Anastácio vagueava pela casa, certamente nervoso pelo sucedido. Era um jovem que como muitos outros, não se imaginara em tempo algum sem um pai. <<O que sentirão todos estes filhos?>>, pensava. <<De que vale tudo agora para eles?>>.
No quarto azul estava agora o filho que anteriormente tivera uma enorme crise de mágoa e a pessoa que lhe auxiliara nesse tal momento. É verdade, caro leitor, que não me atrevi até agora a falar dessa mesma pessoa, porém fá-lo-ei agora mesmo. Tratava-se de uma colega de turma desse mesmo rapaz. Ela que assistira a tantas atrocidades ao qual aquele colega era exposto sentiu necessidade de estar ali presente naquele momento. Observava a paz do descanso e comparava-o ao horror que vira anteriormente no rosto do seu colega. <<Como é difícil tudo isto!>>.
Os olhos verdes daquela jovem soltaram uma lágrima pelo seu rosto. Retirou do bolso das suas calças à boca de sino um lenço com o qual recolheu o que os seus olhos expulsaram. Voltou a guardar o lenço e, sem pretender interromper o sono do seu colega, levantou-se da cadeira e dirigiu-se para a porta. Olhou novamente para a paz daquele perfil, deu um último passo e fechou a porta. Não resistiu em parar um pouco olhando para aquela porta. Soltou um suspiro e logo ganhou coragem para se voltar de novo para a escuridão daquela casa. Seguiu pelo corredor e procurou pela Dona Luzia para se despedir. Avistou-a perto da porta do quarto do falecido. Ia a dirigir-se para lá quando viu o Senhor Cedra, a Dona Cedraz e por consequência Anastácio Cedraz. Anastácio ficou estático observando-a. Algo o surpreendeu na presença da sua antiga colega naquela casa. Preparou-se para lhe dizer algo mas desistiu. Não era de todo o momento mais propício. Olhou para o chão e assim permaneceu por tempo indefinido.
Dona Luzia agradecera a presença daquela menina, cumprimentou-a e referiu que o funeral seria no dia seguinte pelas 10 da manhã caso fizesse tenção de estar presente. A menina fez um sinal de afirmação com a sua cabeça e, entristecida, abandonou a casa. Olhou novamente, antes dos últimos passos, para Anastácio detetando uma vergonha como nunca houvera reconhecido naquele rapaz.
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Maus Hábitos
Romance"Maus Hábitos" de André Moreira Numa das pequenas aldeias portuguesas onde tudo se fala e comenta, constroem-se ideias, mitos, famílias e pequenos génios. Numa família tradicional constroem-se relações, vivências, respeito, crenças e inconveniência...