3. Quente

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   PROCUREI POR REQUISÍCIOS DE ALGUMA ANOMALIA no mais profundo de meus olhos enquanto encarava meu reflexo no espelho quadrado de meu banheiro, todo envolvido em ladrilhos brancos com cristânios arroxeados.

Vamos lá, aconteça! Seja lá o que for que possa acontecer... se é que realmente está acontecendo de fato alguma coisa...

Talvez, se eu balançasse as mãos para cima e para baixo...

Oh, idiota...

Mas minha imagem pálida parecia apenas a mesma imagem pálida de sempre. Meus cabelos cor de chocolate se emaranhavam em ondas até minhas costas, as sardas que salpicavam meu rosto estavam bem pronunciadas como de costume, o que me garantia aquele ar de criança ridiculamente petulante que Havana vivia dizendo que eu tinha. Só que reparando bem agora, examinando cada pedaço do meu rosto, eu não conseguia encontrar essa garotinha enquanto sondava meu reflexo, procurando por qualquer rastro naquele rosto que me desse uma explicação razoável para o que estava acontecendo, mordendo meus lábios grandes demais enquanto deixava que meus olhos escuros percorressem minhas linhas tensas.

Mas eu me parecia normal. Pelo menos, até o ponto que sempre havia sido. Não sei por que, exatamente, eu acordara tão disposta a encontrar as respostas em meu rosto — talvez porque algo insistisse em me dizer que eu tinha as respostas que queria —, mas claramente não havia funcionado. Suspirei com força, ajeitando a toalha ao redor do corpo enquanto saía do banheiro e ia procurar por algo para vestir. Não que eu fosse o tipo de garota que passava horas na frente do roupeiro. Eu sempre acabava optando por minha calça escura de agasalho e minha camisa de malha branca, folgada o suficiente para não me fazer sentir estrangulada, como eu geralmente me sentia dentro de roupas muito... coladas. Ás vezes eu me perguntava como Hanna conseguia se enfiar dentro daqueles espartilhos suicidas apenas para mostrar uma cintura mais fina e consequentemente mais sexy. Ser sexy não tinha nada a ver comigo, e por isso eu preferia apenas me sentir confortável à bonita.

Mas depois de me arrumar vagarosamente, percebi que havia alguma coisa subitamente errada.

Estava... abafado.

Não estava exatamente quente, mas também, já não estava mais tão frio como antes...

Caminhei até a janela, afastando as cortinas rosa pálido e observando o jardim por um instante. Uma névoa fina de outono ainda se desprendia teimosamente do chão, mas o indício de um sol fraco e sem graça tentava se mostrar atrás das nuvens carregadas no céu já não tão escuro. Arqueei as sobrancelhas. Bem, já era um começo...

Arrebatei meu casaco de cima do encosto de minha cadeira, à frente da escrivaninha, o chacoalhando por um instante e me perguntando se talvez eu não precisasse de algo mais leve para vestir, mas então, um quicado leve chamou minha atenção para meus pés, onde o colar que Tia Peg me dera havia caído, provavelmente se soltando de um dos bolsos onde eu o havia guardado. O peguei entre os dedos, pensando no que fazer com aquilo... eu não podia simplesmente ficar escondendo-o nos bolsos pela vida inteira...

Indecisa, caminhei até meu espelho de corpo inteiro, que ficava preso atrás da porta fechada do quarto e joguei o casaco de lado. Tudo bem, vamos lá. Eu estava mesmo precisando de um pouco de sorte e proteção, e não importava o quão idiota isso parecesse. Pensando que simplesmente não custava nada, atei o cordão em meu pescoço, percebendo que o pingente em forma de gota dourada ficava suspenso entre a curva dos seios.

Esconderijo sarcasticamente perfeito.

Havana havia saído cedo novamente para cumprir seu turno Heart Center, e tia Peg me recebeu na cozinha com um enorme prato de omelete com queijo. A última coisa que eu queria, era ela me forçando a engolir tudo aquilo de uma vez só, de forma que disciplinadamente me sentei e comi tudo como uma boa menina. Isso antes de Ivi invadir a cozinha e comer mais uma porção de omelete e bolinho de cenoura antes de podermos nos ver livres da influência de tia Peg de nos fazer querer enfiar coisas garganta abaixo apenas para fazê-la feliz. Ivi também havia suavizado um pouco nas roupas pesadas, preferindo, assim como eu, apenas um suéter confortavelmente macio. Itham nos encontrou a caminho do ponto de ônibus, e eu ainda me sentia incomodada pelo que Ivi insinuara ontem na biblioteca.

FALANGE _Caminho das Estrelas I (Degustação)Onde histórias criam vida. Descubra agora