COMPLETO ATÉ DIA 24/06/17
Estou morrendo.
Meu corpo inteiro reclama a cada passo que eu dou. Sinto meus músculos ardendo e o meu coração batendo forte sobre o meu peito.
O calor está insuportável e eu resolvi sair para correr, pensei que o sol já havia castigado a Terra por hoje e agora deixaria para terminar de fritar o resto do asfalto. Mas não. O tirano ainda quer dar a última cozida em nós para acabar o dia rindo da nossa cara frita.
E mesmo assim, eu sigo o ritmo da minha corrida, já que o AC não pode jogar squash comigo essa tarde, pois está terminando de arrumar o quarto do Otávio. E como eu preciso me cansar para deitar e dormir hoje como uma pedra saí para rua e comecei a correr. Quero chegar ao ponto onde o mundo pode cair lá fora que eu vou estar deitado e enterrado entre as minhas cobertas.
Não quero nem beber. E veja como isso é um milagre. Só quero desligar e acordar amanhã com o rosto amassado.
Saí do plantão um bagaço de pessoa. O paciente que chegou baleado pelo confronto com a polícia morreu na sala de operação e isso estragou o resto da minha noite e o dia todo.
No momento em que eu vi o ferimento e o local atingido apenas liguei para o plantão cirúrgico e encaminhei o paciente para lá. Não estava mais nas minhas mãos salvar aquela vida. E eu sabia que se ele sobrevivesse ao procedimento já seria um milagre.
Por mais que eu soubesse que não dava para fazer muita coisa, fico aliviado em saber que, pelo menos, ele estava inconsciente quando chegou para mim e anestesiado na hora da morte. Não há nada mais chocante, e aterrorizante, do que um paciente saber que está morrendo e sentindo dores nessa hora. É como se o sofrimento deixasse a hora da morte atrasar, aumentando mais a agoniação.
É traumático para qualquer pessoa que acompanha esse momento. E mais ainda para os parentes que sempre têm um quê de esperança infinita, acreditando que tudo irá melhorar e o corpo irá se curar.
Cabe ao médico tranquilizar o paciente, por mais irônico que isso seja, acalmar alguém que está morrendo... Mas o contexto não é esse, e sim de ter um pouco de piedade e alma para fazer os últimos suspiros serem em paz.
Quando o meu pai estava nesse estágio eu via a sua angústia e o pânico nos seus olhos perante a morte. Por mais que eu negasse todos os fatos que a medicina me ensinou, a minha esperança sempre falava mais alto. Dizendo que era apenas um ataque e que tudo se resolveria.
O médico responsável pelo seu caso teve que me chamar a atenção para a realidade. Deixar a minha dor de filho de lado e acionar o meu lado médico para a situação que eu não queria acreditar. Meu pai estava morrendo e, além disso, sofrendo com isso. Eu, na minha ânsia de querer ficar mais alguns instantes ao seu lado, deixei de ver o seu sofrimento.
Naquele dia, eu, em conjunto com os meus irmãos, tivemos que tomar a decisão mais difícil das nossas vidas. A opção de deixar ele em coma até o seu corpo desistir de lutar. Foi a decisão mais humana e dura que eu tive em toda a minha vida. Presenciei a hora em que os medicamentos foram injetados e segurei a sua mão até ela perder as forças.
Foram dois dias apenas escutando o barulho dos equipamentos o monitorando e a certeza de que quando a morte chegasse, ela seria leve e ele não sentiria mais nada.
Toda essa situação que eu vivi com ele, começou a levantar dúvidas sobre o meu acidente anos atrás. Eu apaguei na hora do impacto, acordei algumas horas depois com o meu corpo todo arrebentado e recebi a notícia que tiraria o meu mundo de órbita por completo: a Joana não tinha resistido. Depois de passar a fase de negação, eu perguntei se ela havia sofrido.
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Luiz
Romance"Mas o que importa, realmente, é que todos os eventos que aconteceram na minha vida me prepararam para o que eu sou hoje e serei amanhã. Confesso que não estou nenhum pouco pronto, mas o instinto de desafio fala mais alto. E eu mal posso esperar par...