Capítulo 0 (Piloto) - A porta de entrada está aberta.
Se tem uma coisa que aprendi com a vida é que você não deve nunca duvidar dos planos dela. É como aquela estratégia no jogo de damas, onde você dá uma peça propositadamente, para assim, capturar mais de uma do seu adversário; ou então alcançar o outro lado do tabuleiro e tornar aquela peça uma dama. A vida é como um grande jogo de damas.
A minha peça tinha um nome, um endereço, e uma vida medíocre, a qual acabou de uma forma ainda mais medíocre, mas ainda sim digna, em sua forma.
O dia em que a conheci foi o dia em que eu mais venho tentando esquecer nos últimos anos. Porém um fato inegável é que quanto mais se tenta esquecer, menor é a change de sucesso. Por exemplo quando você escuta um barulho à noite, e se cobre até a cabeça, fechando os olhos com força, tentando dormir desesperadamente, mas no final da noite, termina sonhando com o barulho tentando te pegar. É um ciclo interminável. Creio que é assim que surgem os traumas.
Naquele dia eu estava morto de fome, e por mais que eu odiasse comer, meu estômago me convencia do contrário.
Bob dormia em um dos quartos da casa abandonada, onde fiz de meu lar desde que fugi de casa, aos 13 anos. Na época eu já tinha 16. Bob nunca me contou o motivo de estar nas ruas, mas eu também não me importava, já que eu também nunca o contei.
A casa tinha dois andares. No primeiro andar tinha uma grande sala de estar, acoplada com a cozinha, e um lavabo simples. No segundo, um quarto mais ou menos grande e uma suíte que deveria ser incrível quando terminada.
A casa ainda estava em fase de construção, porém as obras pararam quando o filho do casal tropeçou em um tijolo e acabou com um vergalhão atravessando seu estômago. Desde então, ninguém apareceu por lá. Tem também a versão de que o terreno era do governo e eles não tinham autorização de construir por lá, mas eu prefiro a primeira versão. É mais interessante.
Bob e eu tínhamos o costume de roubar as casas do bairro. Não que fôssemos ladrões, apenas fazíamos isso pra sobreviver. Lugar nenhum aceitava um garoto "mulambento e mau encarado" como empregado, então pegávamos emprestado sem devolver alguns enlatados dos armários e alguns dólares. A quantidade dependia da necessidade, mas nunca roubamos mais do que 50 dólares.
E eu realmente estava com muita fome, o que significava que era hora de atacar. Fui até o quarto onde Bob dormia, pra acordar ele. Eu era mais ágil, e desprovido de altura, então era eu quem entrava nas casas e pegava o que tinha que pegar. Bob era observador, e mais atento também, então ele ficava nos arbustos, vigiando se algum morador estava vindo. Formávamos uma boa dupla.
Quando encontramos a casa abandonada, a primeira coisa que fizemos foi mapear as casas do bairro e os moradores de cada uma delas, assim como o horário de saída de cada um e quando eles voltam pra casa. Desse jeito era possível calcular quanto tempo tínhamos pra roubar e os possíveis riscos de sermos pegos. Fizemos isso por três anos, só fomos pegos uma única vez.
Peguei a minha mochila vazia e pus nas costas, seguindo caminho até a quinta rua após a escola. Bob estava atrás de mim, ainda sonolento. As casas eram escolhidas por meio de um sistema: a cada roubo, pulávamos duas ruas à frente e duas casas à direita. Assim não roubávamos a mesma casa, e não roubávamos vizinhos próximos pra desconfiarem de nós enquanto fofocavam sobre a vida na sala de estar.
A casa escolhida era branca, mas não tão branca, era bege. Tinha um estilo mais clássico, com um jardim bem cuidado na lateral. Era uma vista realmente bonita de se ver, me dava vontade de fotografar, eternizar a imagem em alguma exposição de museu ou algo do tipo.
Bob tomou a frente, correndo em volta da casa, à procura de uma janela aberta. De acordo com as anotações, a casa estava vazia, e tínhamos duas horas pra fazer o que tinha que ser feito.
A janela de um dos quartos estava aberta. Era no segundo andar, mas coincidentemente havia trepadeiras abaixo dela. Usei elas pra escalar.
O quarto era o principal, o do casal, belo como a casa, igualmente belo. Passei as duas pernas pela janela, e então passei a cabeça, levantando o dedão para Bob como se dissesse "é, tá tudo bem". Saí do quarto e desci as escadas, tentando fazer o mínimo de barulho possível, mesmo que a casa estivesse vazia, e segui caminho até a cozinha, pra pegar comida do armário.
Como eu disse antes, Bob e eu roubamos casas por três anos, e só fomos pegos uma única vez. Bem, foi essa a maldita vez. Enquanto eu abria os armários, procurando por alguma coisa que prestasse, um garoto descia as escadas, segurando um taco de basebol. Ele não tava nas anotações, e dava pra ver o porquê.
Ele estava usando um moletom preto, do Misfits, e calças tão apertadas que desconfio sinceramente que ele usava manteiga pra entrar lá. O cabelo - é necessário dizer que era preto? - era da altura dos ombros, e escondia parte de seu rosto - parece que a manteiga foi usada ali também, já que brilhava como o inferno.
Eu me senti como se estivesse olhando pra um espelho humano.
Nós ficamos imóveis, encarando um ao outro pelo o que pareceram séculos. Ele me estudando, e eu me fingindo de morto. E então eu corri, corri como se um leopardo estivesse atrás de mim. Corri como nunca corri antes na minha vida. Por sorte a porta de entrada estava aberta - o que era bom, mas era ruim, já que eu tive que escalar trepadeiras à toa. Lembro que Bob correu atrás de mim, com a cara mais confusamente hilária que eu já vi. Ele não fazia ideia do que estava acontecendo por ali.
E então chegamos em casa, com os pulmões pulando pela boca, e a adrenalina se transformando numa dor de cabeça terrível. A primeira coisa que fiz foi atirar minha mochila no chão e chutá-la, me arrependendo quando a dor de chutar uma lata subiu pelo dedão. Bob simplesmente ofegou, pôs as mãos nos joelhos, e perguntou: "O que diabos aconteceu aqui, Frank?"
E então, eu respondi: "Só consegui pegar algumas sopas de feijão".
* * *
Bom, isso é tudo pessoal, esse foi o início de uma aventura que ainda está por vir. Coloquei esse capítulo como piloto pois a história ainda não está terminada - só na minha cabeça, mas ainda não dominamos a telepatia, então ainda tenho que transformar essas ideias (me desculpe pelo termo) em palavras. - e esse capítulo eu só postei pra saber se vale a pena ou não continuar. Bem, é o que capítulo piloto significa, afinal.
Espero que tenham gostado, e se sim, deixem sua estrelinha ou se possível um comentário com sua opinião. Espero também que nos vejamos em breve num próximo capítulo.
So long and goodnight xoxo
oopsIstoleyourbra
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FanficPara todo mundo chega um dia em que a vida perde a validade. Os sonhos, as esperanças, até mesmo os medos vão morrendo aos poucos, até que se chega a um ponto em que nos sentimos completamente vazios. E é aí, neste maldito ponto, em que descobrimos...