Esquecimento

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Louise acordou assustada, com a certeza de que havia tido algum pesadelo. Pôs a mão em punho ao lado esquerdo do peito, em proteção e prece aos céus. Quando finalizou a oração com um sonoro amém, olhou para o lado. Simon já estava de pé em algum lugar da casa.

Jogou as cobertas para o lado e suspirou resignada ao perceber que estava molhada de suor. Também tinha a certeza de que não fora o cobertor o causador daquilo. Foi ao banheiro louca de vontade de se refrescar e foi exatamente o que ela fez.

O plano inicial era só jogar uma água no rosto mas, quando viu que não ia adiantar, cogitou a hipótese de que um banho seria infinitamente melhor. Resolveu, por fim, encarar uma chuveirada depois de agarrar a raiz dos cabelos em frustração por não se lembrar com o que sonhara, e constatar que com a transpiração seus fios vermelhos haviam se tornado um grotesco emaranhado semelhante às buchas de aço que costumava usar para lavar as panelas.

Ao voltar para o quarto, olhou para o seu travesseiro como se ele fosse lhe dizer aquilo que tentava se recordar fortemente, querendo mais que tudo acabar com aquela aflição.

Detestava esquecer das coisas e ficar com aquele branco na memória, um espaço vago de uma lembrança esquecida.

Ainda tentou forçar mais um pouco e acabou desistindo, já que uma dorzinha começava a dar sinais de uma futura dor de cabeça. Em um muxoxo de conformismo, se ergueu e foi atrás de Simon.

E qual não foi sua surpresa ao encontrar o pequeno sentado no balcão, conversando animadamente com Samantha enquanto comia cookies e bebia um imenso copo com Toddy?

Prestou mais atenção na cena que se desenrolava em sua frente e percebeu dolorosamente que no fim, Samantha estava alheia a tudo que o filho caçula falava.

A mais velha só abria a boca pra dizer palavras monossilábicas, o olhar sempre vidrado no copo em sua frente e nunca no filho. Somente as vezes ela desviava o olhar para o nada, para logo depois mirar o copo novamente. Dava leves sorrisos estranhos para ninguém em particular, como se o que quer que pensasse fosse algo relacionado à um grande parque temático em Orlando ou algum cassino esplendoroso em Las Vegas.

Era triste de ver.

Simon continuava a tagarelar, alheio como a mãe. Todavia de um jeito bom. Louise sorriu afável, achando gracioso o modo como Simon tentava administrar a atenção entre os biscoitos, o achocolatado e a conversa -que ele pensava ser séria - com a mãe.

- Aí todo mundo da sala brigou porque me queriam em seus grupos, já que eu sou americano e morei em Washington por bastante tempo. Não é o máximo? - perguntou sorridente, enfiando um cookie inteiro na boca.

Vendo que Samantha não abriria a boca, Louise interveio:

- É sim, meu amor.

Em um súbito acesso de raiva, Louise puxa o copo pra si e o joga na pia com certa força. Samantha lhe encara assustada, enquanto Simon olha pra irmã como se a mesma tivesse criado duas cabeças.

Ela só sorri enquanto prepara seu lanche e se senta ao lado da mãe.

- Você não me disse como foi seu dia ontem, Say.

- Você tava ocupada demais pra me dar atenção. - respondeu soturno.

Lou por um estante pensou que estava engolindo uma pedra do tamanho de uma mão, e não um biscoito todo triturado.

- Você... - limpou a garganta, tentando recuperar a voz. - Você sabe que eu tô dando tudo de mim pra trazer dinheiro pra essa casa, Say. Enquanto pintar serviço, eu vou ocupar todo o tempo possível pra conseguir ter a certeza de que pelo menos por mais um mês, teremos onde morar e o que comer.

Amor MoribundoOnde histórias criam vida. Descubra agora