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O fim de semana parecera eterno. A noite de domingo parecia não querer se desapegar do mundo. Louis girava em sua cama, sentindo ataques alternados de calor e ansiedade repentinos.

As conversas que tivera com H.S durante o fim de semana ecoavam em sua mente toda hora, mais do que antes. Ele estava sendo precipitado em pensar que talvez pudesse realmente ser amigo de H.S em algum momento? Estava, não estava? H.S era uma pessoa doente que fizera nada senão perturbar a vida de Louis desde que o ano escolar começara, aquela conversa emocional não significara nada. Louis ter dito que confiava em H.S não significara nada. Ele só estava emocional demais para recorrer a outra pessoa naquele momento, não se repetiria.

Mas assim que saiu do banho, - e tentou, ainda sem sucesso, a arrumar um novo penteado - Louis foi desanimado tomar café. Seu pai tinha passado a noite em casa, mas ele e Louis não trocaram uma única palavra. Sua mãe, tentara, algumas vezes, começar um diálogo, que nunca rendia resultados satisfatórios. Agora, seu pai dormia na cama de casal em seu quarto, e Louis não podia negar que ele parecia estar muito cansado.

Em outras circunstâncias, o garoto teria ficado muito feliz de ter o pai passando algumas noites em casa, com eles. Mas não nessa.

Durante o café da manhã e o caminho todo até a escola, sua mãe tentara arrancar alguma coisa de Louis sobre seu pai, mas o garoto insistia em manter a boca fechada. Parecia o oposto do dia anterior. No entanto, essa não fora uma missão muito difícil para Louis, que tinha sua mente completamente focada em descobrir a identidade de H.S, que talvez começaria o jogo naquele dia.

Quando o garoto chegou em sua sala e não encontrou ninguém sentado em sua cadeira, sentiu uma pontada de alívio o atingir. Sentando-se na cadeira, ele encarou a parede, em busca de uma mensagem nova. E lá estava ela:

'Onde fogo e água misturam-se em uma triste solução impossível.'

1 nova mensagem: H.S: dica boba essa não? Relaxa, nós mal começamos.

Louis gelou. Ele conhecia aquilo. Era de um texto que ele escrevera uns dois anos antes, para a aula de redação, e era, na sua opinião, um dos melhores que ele já havia escrito na sua vida -ele tinha até ganhado o concurso municipal de produção de textos com aquele. Ele falava do encontro do sol com o mar no horizonte, uma mistura tão linda, mas ainda assim, tão impossível.

Aquilo era uma dica de como encontrar H.S? Louis perguntou incessantemente sobre como a pessoa conseguira aquele texto. Mas, se fosse uma dica, só poderia ser de um lugar.

***

Assim que o sinal de fim de aula tocou, Louis juntou seu material rapidamente, jogando a mochila sobre o ombro direito; fazendo-a cair pesadamente sobre suas costas e desceu as escadas mais rápido do que nunca, atraindo alguns olhares curiosos. Ele nunca estava animado pra nada, então a ansiedade que sentia naquele momento o causava arrepios por todo o corpo.

Se não fosse a fome que ele sentia no momento, que fazia seu estômago roncar grotescamente, ainda mais juntando-se ao nervosismo corriqueiro, Louis teria ido ao encontro de H.S naquele momento. Mas precisava ir comer antes, e talvez inventar alguma explicação do porquê de estar saindo de casa novamente em uma segunda-feira; mas duvidava que o pai fosse se importar se ele ficasse em casa ou não.

Estaria H.S realmente o esperando? Ou seria aquilo tudo uma pegadinha cruel e quando ele chegasse no lugar, seus colegas de classe e seus pais fossem estar lá, rindo e apontando?

Mas ele tinha que ir, não tinha? Ele não podia desistir. Não naquele momento. Não depois de tudo. Ele queria descobrir quem H.S era. Como H.S era.

Mas do que simplesmente 'queria'. Louis precisava descobrir quem H.S era.

***
Seu pai não estava dormindo quando Louis chegou em casa, como ele esperara.

Ele estava sentado em uma das cadeiras da mesa da cozinha. Nela havia dois pratos, talheres pra dois, dois copos, uma cesta com iscas de peixe fritas e outra com batatas fritas, além de uma travessa com salada e torradas. Troy soltou um sorriso tímido e rápido para Louis quando o garoto entrou em casa, confuso, mas logo olhou para baixo quando percebeu a expressão severa do filho.

Ele estava tentando pedir desculpa. Com comida. Era isso. Louis estava boquiaberto. Seu pai estava tentando conseguir seu perdão com comida. Louis sentiu um aperto forte no coração. Angústia? Culpa? Remorso? Antes, Louis daria tudo para almoçar com o pai, ainda mais algo que não fosse comida de hotel. Agora ele tinha aquilo, mas era válido? Nessa situação, era válido?

"Oi, Lou." O homem cumprimentou, baixo. "Como foi a aula?"

"Oi. Normal." Louis foi até o quarto, soltando a mochila na cama, lavou a mão no banheiro e voltou para a cozinha, esperando que o almoço ocorresse em silêncio. Ele conversaria com o pai quando a tensão do momento tivesse passado.

"Eu fiz peixe e chips para você. E até coloquei as torradinhas na salada. Eu sei que você gosta." Louis sorriu, era assim que ele imaginava agir no futuro quando tivesse uma briga no casamento. Ver seu pai assim era irônico. "Eu juro que eu vou cozinhar todo dia agora, Lou, até conseguir outro emprego e as coisas se resolverem, eu juro que..."

"Pai." Louis cortou, engolindo uma batata frita. "Relaxa, okay? Ta tudo bem, não se preocupa. Eu sempre me virei bem, eu posso continuar."

"Não, filho. Não está tudo bem." Seu pai não tinha comido nada, seu prato estava intocado. "Eu sei que você ainda está nervoso e ainda sente falta de Zayn, por isso que..."

"Eu não acredito." Louis soltou os talheres que atingiram a mesa com um baque alto. "Que que Zayn tem a ver com isso? Com seu vício na bebida? Com sua falta de presença aqui em casa? Com a sua falta de ajuda aqui? O que meu melhor amigo tem a ver com isso? Francamente..." Louis engoliu um copo de água de uma vez, e foi para o quarto, trancando a porta. Não tinha mais apetite.

Escutou seu pai ir até a porta do quarto do filho e bater algumas vezes, mas foi ignorado em todas.

Louis tinha superado Zayn, não tinha? Não. Ele não tinha. Dois anos depois e ele ainda não entendia.

Ele tinha escrito o texto fazia dois anos. A emoção que ele sentia passou pro papel como nunca tinha acontecido antes. Ele contou como a mistura dele com Zayn era bela mas tristemente impossível. Mas ele sabia que ninguém senão ele e Zayn entenderia o texto realmente.

Ele tinha mostrado o texto a Zayn.

Zayn tinha se matado na noite seguinte.

Ele não entendia porque ele tinha feito aquilo.

Louis soluçou. Doía. Muito. De um jeito que eles não entenderiam. Ele não se preocupou em secar as lágrimas.

Para os outros, o texto falava do encontro do céu e o mar no horizonte. A vista que se tinha na praça da represa, ponto turístico da cidade.

Ainda com a visão turva, Louis pulou a janela e buscou a bicicleta que estava encostada no corredor do quintal a muito tempo.

Ele iria encontrar H.S, e ele faria isso naquele momento.

Talking to Walls >>lsOnde histórias criam vida. Descubra agora