ela, tocando uma parte de sua alma que sempre estivera adormecida. "E se nos encontrarmos de novo?" dizia uma das frases, o traço da caligrafia tremido e irregular, como se tivesse sido escrita por uma mão vacilante. "Será que reconheceremos o amor perdido, ou apenas a dor?" Aquelas palavras carregavam um peso imenso, ressoando na mente de Jennie como uma lembrança que ela não sabia de onde vinha. Sentiu-se assombrada por uma melancolia que não era sua, mas que, de alguma forma, habitava nela, como uma dor herdada, passada de uma vida à outra, até que a verdade finalmente emergisse.

Jennie saiu do antiquário com o caderno preso junto ao peito, sentindo o frio penetrar em seus ossos à medida que a neve caía lentamente, cobrindo as ruas com um manto branco. Ela caminhou em direção ao Jardim de Luxemburgo, como se uma força invisível a estivesse guiando para aquele lugar. O jardim estava quase vazio, os caminhos cobertos por uma fina camada de gelo que reluzia sob a luz dos postes. Jennie se aproximou da fonte onde avistara a jovem pela primeira vez e sentou-se no mesmo banco, sentindo o gelo atravessar suas roupas e se instalar em sua pele. Abriu o caderno com mãos trêmulas e decidiu escrever, como se colocar suas angústias em palavras pudesse dissipar ao menos parte do mistério que a consumia.

"Estamos perdidos," escreveu ela, com a tinta fluindo lentamente pela superfície do papel. "Mas talvez seja na própria busca que nos reencontremos, nos ecos de um amor que nunca morreu, apenas adormeceu nas dobras do tempo." Jennie parou para contemplar as palavras, o olhar fixo nas páginas abertas, enquanto o som distante de sinos ecoava pela névoa que envolvia o jardim. Era como se o tempo estivesse se dobrando sobre si mesmo, como se o presente e o passado se fundissem em um único instante, e Jennie se perguntava se aquele lugar já havia testemunhado essa cena antes, em uma vida que ela não podia recordar.

Enquanto Jennie permanecia ali, uma estranha sensação de déjà vu tomou conta de seu ser, uma certeza de que ela já havia estado naquele banco, naquela mesma postura, sentindo a mesma angústia, mas em um tempo diferente. A imagem da jovem voltou a surgir em sua mente, com o caderno de couro nos braços e os olhos distantes, como se guardasse segredos que Jennie precisava desvendar. Era uma presença que ela não podia afastar, uma sombra que parecia se esconder nas entrelinhas de suas memórias, esperando o momento certo para se revelar. Jennie se perguntou se as histórias de vidas passadas que Rosé mencionara tinham alguma verdade, se realmente havia algo além deste momento que conectava suas almas a um destino compartilhado.

A névoa se adensava, transformando o jardim em um labirinto de silhuetas vagas e vultos indistintos. Jennie fechou o caderno e olhou para o céu encoberto, sentindo o vento gelado que cortava a superfície da fonte e se enredava em seus cabelos. O frio parecia penetrar além da pele, alcançando o âmago de sua existência, como se tentasse apagar os últimos resquícios de calor. E então, sem saber por que, uma lembrança vaga lhe veio à mente — a visão de uma noite semelhante, em um lugar que não era Paris, onde ela havia se sentido igualmente perdida e igualmente determinada a encontrar respostas para um mistério que não sabia nomear.

Ela se perguntou se essa memória era sua ou de alguém que vivera antes dela, se a sensação de perda que a acompanhava era uma dor que vinha se acumulando através das gerações, passando de uma vida a outra, sempre à espera de ser redimida. Jennie não conseguia afastar a ideia de que, de algum modo, estava tentando corrigir um erro que havia sido cometido muito antes de sua existência, mas que a prendia como uma corrente invisível, impedindo-a de avançar. Ela desejou, por um instante, que a jovem do jardim surgisse da névoa e explicasse tudo, que lhe desse as respostas que tanto ansiava. Mas o jardim permaneceu vazio, e a única coisa que se movia era a neve que caía, lenta e silenciosamente, como as páginas de um livro que jamais seria lido.

Jennie se levantou, abraçando o caderno contra o peito uma vez mais, e começou a caminhar de volta para casa. Cada passo era um esforço para se afastar do mistério, mas também para carregar consigo um fragmento dele. Ela sentia que havia algo naquelas páginas em branco, uma promessa de que, de alguma forma, as respostas estavam ali, esperando para serem descobertas. Mas a cada tentativa de se aproximar, o mistério parecia se afastar ainda mais, como se estivesse brincando com ela, convidando-a a seguir em frente, mas nunca permitindo que chegasse ao fim.

Enquanto caminhava, Jennie percebeu que a busca por respostas era também uma busca por si mesma, por uma parte de sua alma que se havia perdido em algum ponto do caminho, e que agora ela precisava encontrar para se sentir inteira novamente. Não sabia o que estava à sua espera, mas uma coisa era certa: estava determinada a descobrir, mesmo que isso significasse percorrer as sombras de suas próprias vidas passadas, sempre um passo à frente do destino.

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On the Last Day, JenlisaOnde histórias criam vida. Descubra agora