Capítulo 2: A Primeira Consulta

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Após o castigo de Hakim, o palácio mergulhou em uma atmosfera sombria. A decisão do Sultão de punir o sábio deixou seus conselheiros apreensivos, mas ninguém ousava dizer uma palavra. O povo de Al Zubarah murmurava pelas ruas sobre a ira do Sultão, e as histórias de seu pesadelo se espalhavam como fogo em palha seca. Todos estavam cientes de que algo estava muito errado no reino.

O Sultão, porém, não conseguia mais suportar o peso de sua preocupação. Os dias passavam e ele continuava sem dentes, evitando o contato com a corte, e passava longas horas em seus aposentos, olhando para seu reflexo no espelho com uma mistura de descrença e frustração. Ele tentava esquecer a terrível interpretação de Hakim, mas aquelas palavras continuavam ecoando em sua mente: "Cada dente caído significa a perda de um parente querido." Será que realmente estava destinado a perder todos os que amava?

No entanto, algo muito mais inquietante começou a acontecer. Além de não conseguir reverter a perda dos dentes, o Sultão percebeu que seu turbante, aquele tradicional que sempre usava, parecia mais pesado do que o normal. No início, pensou ser apenas o resultado de seu estresse, mas, a cada dia, o peso na cabeça aumentava. Pior ainda: quando ele movia a cabeça, ouvia um som estranho, como se algo chacoalhasse dentro do turbante. Seria possível que seu turbante estivesse escondendo algum segredo? Ou aquilo seria mais um sinal de que sua sanidade estava começando a lhe escapar?

Num esforço de controlar a situação, o Sultão decidiu que precisava de uma segunda opinião. Ele não queria acreditar na previsão trágica de Hakim, então chamou outros sábios para consultá-los. No entanto, o medo havia se espalhado por todo o reino, e muitos dos sábios temiam enfrentar o Sultão depois do que havia acontecido a Hakim. Eles se recusavam a vir, alegando enfermidades repentinas ou que estivessem em longas viagens. Apenas um ousou responder ao chamado: o jovem conselheiro e astrólogo Kasim.

Kasim, embora jovem, era respeitado por sua habilidade de interpretar os sinais das estrelas e, especialmente, por seu jeito calmo e diplomático de lidar com situações delicadas. Sabia que essa consulta era arriscada, mas também compreendia que o Sultão estava perturbado e precisava de ajuda.

Quando Kasim chegou ao palácio, foi recebido por um ambiente de tensão. Os servos sussurravam nos corredores, e o silêncio parecia pesar no ar. Kasim foi levado diretamente à sala do trono, onde o Sultão o esperava. Amim Ali Aziz estava sentado em sua imponente cadeira de ouro, com o olhar sombrio e o turbante grande e desajeitado cobrindo sua cabeça. Ele mantinha uma postura rígida, mas era óbvio que seu orgulho estava abalado.

— Kasim, é bom que tenha vindo — disse o Sultão, sem muita cerimônia. — Preciso de respostas. Algo muito errado está acontecendo comigo. Já lhe contaram sobre meus sonhos? Sobre meus dentes?

Kasim fez uma leve reverência antes de falar.

— Sim, ó Sultão, ouvi rumores, mas prefiro ouvir de sua própria boca. Conte-me sobre esses pesadelos que lhe afligem.

O Sultão então relatou, em detalhes, o tormento das últimas semanas: os pesadelos constantes, a perda dos dentes e, agora, o mistério do turbante pesado e do som estranho que ele produzia ao movimentar a cabeça. A cada palavra, Kasim prestava atenção, com um olhar concentrado e sereno. Quando o Sultão terminou, Kasim permaneceu em silêncio por um momento, ponderando.

— Majestade — começou ele, escolhendo suas palavras com cuidado —, sonhos como o que descreveu podem, de fato, ser presságios. Mas não são sempre sinais de morte ou tragédia. Existem muitas maneiras de interpretar o que aconteceu, e talvez Hakim tenha sido rápido demais em chegar a uma conclusão tão sombria.

Os olhos do Sultão, que antes estavam cheios de raiva e desconfiança, suavizaram por um instante.

— Então você acha que ele estava errado? Que não estou condenado a perder minha família?

Kasim hesitou, medindo suas palavras.

— Não posso dizer com certeza, ó grande Sultão. Mas acredito que há outra possibilidade. Os dentes, no mundo dos sonhos, podem representar mais do que pessoas. Eles também são símbolos de poder, de confiança, de identidade. O fato de seus dentes estarem caindo pode indicar que algo está mudando em sua vida — algo profundo, algo que afeta quem você é como líder e governante.

Essa nova interpretação parecia fazer sentido ao Sultão. Ele sempre se orgulhara de ser um governante forte e resoluto, mas, nos últimos tempos, sentia-se vulnerável e desconcertado. A perda de seus dentes, ao invés de representar a morte de seus entes queridos, poderia estar refletindo uma perda de controle? Uma dúvida sobre sua própria capacidade de continuar sendo o governante poderoso de sempre?

No entanto, Kasim sabia que isso ainda não explicava o mistério do turbante. O sábio olhou para o volumoso acessório na cabeça do Sultão e perguntou:

— E quanto ao turbante? Posso dar uma olhada mais de perto?

O Sultão hesitou. Algo no turbante o inquietava, mas ele não sabia explicar o quê.

— Este turbante... não sai da minha cabeça. Por mais que tente, ele parece colado, e quando movo a cabeça, sinto algo chacoalhando lá dentro. — O Sultão estava claramente incomodado. — Não tenho certeza do que há dentro, mas temo o pior.

Kasim se aproximou lentamente, mantendo a calma e a compostura. Sabia que precisava ser cuidadoso ao lidar com a inquietação do Sultão. Ele examinou o turbante à distância, tentando entender se havia algum sinal visível de magia ou qualquer outro fenômeno estranho. Sentia que algo estava fora do comum, mas não sabia ainda o quê.

— Pode ser que esse turbante carregue algum segredo — disse Kasim. — Talvez haja algo escondido nele que Vossa Alteza ainda não percebeu. Eu sugiro, Majestade, que procuremos alguém especializado em objetos místicos. Pode haver mais nesse turbante do que imaginamos.

O Sultão, ainda desconfiado, ponderou por um momento antes de concordar.

— Mande chamar o maior sábio da capital, Doha. Se alguém puder me dar respostas definitivas, será ele.

E assim, com essa decisão, o Sultão despachou mensageiros para Doha, buscando a ajuda do renomado sábio que vivia na grande capital. Enquanto aguardava, Amim Ali Aziz não pôde evitar pensar: estaria o destino jogando algum tipo de jogo cruel com ele? Ou haveria realmente um segredo oculto dentro de seu turbante, que poderia lhe trazer a resposta para todos esses mistérios?

O Segredo do Turbante do SultãoOnde histórias criam vida. Descubra agora