Capítulo 54 (Luan)

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  A sensação de ter Lorena novamente em meus braços foi incrível. Depois de termos feito amor, lembro de ter ficado saboreando seu toque, quando ela se deitou em meu peito, seus carinhos, seus sorrisos e as coisas que falamos naquela noite.
Lembro de ter acordado no meio da noite e de não senti-lá próxima de mim. Tateei seu lado da cama e acordei assustado ao perceber que ela não estava ali. Me sentei preocupado na cama e a avistei próxima a porta:
-O que faz acordada à essas horas? -Perguntei passando a mão pelo rosto, aliviado por ver que ela estava bem
-Como eu vim parar aqui? -Ela perguntou
-O quê? -Questionei sem entender
-Por quê você me trouxe pra cá?
-Lorena, do que você está falando? -Ela me encarava, só então eu pude perceber que ela parecia estar com medo de mim
-Você me seduziu e me trouxe pra cá, não foi? O que você fez? -Ela dizia chorando. Percebi na hora que ela não estava bem. Me levantei da cama com cuidado, apanhando minha calça de moleton que estava no chão e a vestindo
-Lorena, está tudo bem meu amor? -Dei um passo em sua direção, mas ela fez um gesto para que eu parasse. Parei. Não queria apavorá-la
-Não me chame de seu amor! Eu nem o conheço! Me deixe em paz! -Ela gritou, enquanto saia correndo do quarto
-Lorena sou eu, Luan! -Disse indo atrás dela, que corria pelo corredor sem olhar para trás
-Por favor, me deixe em paz! -Ela gritava apavorada. A alcancei quando ela estava prestes a descer as escadas e a segurei com força
-Lorena, sou eu, o Luan! Seu marido! -A virei para mim, tentando de um jeito desesperado, fazer com que ela se lembrasse de mim
-Eu não conheço você! Me deixe ir, por favor! -Ela chorava, se debatendo contra meu peito. A segurei firme, a mantendo bem próxima a mim
-Sou eu meu amor, tente se lembrar -Pedi, segurando seu rosto, fazendo com que ela olhasse para mim- Tente se lembrar -Ela pareceu se acalmar, mas o medo ainda estava em seus olhos- Sou eu, o Luan, seu marido, pai do seu filho, se lembra? -Meu coração batia forte, rezando em silêncio, implorando a Deus para que ela se lembrasse de mim. Ela se manteve em silêncio, até que várias lágrimas começaram a rolar por seu rosto, ela se abraçou a mim, chorando sem parar
-Lu -Ela murmurou em meio a várias lágrimas- O que eu fiz -Ela soluçava
-Ei, está tudo bem -Envolvi meus braços ao redor dela, sentindo toda a tensão se esvair, ela havia lembrado.
-Me desculpe Luan -Ela pedia. Suas lágrimas caiam incansavelmente
-Tudo bem meu amor, eu estou aqui -Me sentei em um dos degraus da calçada e a puxei para que ela se sentasse em meu colo. Ela me abraçou, chorando muito em meu ombro.
-O que aconteceu aqui? -Manuela apareceu de pijama na sala, olhando para nós na escada
-Já está tudo bem Manu -Respondi- Porquê não prepara um chá pra Lorena? -Pedi e, ela pareceu entender que eu queria ficar a sós com a minha esposa
-Claro, eu já volto -Ela olhou para Lorena, como se quisesse se certificar de que a amiga já estava bem e depois sumiu. Me mantive em silêncio, apenas envolvendo Lorena em um abraço forte. Foi o pior susto que eu havia passado na vida. A possibilidade de ela ter me esquecido por completo me apavorou:
-Como isso aconteceu? -Lorena murmurou em meu ouvido. Sentia suas lágrimas caírem sobre a minha pele
-Eu não sei
-Eu fiquei muito tempo assim?
-Eu não sei -Ela se afastou um pouco, para poder me olhar nos olhos. Seus olhos estavam vermelhos e ela parecia arrasada com o que havia acabado de acontecer
-Como depois de ontem, eu pude me esquecer de você Luan? -Uma lágrima rolou por seu rosto e eu voltei a envolvê-la em meus braços- Eu estou com medo -Ela disse, o medo evidente em sua voz
-Vai ficar tudo bem
-Não, não vai, eu vou acabar me esquecendo de você Luan -Ela chorava sem parar. Um choro de medo. Do medo de perder- Eu não quero que isso aconteça, você é a pessoa que eu mais amo nesse mundo.
-Eu sei -Disse com a voz embargada, sentindo uma lágrima rolar por meu rosto. Minha vontade era de urrar, de colocar toda aquela dor que estava sentindo para fora, mas eu não podia, eu tinha que mostrar a Lorena que ela podia contar comigo, não poderia desabar também:
-Vamos, vou te levar para o quarto -Disse me levantando com ela em meus braços. a coloquei na cama e disse que iria para a cozinha. Estava conseguindo ser forte, mas quando avistei Manuela, não consegui mais me segurar. Chorei tudo o que tinha para chorar, enquanto ela me consolava e me ouvia atentamente:
-Não acredito que isso aconteceu -Manuela disse chocada
-Ela está piorando Manu, está começando a se esquecer de tudo e de todos pouco a pouco
-Tadinha da minha amiga -Lágrimas também rolavam por seu rosto- Ela não merecia isso
-Não, não merecia, eu sei que ela é forte e, sei o quanto ela luta para que essa doença não a consuma por completo, mas... -Não ousei terminar aquela frase
-Ei sei que é difícil Luan, mas agora, mais do que nunca, a Lo precisa de você
-Eu sei, mas, eu não estou pronto para abrir mão dela, não estou pronto para perdê-la Manu, eu nunca vou estar
-Tente não pensar nisso, aproveite o tempo que vocês dois tem, deixe tudo não mão do destino -Manu disse tocando meu ombro, antes de subir para o quarto, para ver como Lorena estava. Me mantive onde estava durante longos minutos, chorei mais um pouco, antes de perceber que Manuela tinha razão. Não tinha porque eu sofrer agora. Eu sabia que só um milagre poderia curar a Lorena, mas não existe nada impossível para Deus, certo?
Peguei o chá que Manuela havia feito e coloquei um pouco em uma xícara para Lorena. Subi as escadas em silêncio, e quando adentrei o quarto, percebi que Manuela não estava mais lá. Lorena estava sentada na cama com um caderno em suas mãos e uma caneta:
-Oie -Disse me aproximando dela
-Oi -Ela respondeu sem graça, colocando o caderno de lado. Me sentei ao seu lado na cama e lhe entreguei a xícara de chá- Obrigada -Ela disse a pegando e tomando um gole
-Como se sente? -Perguntei cauteloso
-Bem, na medida do possível
-Você não se lembra de nada? Quero dizer, de ter me esquecido? -Ela pareceu refletir sobre aquilo
-Eu me lembro apenas de ter acordado nua e olhar para um homem ao meu lado e não reconhecê-lo e claro, de achá-lo muito atraente -Ela brincou, sorrindo de lado. Por algum motivo eu também sorri, mas este mesmo sorriso logo se desfez- Era como se eu estivesse em uma memória passada e, quando você me sacudiu daquele jeito, foi como se tudo voltasse de uma vez
-Eu sinto muito
-Não sinta. Eu já me conformei com o meu destino. Talvez tenha algum motivo especial para tudo isso estar acontecendo
-Se tivesse alguma maneira, eu trocaria de lado com você, sem pensar duas vezes
-Não diga bobagem Luan -Ela tocou meu rosto- Eu morreria se visse você decair cada dia mais. Acha que eu não sei como você sofre? Você é um homem forte, eu não suportaria passar por tudo isso
-A única pessoa forte aqui é você, e se eu ainda encontro algum tipo de força pra continuar, é em você meu amor -Me inclinei a abraçando
-Essa é a pior parte -Ela sussurrou em meu ouvido- A quimio, as internações, as dores... Nada se compara com a perda da memória, é como se aos poucos você fosse perdendo a sua identidade, como se a pessoa que você foi algum dia, fosse sendo apagada aos poucos -Me afastei, notando o caderno a seu lado
-Por quê o caderno?
-Eu não quero mais me esquecer. Por isso vou anotar tudo aqui, cada sentimento, cada memória... Quero que você saiba a minha versão da história, mesmo quando eu não estiver mais aqui -Uma lágrima rolou por meu rosto
-Já escreveu alguma coisa?
-Sim -Ela pegou o caderno ao seu lado e o entregou para mim. O abri, e sorri ao ver o que ela havia escrito:



