Clary miller
A tempestade parecia inevitável. O céu estava carregado, e as nuvens escuras anunciavam que a chuva era apenas uma questão de tempo. Não me incomodava a chuva, mas os trovões sempre me causaram medo. Meu peito apertou ao lembrar da noite em que fui para a casa de Red. As gêmeas tinham quebrado o abajur, e eu estava sozinha, vulnerável. Naquela época, ele ainda não era "meu", mas foi a única pessoa que me deu um refúgio. Eu sinto falta disso. Daquela sensação de estar segura, de alguém que escuta até o silêncio.
Suspirei, afastando os pensamentos. Não era hora de fraquejar. Voltei a organizar os papéis que Gabriela havia deixado sobre a mesa: relatórios de pedidos e ajustes para o estoque. Trabalhar, estudar, dançar. Era nisso que eu precisava focar. Gostava da Clary que estava me tornando, e nada - nem ninguém - me faria voltar a ser quem eu era antes.
O som do sino da porta soou, interrompendo meus pensamentos. Levantei o olhar, e o ar pareceu congelar nos meus pulmões. Melissa.
Ela estava ali, parada, tão deslocada quanto uma sombra em plena luz. Seu olhar misturava vergonha e tristeza, mas havia algo mais profundo, algo que eu não queria entender. Tudo dentro de mim gritou para recuar, para fugir, mas meu corpo ficou petrificado.
A raiva veio como uma onda, subindo por meu peito e explodindo antes que eu pudesse contê-la.
- Não. Não! - Minha voz saiu embargada, quase sem acreditar no que via. - Vá embora!
Ela hesitou, seus olhos caindo por um instante, mas logo voltou a me encarar com uma determinação que parecia desafiadora.
- Clary, eu preciso que você me escute.
Levantei-me de um salto, batendo as mãos na mesa com força. A dor da lembrança tomou conta de mim, misturando-se com a indignação.
- Eu não quero ouvir nada que você tenha a dizer! - gritei, sentindo a garganta queimar. - Quero que você, seu filho e meu pai desapareçam da minha vida! Vocês três já destruíram tudo.
Melissa avançou, rompendo a distância entre nós, até ficar do outro lado da mesa. Seu movimento foi tão rápido que não tive tempo de reagir antes que suas mãos agarrassem meus pulsos.
- Me solta! - gritei, minha voz trêmula, mas ela não cedeu.
- Não! - Ela ergueu a voz, e pela primeira vez parecia tão descontrolada quanto eu. - Você vai me ouvir, quer queira ou não!
O toque dela me fez estremecer. Meu corpo recuava instintivamente, mas a força com que ela me segurava era maior que o meu impulso de fuga.
- Eu estou cansada de ver você culpar o Red por tudo isso - ela continuou, sua voz oscilando entre raiva e dor. - Você não faz ideia do que ele passou. Ele pode errar, mas ele te ama, Clary. Ele te ama de um jeito que ninguém nunca vai amar.
As palavras dela eram como golpes. Eu não queria ouvi-las, mas elas entravam, violentas, dolorosas.
- Ele te ama mais do que ele mesmo entende! - continuou Melissa, o desespero tomando conta de sua voz. - E você não faz ideia do que é vê-lo assim. Nem mesmo quando ele agrediu o pai e se sentiu culpado, ele chegou ao ponto em que está agora.
- Eu não quero ouvir! - gritei, mas minha voz já estava embargada. As lágrimas queimavam nos meus olhos, prontas para cair.
Melissa respirou fundo, mas não me soltou.
- Eu errei. Sei disso. Não vou me justificar, mas, quando me envolvi com seu pai, foi por desespero. Ele me ajudava, me salvava de uma vida onde eu só via dor, onde meu filho era maltratado.
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LIBERTADOS
RomanceDepois de descobrir toda a verdade que estava escondida em sua vida, Clary sente como se o chão tivesse sido arrancado debaixo de seus pés. A traição e a mentira a esmagam, corroendo suas esperanças e deixando cicatrizes profundas. Mas, por mais que...