... abri a gaveta e parecia que ela estava dormindo e não morta de fato, incrivelmente o rosto não estava totalmente deteriorado, mas estava numa câmara fria sinistra, cheia de ataduras e outros afins, uma etiqueta grande nos pés com uma anotação "Alexia G., aguardando familiares ligarem, já avisados" .
Arranquei rapidamente a etiqueta antes que Lex desse conta e notei que ela estava levemente entristecida por ver seu corpo, andava devagar entorno da gente olhando a habilidade da Charlote em manusear as pinças e pequenos pincéis da maleta de maquiagem.
- Art me dá uma ajudinha aqui? Vamos trocá-la antes de maquiar pra não borrar? - disse ela muito empolgada e dando ordens, segurando a parte superior do corpo de Lex sentada.
A cena era intrigante, nós dois vivos cercados de fantasmas, dentro da sala gelada e cheia de gavetas, maquiando e trocando uma patricinha pro seu casamento, sem esquecer de mencionar que ela estava morta também.
- Ahhhhhhh pode ir parando aí, esse trapinho que colocaram em mim tá aberto atrás e não quero que o Arthur veja o que não deve... - foi falando Lex enquanto tentava me puxar pra fora do local.
- Mas preciso dele Lex, sou pequena e seu corpo está pesado - retrucou Charlote, me puxando pra perto.
- Ainda me chama de gorda?
- Não Lex, é que você tá morta querida e o corpo fica pesado, tenta entender, sem o Art não consigo colocar seu vestido... quer casar de trapinho? - completou Charlote, colocando Lex numa decisão difícil.
- Tudo bem Arthur Jasen, mas se olhar meu bumbum vou socar sua cara e sabe que eu consigo fazer isso!!! - irritou-se e caminhou pra longe de nós em direção à porta.
Mario e dona Iolanda, a senhorinha, observavam nossa maluquice e se aproximaram de Lex, olhando como ela era linda, até que o silêncio foi quebrado
- Olha querida, admiro seu amigo, esse rapaz vivo, está arriscando muito vindo aqui, mudando a roupa do seu corpo, maquiando você, cuidando de você... ele é uma pessoa muito iluminada apesar do dom tão sombrio - disse dona Iolanda enquanto puxava Lex pra longe das paredes.
- Não fica perto das paredes branquela, é problema, os vultos lá fora, podem te puxar, mas calma que já já amanhece - completou Mario entrando na frente da fantasma tagarela, agora completamente muda.
O tempo passou e nem notamos, corremos contra ele a noite inteira, o faxineiro não nos olhou nenhum segundo, Mario e dona Iolanda fizeram companhia pra Lex e não demorou pra que o sol apontasse nas colinas, atrás da estrada de Salton. Mas um grito arrepiou a todos...
- Olha esses bichos!!! - Lex estava arrepiada e tentando esconder o rosto em dona Iolanda
- Calma Lex - falei chegando rapidamente - não fica com medo, você estava lá fora até agora e não te aconteceu nada, vamos seguir o plano, está clareando e duvido que isso ficará aí muito mais...
Eram enormes figuras, pairando e não tinham a parte debaixo do corpo ou seja lá o que é aquilo, uma espécie de tecido preto apenas sobre eles e as cabeças eram apenas o formato, com orifícios no lugar dos olhos e narinas, mas sem bocas, as mãos eram finas e a pele era estranha, com um aspecto de cera, parafina ou algo assim, estavam parados como se olhassem pra nós, e podia escutar um sussurro parecido com lamentos, choro e gritos, mas muito ao longe, quando senti que havia uns três ou quatro daqueles seres bem a frente do vidro. Lex escondida com dona Iolanda, Mario ao lado inerte e Charlote repousando o corpo de Lex, quase completo, faltando apenas um detalhe pra irmos embora... o faxineiro estava caminhando em direção ao relógio de ponto, quando dei um passo pra esconder-me do campo de visão e pude ter certeza; aquelas coisas estavam olhando pra mim!
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As Memórias de um Necromante
UmorismoArthur é um necromante, nasceu com um dom de falar com gente morta. Assim como as pessoas vivas, elas têm problemas mal resolvidos... Sua vida pessoal vira de cabeça pra baixo sempre que ele tenta ajudá-las com isso, buscando um pouco de paz. Não é...