4. De Cabeça Para Baixo

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   ACORDEI COM AS BATIDAS INSISTENTES TAMBORILANDO em meus ouvidos.

Abri os olhos de vagar, tentando me lembrar de onde eu estava. A sala estava mais escura, apesar das luzes que saíam da tela da TV, e eu ainda estava sozinha em casa. Procurei o relógio de cuco na parede, enrugando a testa. Já havia passado das 3hrs, e tia Peg já devia estar em casa se planejara mesmo chegar antes do ônibus escolar.

As batidas soaram insistentes de novo, e demorei um pouco a perceber que elas vinham da porta. Estava frio, a temperatura rastejando nos graus negativos, o que dizia que havia parado de chover a muito pouco tempo.

Ainda coçando os olhos pesados, me levantei, cruzando a cozinha vazia e silenciosa e tropeçando na minha mochila esquecida no chão.

Raios.

Liguei as luzes antes de atender a porta. As nuvens deviam estar tão carregadas, que faziam o céu ter um aspecto escuro demais para as horas que ainda eram.

Abri a porta sem a menor vontade de trabalhar os músculos, me deparando com uma Ivi molhada e muito, muito irritada do outro lado.

— Começa a contar!

Ivi quase havia enfiado o indicador gelado em meu nariz, e seu olhar de acusação varreu meu rosto antes que eu pudesse ter algum tipo de reação, considerando que eu ainda estava no meio do processo de acordar e tentar lembrar meu nome.

— Ivi? Do que você está falando? De onde você está surgiu?

Ela me olhou como se eu tivesse acabado de arrotar o alfabeto.

— Heloooou? Acorde! Estou vindo da academia, aquela escola que você deixou hoje pela tarde... — ela entrou porta adentro, me empurrando para o lado enquanto invadia minha cozinha como uma versão mais laranjada do furacão Catrina. — Então quer dizer que você e o Sr. Sexy simplesmente somem depois da cabeça de Hanna ser atingida e você ainda espera que eu nunca vá te perguntar o que aconteceu? Realmente, você não se parece com alguém que me conhece desde os dois anos de idade...

Ela me puxou para as banquetas da cozinha e me fez sentar de frente pra ela.

— Anda, me conta o que aconteceu?

— Ivi, não aconteceu nada... — expliquei ainda tentando me livrar do torpor do sono — Eu só... estava vindo a pé para casa... Você me conhece, eu não conseguiria ficar lá depois do que aconteceu... quero dizer, não depois de tudo que Hanna disse.

Ivi havia me pegado pelos ombros antes que eu conseguisse realmente terminar ou prever o movimento com atecedência.

— Você é maluca ou o quê, sua demente? Você sabe o quanto aquela rota é perigosa? — ela me chacoalhava — Você poderia...

— Eu sei, foi por isso que ele me deu uma carona. — a interrompi, e sua boca se abriu escancarada.

— Ele quem?

— Eron. Ele me alcançou e me ofereceu carona. Eu não ia aceitar, juro que não ia, mas algo me dizia que ele simplesmente me jogaria no porta malas se eu não aceitasse, então...

— Espera aí! — Ivi me interrompeu enquanto tentava organizar suas ideias — Quer dizer que o Sr. Gostosão te alcançou e te trouxe até em casa? Tipo, totalmente deu uma de Salvador Romântico? Foi mesmo isso ou eu entendi errado?

Rolei os olhos.

— Ivi, será que dá pra parar de chamar ele de gostosão? Quero dizer, o cara é de arrepiar! ― Bem, sim... e MUITO ― Não é só por que ele me trouxe até em casa que ele é confiável... — eu queria explicar para ela que Eron não era simplesmente mais um cara bonito que aparecia na escola, havia algo muito pior por trás de daquilo, mas como? Não havia um modo de fazê-lo sem parecer esquizofrênica ou simplesmente idiota.

FALANGE _Caminho das Estrelas I (Degustação)Onde histórias criam vida. Descubra agora