A mulher com cabelos cacheados voltou ao balcão e, pela primeira vez, bebeu todo o conteúdo da taça, buscando coragem no fundo que não encontrou, mas que a impulsionou a subir as escadas. Em sua mente, ela estava indo rápido, mas seus passos estavam mais lentos do que a música ambiente.Quando seus pés finalmente tocaram o último degrau e ela estava no segundo andar, seus olhos fecharam e abriram várias vezes,adaptando-se à pouca iluminação do lugar. A pouca luz não a impediu de ver Carmilla encostada em uma porta semiaberta, com um sorriso vitorioso no rosto. Carmilla se virou e entrou na sala, e Amora a seguiu.
No mundo animal, o cervo não ia atrás da onça nem se curvava, esperando o fim. Ele lutava pela vida, corria, não se rendia tão facilmente. Não era apenas um olhar — mas Amora era diferente, e essa comparação não servia para ela. Um cervo também não ficava nas sombras, observando a onça,tentando decifrá-la à distância. Amora não era uma presa comum; ela não buscava fugir ou lutar, mas entender o que a atraía para aquele perigo, para aqueles olhos que a encaravam como se já soubessem o desfecho de tudo.
Mas, pela primeira vez, Amora se sentia a caça. Não era ela quem observava das sombras, aguardando um momento de aproximação; agora, era o olhar de Carmilla que a prendia, que traçava cada passo seu com a precisão de um predador experiente. Amora sentia o peso de ser o foco daquela atenção intensa e controladora, algo que nunca imaginou experimentar tão profundamente. O frio na espinha era uma mistura de medo e excitação, um jogo invertido onde as regras não estavam claras, mas que a puxava irresistivelmente para frente.
Assim que passou pela mesma porta que Carmilla, a escuridão se tornou completa.Foram cinco passos do lado de fora e mais três dentro da sala, e Amora sentiu o corpo roçar contra tecidos enquanto avançava. Ela estendeu a mão, agarrando firmemente um dos panos, tentando entender de onde estavam vindo, já que não conseguia mais ver nada.Era uma sala de lençóis.Pendurados e suspensos, os lençóis criavam um labirinto suave e abafado,como se o ar ficasse mais pesado a cada movimento. O toque do tecido contra sua pele era quase fantasmagórico, e o silêncio,interrompido apenas por sua respiração e o leve farfalhar dos panos, tornava tudo ainda mais claustrofóbico. Amora tentou se orientar, mas o espaço parecia sem forma, como se cada passo a levasse mais fundo na escuridão.
Os dedos de Carmilla passaram pela nuca de Amora, tocando-a contra o tecido, o que a fez arrepiar de imediato. O susto foi automático, e ela deu alguns passos para trás, tentando se afastar da sensação inesperada. A pergunta surgiu em sua mente: "Como não ouço as botas?" Foi só dar mais alguns passos que ela sentiu algo duro e frio sob seus pés. Ela descobriu que era uma bota caída no chão, uma das botas de Carmilla.O reconhecimento da bota, um item tão familiar e marcante, aumentou ainda mais o desconforto de Amora, realçando a sensação de estar completamente fora de controle naquela sala escura e cheia de lençóis.
O desconforto era ao mesmo tempo intenso e excitante. O toque inesperado na nuca de Amora havia sido um choque, uma sensação tão íntima quanto perturbadora.O contato havia deixado uma marca, um lembrete palpável do poder de Carmilla e da proximidade perigosa entre elas.Amora,apesar do susto e do medo, não podia negar a eletricidade no ar, o fascínio que aquele momento provocava. O jogo de luz e sombra na sala de lençóis, o cheiro dos tecidos e o toque dos dedos de Carmilla criavam uma tensão que era tão perturbadora quanto sedutora.A sensação de estar caçando e sendo caçada ao mesmo tempo, de se sentir ao mesmo tempo vulnerável e desejada, era algo que Amora nunca havia experimentado antes
YOU ARE READING
Lábios e Pecados
Short StoryAqui você vai encontrar uma coleção de contos que mergulham fundo no desejo, na ousadia e nos limites do prazer. São histórias onde a intimidade é explorada sem medo, onde o poder e a entrega se cruzam em jogos de submissão e controle. Aqui, o praze...