06• AUTOPUNIÇÃO

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Red Blossom

Um barulho de garrafas sendo colocadas lentamente em sacolas quebrou o silêncio, arrancando-me de um sono inquieto e me fazendo dar um pequeno pulo do sofá, ainda meio zonzo. O gosto amargo da cerveja de ontem à noite ainda estava impregnado na minha boca, como um lembrete de mais uma noite afogada no mesmo ciclo miserável. Pisquei, tentando focar minha visão turva, e vi minha mãe, agachada, recolhendo as garrafas vazias que eu tinha secado.

Ela fazia tudo de forma cuidadosa, mas seu olhar dizia mais do que qualquer palavra. Era um misto de pena e raiva, como se ela não soubesse qual sentimento deveria prevalecer. Meu estômago embrulhou, e a dor latejante na cabeça não ajudava em nada.

- Fala o que tem pra falar, mãe. - Minha voz saiu rouca, carregada de irritação, enquanto eu me levantava cambaleando.

Ela largou a sacola no chão com um cuidado exagerado, como se estivesse tentando mascarar o caos interno que transparecia no tremor de suas mãos. Respirou fundo antes de me encarar.

- Filho, eu não suporto te ver assim. - A voz dela era suave, mas cheia de dor. Seus olhos brilhavam com uma mágoa que parecia corroê-la por dentro. - Eu errei. Não é sua culpa.

Encostei no encosto do sofá, olhando para o teto. A confissão dela era um punhal no peito. Ela tinha errado, de fato, mas culpar minha mãe agora parecia cruel. Ainda assim, as memórias voltaram como uma tempestade, me puxando para aquele maldito abismo que parecia não ter fim.

- Mãe, não quero falar sobre isso! - Suspirei profundamente, tentando controlar o peso esmagador na minha mente. - Não precisa se culpar. Você já tenta melhorar todos os dias.

E era verdade. Desde que a mãe da Clary tinha... acabado com tudo por causa da traição, minha mãe não era mais a mesma. Ela se escondeu do mundo por meses, se afogando em um mar de arrependimento. Foi o que a levou a tentar "se redimir", ajudando os outros, mas nada disso apagava o passado.

- Red... você está sofrendo.

A voz dela me trouxe de volta. Olhei para ela, e seu olhar insistente me irritava ainda mais.

- Mãe, eu sei, tá? - Apertei a ponte do nariz, frustrado com a conversa. - Mas não dá pra mim também. Não dá. Eu nunca tinha sentido nada disso antes! Não é culpa, é...

Minha garganta fechou, tornando impossível terminar a frase. Porra, eu sou um desastre falando sobre sentimentos, principalmente com a minha mãe, e preferia que continuasse assim.

- Para de beber e tenta fazer algo novo. Se ela te ama, ela vai te perdoar. Afinal, você não teve culpa. A culpa é apenas minha e de...

- Não fala o nome dele! - Meu tom saiu mais agressivo do que eu pretendia, mas dane-se. Só de ouvir a menção daquele desgraçado, minha pele queimava. - Eu não me importo com quem é o culpado. O que me importa é quem se machucou com isso tudo.

E Clary tinha se machucado mais do que qualquer pessoa deveria suportar. Cada vez que eu pensava no que ela passou por minha causa, sentia como se estivesse sendo esmagado. Ela era boa demais para esse mundo, boa demais para mim, e eu tinha ajudado a destruir isso.

- Mas faz ela te ouvir. Tenho certeza de que ela vai entender.

- Eu já tentei! - Gritei, minha paciência se esvaindo como areia entre os dedos. - E ela não quer me ver! Na verdade, quando ela me olha, tudo o que vejo é mágoa e dor, e eu não suporto isso nos olhos dela.

Saí em direção à cozinha, incapaz de continuar com aquela conversa. Thor estava encostado perto da geladeira, como se sentisse minha angústia. Fazia tempo que eu não saía com ele. Fazia tempo que eu não fazia qualquer coisa que não envolvesse afogar minhas memórias em álcool ou cigarros.

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