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| Emma Davis

Hoje o sol parece ter nascido mais animado que o normal. Aquecendo os meus ossos. Não costumo gostar de um calor de matar, mas ultimamente os dias tem sido mais nublados que o normal. A neblina parece dominar São Francisco.

Não é esse o ponto que quero chegar. Não gosto nem de frio e nem de calor. Sempre fico no meio termo. Provavelmente não existe um lugar no mundo em que todo o ano seja assim. Fresco. Mas caso alguém próximo tenha conhecido tal lugar, tem que me apresentar, de alguma forma vou dar um jeito e me mandar.

As aulas hoje passaram rapidamente. E ter aula de economia domestica ajudou ainda mais. Por mim - todos os dias - as aulas se resumiriam a isso. Poder estar em contato com uma cozinha sempre me acalma e me faz sentir especial.

Seria maravilhoso poder ir para casa e ter uma cozinha a disposição.

Claro. Se eu tivesse uma casa.

Pode parecer esquisito no primeiro momento, mas órfã é a única coisa que sei realmente sobre a mim. Não sei dos meus pais e hoje em dia, não sinto a mínima vontade de descobrir. Óbvio que tive uma fase em que gostaria de saber das minhas origens, mas foi passageira.

Viver no Orfanato São Francisco era insuportável. Muitas garotas querendo se exibir a todo momento, buscando atenção que nunca tiveram. Mas a firmeza das Irmãs me deixava mais calma.

O orfanato tem um acordo com a escola da região para que todas as meninas estudem lá. Já dá para imaginar quanta menina tem no mesmo lugar. Todas loucas por atenção masculina. Até porque depois dos quinze, todas pararam de pensar em "pais" e passaram a buscar por caras.

Posso ser considerada idiota ou até mesmo tradicional. Ou talvez por causa dos malditos filmes. Tenho uma inclinação para o romantismo. Se for para me envolver com alguém, tem que rolar algum sentimento. Não pode ser apenas carnal.

Nesses momentos em que estou no meio de milhares de garotas que não tem cérebro suficiente para resolver um problema simples de matemática, penso em Rachel. Minha irmã. Minha única família. Não somos exatamente "família". Mas acho que amar uma a outra já é o suficiente. Rachel não foi abandonada como eu. Ela teve uma mãe. Mas a coitada ficou doente e a entregou para Irmã Glória cuidar. Rachel só tinha dois anos. A mãe morreu logo em seguida. Nunca soubemos quem era o pai e Rachel nunca ficou interessada em descobrir. Até dá para entender. O cara deixou a mãe dela sozinha, para cuidar de uma criança. Uma mulher que era sozinha no mundo.

Rachel depois que terminou o colégio resolveu se mudar para Nova York. É uma grande mudança. E cara. Mas ela trabalhou cinco anos de garçonete para poder conseguir o dinheiro. Ninguém sabia disso. Apenas eu. Queria poder ter ido com ela, mas ainda sou de menor, mas quem sabe quando terminar o colegial.

Saio do colégio animada. Um dia com o sol descoberto é para ser aproveitado. Meus pés travam no chão. Ao longe vejo um Audi azul com um cara loiro, de camisa e calça preta sentado no capô. Não sou do tipo de garota que baba os homens quando passam, mas havia um que invadia meus sonhos durante a noite. Claro, não os idiotas da escola. Mas um cara mais velho, bem mais velho. Não sei uma idade exata, mas talvez uns vinte e quatro anos. A única coisa que sabia, era que as poucas garotas que tinham cérebro na escola, eram afim dele.

Jayden Smith. Transpirando a verdadeira masculinidade. O cara que tira o senso de raciocínio de qualquer garota. Ouvi comentários que ele era dono de uma agência de modelos e que todas as garotas se davam muito bem. Ele manda todas elas para a Europa, e é lógico que nenhuma delas ia voltar. Só se for pra desfilar na Golden Gate Bridge.

Nos últimos seis meses Jayden não para de me encarar. E eu, que sempre o encarei, não parei. Sempre me pergunto se ele está interessado em mim ou simplesmente olha para mim pensando como sou bizarra. Não que eu me vista mal. Só não tenho dinheiro para comprar roupas que estão na moda. Não me visto como todas as meninas que ele convida para desfilar.

Incógnitas | Antes de Tudo, Parte 1 | DegustaçãoOnde histórias criam vida. Descubra agora