Capítulo Dois

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- Luana... O que foi que você fez?

Cecília olhava da televisão para mim como se não pudesse acreditar no que tinha acabado de acontecer. Para crédito dela, eu também não conseguiria. Acreditar, eu quero dizer. Em um minuto, eu mirava na cabeça do safado do Gabriel. No outro, o jarro de flores se espatifava com força no ostensivo monitor de tela plana - que, pelo visto, era uma aquisição nova dos meus pais.

A culpa pelo estrago estava me corroendo por dentro... Só que a raiva ainda não tinha ido embora. Pelo o contrário, ela crescia cada vez mais. Afinal, se não fosse pelo babaca parado à minha frente, nada disto teria acontecido. E ele continuava lá, no meio da minha sala, com o zíper de seu jeans aberto e a camiseta presa aos ombros - me encarando com aqueles malditos olhões azuis, como se eu fosse uma doida de pedra qualquer.

- Viu só o que você me fez fazer? - Eu gritei, sentindo todo o meu corpo tremer de frustração.

- O que eu te fiz fazer?! - Gabriel retrucou, apontando para a televisão - Não me lembro em qual momento eu pedi para que uma maluca tentasse arremessar a porra de um enfeite de mesa na minha cara!

Eu estava prestes a pegar a minha mochila de lona e usá-la como uma arma quando Cecília se colocou entre nós dois, as mãos estendidas em um gesto apaziguador.

- Será que os dois podem parar com isto? Tipo, agora?!

Tanto o rapaz semi-nu quanto eu prendemos uma longa respiração e olhamos para ela. Pois, de todas as coisas absurdas que poderiam ter acontecido nas últimas horas, ser repreendida pela a minha irmã mais nova era uma das mais ridículas. Mas o caso era que, sim, eu sabia que estava sendo extremamente infantil. Entretanto, meu lado irritadiço não queria ser o primeiro a ceder, ainda mais depois de entrar em casa e ver a minha caçula praticamente de pernas abertas para o insuportável do Beruna. Por isso, nós dois nos encaramos de forma expressiva por mais um longo minuto, como dois adversários no centro de um ringue de boxe - até que meneamos a cabeça em concordância, iguais a duas crianças levando um carão da professora do Jardim de Infância.

- Acho que é melhor eu ir para casa agora - Gabriel murmurou, pegando suas botinas do chão e dando um longo beijo de estilo desentupidor de pia na minha irmã (no que eu considerei uma provocação mais do que óbvia para mim).

- Eu falo com você mais tarde, ok? - ela respondeu, levando o rapaz até a entrada do apartamento e fechando a porta assim que ele passou.

Quando ouvi o clique da fechadura, me deixei cair sobre o sofá mais próximo e levei as mãos ao rosto, me sentindo esgotada. Eu estava completa e irrevogavelmente ferrada - em todos os sentidos da minha vida. Assim que os meus velhos entrassem em casa e vissem a televisão pifada, iria começar a Terceira Guerra Mundial. E eu nem queria imaginar o que poderia acontecer.

- Por favor - suspirei pesadamente entre os dedos, sentindo cada pedaço do meu corpo protestar de cansaço - Me diga que o aparelho ainda está na garantia...

- Ironicamente, sim - disse Cissa, indo pegar a pá e a vassoura para recolher o estrago que eu fiz na nossa sala - Mas o que vamos dizer para os nossos pais? Uma televisão não explode do nada!

- Sei lá... Estamos no Rio. Vamos dizer que foi uma bala perdida.

Na mesma hora, minha irmã parou de varrer o chão e me olhou de forma incisiva.

- Era para ser engraçado?

- Me desculpe. Esqueci como os cariocas são sensíveis com este tipo de piada...

- Ah, claro - ela balançou a cabeça, como se não pudesse acreditar em mim - Não percebi que dois anos em São Paulo tinham mudado a sua naturalidade.

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