A noite que muda tudo

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Guilherme
É impossível esquecer aquela garota, já se passou uma semana, e nada é como antes dela. Sua foto está em meu mural, junto com as outras fotos, mas mesmo com tantas fotos a única em destaque é a dela, com sua beleza, sua sensualidade. Eu preciso vê-la novamente, preciso saber seu nome, preciso saber tudo sobre ela.
É de manhã, preparo um chá olhando pra ela no mural, quando meu telefone toca.
- Gui, é a Lu, beleza? - Ela faz uma pequena pausa - Então cara, eu preciso de uma força na galeria, eu sei que tá meio cedo, mas o Pedro não pôde vir e eu tô sozinha aqui.
- Claro, eu só vou terminar meu café e vou pra í, você precisa de alguma coisa?
- Sim, traz um café pra mim. Valeu, tô te esperando.
São sete horas da manhã, só a Lu pra me fazer sair a essa hora depois de uma noite longa de trabalho. Lu é uma grande amiga, ex namorada, e melhor amiga da Marina, ela me ajudou muito quando perdi a Marina, sempre ajudamos um ao outro. Ela é pintora, uma pintora muito talentosa inclusive, e está realizando seu sonho de expor suas pinturas em São Paulo. Nós namoramos por alguns meses, até ela me apresentar à Marina. Quando eu e a Marina acabamos, eu e a Lu viajamos pra fora do Brasil em busca de alguma coisa, não sei o que era, mas sei que ainda não encontrei. Ela não tem casa própria, vive viajando e ganha a vida vendendo seus quadros.