"Memória 1""Havia ido em um show com Manuela, sem fazer a menor ideia de quem iria se apresentar. Tive vontade de ir ao banheiro, mas não encontrava nenhuma placa que indicasse onde pudesse encontrar um. Comecei a caminhar por um longo corredor, cheio de portas. Estava distraída, quando esbarrei em um rapaz. Ele era muito bonito e atraente, foi super simpático comigo e, apesar de não estar demonstrando nenhum interesse, desejei que ele estivesse flertando comigo. Por algum motivo, senti algo de imediato por ele, era como se eu soubesse que ele mudaria totalmente a minha vida. Mas do que o cantor que se apresentou naquela noite, ele foi o homem pelo qual me apaixonei e o único para o qual entreguei o meu coração..."Meus olhos transbordavam quando terminei de ler:-Foi assim que você se sentiu quando me viu pela primeira vez?-Em parte, acho que nunca vou conseguir traduzir o que senti por você naquele instante em palavras -Ela segurou minha mão- Eu posso me esquecer, mas antes disso, prometo reescrever todas as nossas memórias, assim você vai saber o que eu senti em cada uma delas -Sem dizer nada, a abracei com força- Quando nossa filhinha for mais velha, quero que mostre isso a ela, talvez, lendo as coisas que eu escrever, ela tenha alguma noção de quem foi a mãe dela-Não diga bobagens, você vai conhecer a nossa filha Lorena-Espero que tenha razão. Nunca presenciei o nascimento de um anjo.

Chuvas de ArrozOnde histórias criam vida. Descubra agora