5. Coisas que Flutuam

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    EU COMEÇARIA POR TIA PEG.

Pelo menos, era nisso que eu pensava enquanto descia as escadarias da academia junto com Ivi. E ainda era nisso que eu pensava quando meio sem querer, meus olhos deslizaram para o estacionamento, onde não demorei muito a localizar Eron, que andava em direção a Land Rover escura. E também havia alguém tentando puxar conversa com ele de uma maneira um pouco mais que evidente.
Hanna.

E claramente, ela parecia não estar tendo muito sucesso.

Tá, e depois eu é que era estranha.

Convenhamos. Hanna era a garota mais bonita da academia, porque fuinha ou não, ela era simplesmente linda. Fato indiscutível e tristemente verdadeiro. Sua única imperfeição era a aparente falta de cérebro... um que funcionasse pelo menos. Então, qual era o problema dele, no fim das contas? Um cara normal não teria muita dificuldade em sair com Hanna e lhe dar uns amassos, já que ela parecia mais do que disposta a conceder alguns, mas Eron não parecia particularmente interessado nisso enquanto retirava um molho de chaves dos bolsos, parecendo tão interessado quanto se mostrava em sala de aula. E quando menos esperei que algo fosse acontecer, ele ergueu a cabeça, e seus olhos verdes encontraram diretamente os meus, mesmo naquela distância e por cima de tantas cabeças. Uma alfinetada quente encontrou minha espinha, subindo perniciosa pela nuca. A sensação dos nervos vibrando se derramou por minha pele arrepiada. E antes mesmo que algo mais acontecesse, enganchei o braço de Ivi como uma espécie de guindaste, me virando rapidamente e desembocando para o lado dos ônibus escolares. Eu meio que parecia um guincho humano de uma hora para a outra.

— Puxa, o que foi? Qual a pressa? — ela estranhou, considerando que eu estava praticamente correndo.

E a puxando comigo.

— Ahn... nada. Pensei ter ouvido o ronco do motor do nosso ônibus.

— Tudo bem, tenho certeza que o Sr. Bonitão não teria problemas em nos dar uma carona. De novo, uh!

Eu quase tropecei, não duvidando que esfregar meu nariz no pátio fosse ser um grande show.

— Claro, com certeza...

Me forcei a concordar, mas isso só me fez forçá-la a andar mais rápido.

Tia Peg, como sempre, estava no meio da cozinha, cheia de comida por todos os lados, rastros branquicentos de farinha de trigo contornando o balcão, e Havana, como sempre, não estava em lugar nenhum. Mesmo decepcionada por não ver mamãe de novo, eu sabia que precisaria estar sozinha com tia Peg se fosse mesmo abordá-la, e percebendo que era o momento perfeito, me joguei em uma das banquetas da cozinha, a observando tirar alguma coisa do forno, com um aspecto bastante crocante e apimentado. Tia Peg mantinha a mesma concentração que um cirurgião dentista. Eu teria que ser mais esperta.

Pelo menos uma vez.

Vamos lá, você consegue.

— Tia, ahn... estou com fome...

Tá, isso não foi particularmente esperto.

Mas falar sobre comida era a melhor forma de abrir caminhos para uma conversa com ela.

— É de se imaginar, depois de um dia intenso de aula, eu espero mesmo que você chegue de estômago vazio ou no mínimo desidratada ou intoxicada querida, principalmente considerando as propriedades nada saudáveis da comida que é servida naquela cantina... com todos aqueles corantes e conservantes...  — ela pousou uma espécie de pizza de catupiri enrolada como um rocambole no balcão da pia — mas não se preocupe, querida, o lanche sairá em instantes, e logo depois, um jantar bastante satisfatório.

FALANGE _Caminho das Estrelas I (Degustação)Onde histórias criam vida. Descubra agora