****

- E aí Gui - Lu me abraça - Valeu por ter vindo.
- Você acha que eu ia te deixar na mão? - Dou um sorriso sincero e ela sorri de volta - Seu café - Estendo o copo pra ela.
A manhã passa rápido, quando vejo já são quase onze horas e meu estômago está roncando.
- Lu eu vou aqui na cafeteria comer alguma coisa, você quer algo?
- Não, eu tô de boa, vai lá.
Pego a moto e vou pra cafeteria mais perto.
Quando faço meu pedido, noto que o lugar é bem bonito, tem um quadro da Monalisa bem grande em uma das paredes, quando passo os olhos no quadro novamente vejo uma mulher que me soa familiar, é ruiva e está sentada de frente pro quadro, de costas para mim. Espere um pouco, é ela, a garota do casamento! Não é possível que nos encontramos aqui, me aproximo de sua mesa, coloco minha mão em seu ombro e aquela energia estranha percorre meu braço. Só pode ser ela.
- Não é possível - Ela murmura, como se estivesse pensando alto, mas não tão alto a ponto de dizer.
- Também pensei que não fosse possível, me desculpa se eu te assustei.
Ela se vira para mim e fica paralisada, ela está ainda mais linda, seus olhos parecem maiores sem toda aquela maquiagem, são hipnotizantes. Evie tem tatuagens, não havia reparado nisso naquela noite, em seu braço esquerdo há a sombra de uma mulher com a cabeça inclinada para cima gritando, sua boca está bem aberta e seu rosto é bem expressivo. Ela me diz que não percebeu que havia dito aquilo em voz alta e me convida para tomar café com ela. Mas eu não sei se ela está fazendo isso porque quer, ou só por educação.
- Se não tiver nenhum problema pra você, eu acabei de fazer o meu pedido. Que enorme coincidência te encontrar aqui! - Eu estou mais do que feliz de te-la encontrado aqui, não consigo esconder meu sorriso, então me lembro que eu não sei o seu nome ainda, nem ela o meu - Eu não sei o seu nome ainda, e creio que você ainda não sabe o meu também, meu nome é Guilherme, mas pode me chamar de Gui.
- Hm... É, Evie... Quer dizer Evelyn, mas todo mundo me chama de Evie, então... - Ela revira seus olhos.
Seu nome é lindo. Tento decifrar seu olhar, não obtenho nada, mas ela parece nervosa, insegura com a minha presença, isso me diverte. Eu à afeto.
O garçom chega com nossos pedidos, e eu não consigo tirar os meus olhos dela, como um falcão que rodeia sua presa, ela está sem graça,olha para o garçom e sorri gentilmente para ele, e ele devolve o sorriso.
- Você mora por aqui? - Ela pergunta de repente.
- Na verdade não, eu moro na cidade vizinha, eu estou por aqui hoje porque estou ajudando uma amiga a preparar a exposição dela numa galeria de artes bem aqui perto.
Ela me pergunta se a Lu é fotógrafa também.
- É pintora, ela é muito talentosa, você devia dar uma passada lá quando tiver tempo e ver as obras dela.
Nos levantamos e vamos para o balcão pagar.
- Quem sabe um dia desses, quando não estiver ocupada.
Sua promessa é vazia, eu sei que ela nunca vai aparecer lá, e eu não vou vê-la novamente. Não posso deixa-la ir embora com essa promessa vazia.
- Bem, eu estou voltando pra lá agora, se você quiser me acompanhar, quer dizer, se não tiver nada pra fazer.
- Se não for muito longe daqui, porque eu não vim de carro.
- Oh, tudo bem, eu estou de moto. - Passo por Evie sorrindo, mas de repente ela fica séria, será que ela se arrependeu de ter aceito meu convite? Será que ela vai voltar atrás?
- Você está bem? Ficou pálida do nada.
- Estou, é... É só que... Hm, eu nunca andei de moto antes... - Sua voz é baixa, ela está envergonhada e nervosa.
Oh, ela nunca andou de moto antes.
- Sério? E porque está tão nervosa, é só você subir na garupa e ficar quietinha, o resto é comigo, você não vai pilotar ela ainda. Não tem com o que se preocupar - Dou risada e quando a olho, ela está séria me encarando, então eu paro de rir instantaneamente, não pretendo irrita-la e colocar tudo a perder.
- Deixa que eu fecho, vem aqui - Ela pega o capacete e fica me olhando sem saber o que fazer, é tão linda, e tão cheirosa, estou em sua frente concentrado em seu capacete, se eu me concentrar nela vou acabar beijando-a e perdendo o controle, Evie me olha, atentamente, hipnotizada e analisando meu rosto, provavelmente minha cicatriz. Termino com o seu capacete e olho para ela, e claro, ela está franzindo sua testa e olhando para minha cicatriz.
- Ganhei isso numa briga.
Ela olha nos meus olhos, surpresa por eu responder uma pergunta que ela não fez. Nos encaramos por alguns segundos e eu juro que ia beija-la se ela não tivesse dito nada.
- Espero que tenha deixado uma cicatriz nele também. - Oh, a Senhorita Não Acredito No Amor pode ser divertida as vezes. Ela é tão encantadora, seus gestos são sempre graciosos, eu a quero, á quero desde que a vi naquela festa. Ela cheira á lavanda, sabonete e ela, um cheiro maravilhoso que me inebria.
Subo na moto e ela fica parada, ah é claro ela nunca subiu numa moto antes e não me conhece pra se apoiar em mim.
- Pode se apoiar no meu ombro, e não encoste sua perna nessa coisa prata ou terá uma queimadura. - Alerto-a sobre o escapamento e ela me olha assustada. Sobe na moto toda desajeitada, é engraçada e linda ao mesmo tempo, como uma criança inocente, mas eu sei que de inocente ela não tem nada.
- Pode segurar na minha cintura, eu não mordo - Ela é tímida, nunca seguraria em mim sem minha permissão. O toque das suas mãozinhas na minha cintura é tão doce, elas se perdem nos meus músculos, ela me aperta a cada curva da moto, e eu gosto disso, confiando totalmente em mim, arrastando levemente a mão para cima e para baixo a cada lombada na rua. Percebo que preciso do toque dela na minha pele, preciso senti-la em mim, preciso dela como nunca precisei de outra pessoa. Marina vem à minha mente, talvez eu precise mais de Evie do que precisava dela, talvez finalmente a Marina está ficando pra trás. Isso me assusta, será que eu estou pronto pra deixar a Marina finalmente ir?
Chegamos na galeria, e tudo ainda está uma bagunça, mas algumas pessoas chegaram pra ajudar.
- Vem, vou te apresentar à Luísa, ela é incrível e muito talentosa.
Evie se mostra interessada e pergunta se todos aqueles quadros são dela. Tem mais de cem quadros espalhados pela galeria, a maioria ainda está no chão.
- São sim, são incríveis não é?
- Pensei que tivesse sofrido um acidente no caminho pra cafeteria Gui - Lu vem caminhando na nossa direção, ela é linda e radiante, e está sempre de bom humor, usa uma saia toda colorida até o pé, bem típico dela.
- Eu tava te procurando Lu, essa é a Evie uma amiga.
- Evie, é um prazer te conhecer - A Lu não gostou da Evie, pelo seu olhar e sorriso forçado eu percebo. A Lu ainda gosta de mim, apesar de tudo, eu acho, então é difícil pra ela aceitar que eu estou recomeçando minha vida e conhecendo alguém.
- Luísa, é um prazer conheça-la também. - Evie usa o mesmo tom que a Lu. Mulheres são sempre assim? Gostam e não gostam de outra mulher simplesmente com uma troca de olhares.
Eu mostro o lugar pra ela, conto a história de alguns dos quadros, conto sobre nossa viajem, mas sem revelar o porque, e falo um pouco da história da Lu. Ela foi adotada quando tinha quatorze anos, por uma família rica, mas fugiu de casa quando fez dezesseis, ela não se dava bem com os pais, eles queriam devolver ela e pegar outra menina, mas antes disso ela fugiu. Nós nos conhecemos numa festa em uma praia, ela com seus dreads, sua saia rodada até o pé e eu com a minha câmera, fizemos amizade e depois namoramos, mas eu não à amava, nunca amei, eu só gostava do bem que ela me fazia, e ainda gosto.
Nos despedimos da Lu e saímos.
- Você está pronta para voltar? - Ela me olha apavorada - Ah nem foi tão ruim assim vai, eu fui bem devagar.
- Não, não foi tão ruim, só não estou acostumada com isso ainda.
- Será que você pode me deixar na cafeteria por favor?
- Claro - Arrumo seu capacete e ela sobe na moto.
Foi uma volta tranquila, suas mãos delicadas em mim, poderia passar o dia andando de moto com ela só pra sentir seu toque.
- Mais tarde eu e uns amigos vamos sair pra beber, o que acha de ir comigo? - Digo quando descemos da moto e paramos em frente a cafeteria. Não quero que ela se vá, preciso vê-la novamente.
- A Luísa também vai?
- Não, ela está muito ocupada por causa da exposição. Porque? Se você quiser eu posso falar com ela. Acho que você vai ser a única mulher no bar mesmo. - É claro que ela não vai querer que eu a convide, só preciso ter certeza de que ela não gostou mesmo da Lu.
- Oh, não, tudo bem. Quer dizer, eu não me importo. Não precisa convida-la.
Agora tenho certeza
- Então tudo bem, eu passo na sua casa às sete, esse é o meu telefone - Dou a ela o meu cartão - Pode me mandar mensagens ou me ligar, pra eu ter certeza que você irá mesmo.
- Tudo bem, eu mando sim.
Evie me diz que vai em seu próprio carro, então ela pega seu celular e me liga pra gravar seu telefone no meu celular. Ela não gostou da experiência com a moto.
Ela agradece a carona vira as costas e entra na cafeteria.

****

Eu passo o resto da tarde pensando nela, em como me sinto bem perto dela, ela é incrível, é educada, graciosa e linda.
A tarde passa, já mandei por SMS o local onde fica o bar, tudo já está combinado.
Eu tomo banho visto um jeans preto, uma camisa azul marinho e all star preto. Pego as chaves da moto e saio.
Eu, os meninos e ela sentada ao meu lado, estamos conversando sobre vários assuntos ao mesmo tempo, ela está no oitavo drink, estou preocupado com ela, será que ela não está nenhum pouco bêbada? Ela bebe os drinks como se fossem água. Evie não fala muito, mas ela é tão agradável.
Meus amigos já foram embora, só estamos nós dois, eu tomo minha cerveja e ela está no fim do seu nono drink.
- Gosto da cor dos seus cabelos, combinam incrivelmente com você.
Ela não diz nada, só fica olhando pra mim, forçando sua vista como se não estivesse conseguindo me enxergar.
- Ei, Evie? você tá legal?... - Eu digo rindo. Ela está distante.
Não diz nada.
- Você bebeu demais não foi?
Ela está engraçada, me olha como uma criança que está perdida olha pra um estranho. Evie ainda não diz nada, só me olha com seus olhos castanhos enormes e sedutores, eu quero tanto beija-la, mas não aqui, não com ela assim, quero que ela também queira e que se lembre depois.
É melhor leva-la pra casa, não quero que nada aconteça com ela.
- Vamos embora, só restou nós dois aqui, meus amigos já foram. - Eu pego sua mão e a guio para se levantar e me seguir.
Quando ela se levanta cai em cima de mim, eu seguro-a colocando as mãos em sua cintura, ela tem uma cintura tão fina e delicada.
- Tudo bem, vem, vou chamar um táxi pra você. - Eu digo olhando em seus olhos e segurando sua cintura.
- Táxi? Não! Eu estou com meu carro, posso dirigir. Não preciso que você me segure, não preciso de ajuda. - Ela me empurra - Você sabe o que eu preciso Senhor Sedutor, eu preciso de um cigarro - Senhor Sedutor. Puta que pariu ela está muito louca, sua voz mole e alta, seus gestos descoordenados. Ela vai me dar trabalho.
- Você está muito louca, mas ok, eu também preciso de um cigarro, vamos lá pra fora, depois a gente resolve sobre o táxi - Não quero que ela comece a gritar aqui dentro.
Eu guio-a para fora com minha mão em sua cintura, mas ela à retira bruscamente minha mão dela.
- Eu posso ir sozinha.
Tudo bem.
Ela literalmente cambaleia até a calçada, isso me diverte.
Já na calçada, eu acendo meu cigarro, e ela está tentando acender o dela. Eu pego seu isqueiro e acendo pra ela, o cigarro está em seus lábios, onde eu gostaria de estar. Ela me olha, confusa tentando focar em mim. Isso me faz rir.
- Será que dá pra você parar de rir de mim!
- Me desculpa, é que você não parece que faz isso com frequência.
- Faz o que?
- Beber.
Ela abaixa a cabeça.
- Eu acho que vou vomitar.
Merda.Eu solto o cigarro, seguro seu cabelo e giro-a pro lado. Ela vomita sem parar, toda sua bebida está na calçada agora.
- Pronto? Você está melhor agora? Se quiser vomitar de novo me fala tá bom.
Ela diz que está melhor, então ela para e olha pra mim, como se nunca tivesse me visto antes, e eu olho-a também, até bêbada ela é linda.
- Você é bonito, nem parece real. - Ela passa a mão em meu rosto, e isso me faz rir.
É, ela está muito bêbada.
- Será que dá pra parar de rir.
- Eu não estou rindo.
Nos olhamos por cerca de 10 segundos, então ela cai desmaiada nos meus braços, com sua cabeça em meu peito.
Merda.







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